Em menos de 15 anos, os irmãos Marino e Camila Colpo conseguiram um feito no agro brasileiro com a Boa Safra. Imersos numa indústria conhecida pela fragmentação e baixa barreira de entrada, a dupla construiu a maior sementeira do país com um modelo de negócio inovador: asset light e, também por isso, escalável.
Mas mesmo com o crescimento acelerado desde o IPO, a líder Boa Safra ainda detém apenas 8,2% do mercado brasileiro de sementes de soja (nos EUA, os três maiores players possuem 75%), o que significa que ainda há uma larga avenida para ser explorada, especialmente porque a cadeia de valor parece destinada a uma consolidação.
Num amplo relatório publicado na última sexta-feira, o BTG Pactual destrinchou a estratégia da Boa Safra, iniciando a cobertura com recomendação de compra dos papéis (SOJA3) e um preço-alvo de R$ 19, um potencial de valorização de mais de 50%.
“O modelo de negócios da Boa Safra tem seus pontos fortes e fracos, como qualquer outro, mas certamente se provou mais escalável, permitindo um rápido crescimento”, escreveram os analistas Henrique Brustolin e Thiago Duarte.
Atualmente, a Boa Safra está avaliada em R$ 1,5 bilhão. Desde a abertura de capital, em abril de 2021, a companhia já se valorizou 32%, um raro de sucesso da última safra de IPOs.
As diferentes sementeiras
No Brasil, a grande maioria dos players possui fazendas próprias para produzir ao menos parte das sementes de soja. É o caso, por exemplo, de companhias como São Francisco e Petrovina.
Há também um modelo no qual agricultores ingressaram na produção de sementes, agregando margens no processo — a semente é vendida com um prêmio da ordem de 10% sobre o grão. Nesse caso, o beneficiamento costuma ficar a cargo de uma companhia terceirizada. É exatamente como a SLC ingressou no mercado de sementes.
“Não vemos esse modelo tão escalável quanto o da Boa Safra, dado o capital necessário para expandir as áreas plantadas para novas regiões”, argumentam os analistas do BTG.
Outro modelo possível é quando o varejo de insumos agrícolas se verticaliza, atuando no beneficiamento e originando as sementes com agricultores parceiros. Redes de revendas que atuam nesse modelo possuem uma vantagem clara para ingressar em sementes: já possuem uma base ampla de clientes. Além disso, a margem de contribuição da venda de sementes é superior a de outros insumos, como defensivos e fertilizantes.
Mas há riscos para as varejistas. Como o processo industrial de beneficiamento é crítico para a qualidade das sementes e esse não costuma e o approach industrial não costuma se o foco das revendas, a estratégia é bastante complexa.
As vantagens da Boa Safra
Na Boa Safra, o modelo é diferente dos três acima. A companhia dos irmãos Colpo não possui fazendas para a produção de sementes. Toda originação é feita com agricultores parceiros.
Com isso, a companhia pode focar no que faz de melhor: o beneficiamento, preservando atributos importantes como germinação e vigor. Para manter as margens da companhia, é fundamental controlar o processo, minimizando os grãos que são descartados e vendidos como commodity porque não têm qualidade suficiente para a comercialização como sementes.
Nesse modelo, a Boa Safra não precisa investir em terras, o que torna seu modelo mais escalável. O desafio aqui é manter parcerias com os agricultores que fornecem as sementes, o que companhia vem conseguindo fazer bem nos últimos anos, notaram os analistas do BTG Pactual.
Outra fortaleza da Boa Safra está no planejamento. Na indústria de sementes, a produção é feita com praticamente um ano de antecedência. Então, é preciso antecipar quais serão as variedades preferidas do agricultor (biotecnologia, germoplasma). Um erro nessa estratégia pode frustrar as vendas.
As forças da consolidação
Na leitura dos analistas do BTG Pactual, o processo de consolidação do varejo agrícola é outro fator que estimula a concentração entre as sementeiras. Cada vez mais, os compradores têm interesse em trabalhar com um número menor de fornecedores, concentrando o relacionamento nos melhores e mais confiáveis.
“À medida em que os varejistas se expandem para novas regiões, terão de obter as melhores variedades de sementes adequado para essas áreas […] Se o objetivo dos varejistas é ter um número menor de fornecedores confiáveis, algumas das sementeiras devem crescer junto com eles. Acreditamos que Boa Safra está liderando esse processo”, prosseguem os analistas.
Ao que tudo indica, boa parte do crescimento da Boa Safra nos próximos anos — sobretudo em sementes de soja — virá organicamente. Pela formatação das sementeiras, que geralmente possuem terras, os M&As parecem menos prováveis para a companhia dos irmãos Colpo.
Nos cálculos dos analistas, a receita líquida da Boa Safra deve praticamente dobrar até 2027, saindo de R$ 2,1 bilhões neste ano para R$ 4 bilhões. O Ebitda, por sua vez, passaria de R$ 247 milhões para R$ 505 milhões, com as margens oscilando entre 12% e 13%.
Novas avenidas
Além do crescimento em sementes de soja, a Boa Safra possui diversas outras alternativas de crescimento, com a entrada na produção de novas sementes — o trigo, que deve crescer no Cerrado — é uma opção.
A expansão em sementes milho, onde a companhia estreou no ano passado com a aquisição da Bestway, também pode garantir crescimento e geração de valor.
Há também uma oportunidade de intermediar a venda de insumos agrícolas para os produtores parceiros que cultivam as sementes para a Boa Safra. Segundo Brustolin e Duarte, essa vertical tem potencial para agregar mais R$ 546 milhões em receita para a companhia, um número que sequer entrou nos cálculos de valuation dos analistas.
No fim do dia, a Boa Safra permite aos investidores se exporem ao agronegócio brasileiro com grande potencial de crescimento, menor exposição à volatidade dos preços das commodities e retornos relativos mais altos na comparação com agricultores. Para os analistas do BTG, é uma boa aposta.