O agronegócio brasileiro vive um momento interessante. Dados recentemente divulgados pelo IBGE indicam que a atividade agropecuária cresceu 15,1% de 2022 para 2023, contribuindo fortemente para o aumento de 2,9% do PIB no período. Claro, já houve anos de maior crescimento para o agro, mas mesmo assim os dados impressionam, dada a miríade de contratempos enfrentados pelo setor nos últimos tempos.
Adicionalmente, um levantamento realizado pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), em colaboração com a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), apontou que 28,3 milhões de pessoas estavam empregadas no agronegócio em 2023, uma alta de 1,2% em relação ao ano anterior e um recorde histórico na série iniciada em 2012. Assim, 26,8% dos empregos formais do Brasil foram gerados no agro.
Os números acima demonstram não apenas a força do agronegócio na economia e na geração de empregos no Brasil, como também indicam uma trajetória de crescimento do segmento, mesmo em um cenário de incertezas geopolíticas, instabilidades políticas e intempéries climáticas que afetam diretamente as atividades agropecuárias. Resiliência e competência na veia.
Contudo, apesar dos dados serem positivos e trazerem algum alento para a economia nacional, é importante entender que determinadas alterações regulatórias, somadas a um cenário de incertezas estruturais, podem trazer um desconforto temporário para o setor, especialmente para o mercado de capitais e sua recente relação com os negócios do campo. Um primeiro teste de stress para essa promissora relação.
Separando o joio do trigo
As recentes alterações promovidas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) em relação aos principais títulos de crédito do setor (Certificados de Recebíveis do Agronegócio – CRAs e Letras de Crédito do Agronegócio – LCA), que são base importante do funding da atividade agropecuária e da carteira de investimentos das instituições bancárias e das cooperativas, tendem a causar impacto, ao menos no curto prazo, no crédito rural e no desempenho dos Fiagros.
Algumas estruturas e estratégias de investimento no setor passarão por mudanças, ao menos para que haja adequação dos títulos e dos fundos às novas regras. Isso poderá causar alterações nas receitas e no fluxo de capital para instituições e produtores, assim como deverá impactar, como em alguma medida já impacta, os investimentos e captações de Fiagros. É o primeiro grande teste de fogo para esse importante instrumento de financiamento via fundo de investimentos para as atividades de crédito, imobiliárias e de participações no setor.
No mais, o burburinho envolvendo os pedidos de recuperação judicial de empresas e grupos familiares do agronegócio têm gerado apreensão em dose tripla. Primeiro, entre os produtores rurais, no sentido de que o aumento dos pedidos pode encarecer o custo do crédito para o segmento, dada a elevação do risco sistêmico para os financiadores.
Também geram apreensão entre os profissionais do agronegócio e dos mercados financeiro e de capitais que atuam no setor, na medida em que a percepção, ainda que possivelmente equivocada, de que a atividade agropecuária está passando por uma crise resulta na retração de investimentos e no medo de investir neste segmento.
Por fim, nos profissionais do direito que enxergam na banalização dos pedidos de recuperação judicial uma fonte de problemas sistêmicos e uma desmoralização desse instituto jurídico, muito importante quando devidamente utilizado.
Contudo, essa narrativa de crise no setor é bastante contestada, inclusive por vozes importantes do setor, como Octaciano Neto, que através de dados e evidências demonstram que os pedidos de recuperação judicial são pontuais e irrisórios face à amostra total de produtores e agropecuárias no País.
Nesse sentido, a narrativa de crise seria mais um barulho que gera benefícios para alguns poucos e prejudica todos os demais, numa reação em cadeia cujos impactos podem perdurar por anos.
Aproveitando as oportunidades
Nesse turbilhão de informações é importante afastar os ruídos e voltar as atenções para o olhar macro e para as perspectivas de longo prazo para o setor. É bem possível que ajustes de rotas sejam necessários, especialmente nos mercados financeiro e de capitais, com alguns solavancos e momentos de incertezas, porém o horizonte é ainda —e, possivelmente, continuará assim por muitos anos— muito positivo para o agronegócio.
Assim, para os investidores de longo prazo que buscam geração de valor, bem como para os produtores rurais responsáveis e profissionais —que são muitos— e para os agentes de mercado que atuam no agronegócio brasileiro, não há grandes motivos para preocupação.
O setor é cíclico, e os momentos de instabilidade são ótimas oportunidades para separar os aproveitadores e aqueles que não se planejam de forma adequada dos profissionais sérios. Em vez de chorar, o momento é de vender lenços e aproveitar as oportunidades que se apresentam.