Entrevista

“Boa Safra quer repetir o feito do IPO”, diz Marino Colpo

Queridinha dos investidores, companhia vai acelerar ritmo de expansão em centros de distribuição e vê boas oportunidades em M&A de sementes

Marino Colpo comemora o follow-on da Boa Safra

De fala mansa, o goiano Marino Colpo transita com desenvoltura pela Faria Lima sem perder as raízes do campo e a paixão pela Boa Safra, a sementeira que se tornou um retumbante sucesso — e um raro consenso entre os analistas dos bancões.

Na era das redes sociais, Marino é uma presença frequente no Instagram, com um tino para o marketing que faria inveja a muitos empresários do mercado financeiro. SOJA3, o ticker da Boa Safra na B3, não deixa mentir.

Aos 40 anos, o empresário e a irmã Camila Colpo ostentam o título de melhor IPO desde 2021 (como mostra um recente relatório feito pela XP), um feito e tanto para um mercado de ações que se tornou sorumbático desde então. Em bolsa, a Boa Safra está avaliada em R$ 2,4 bilhões.

Desde a estreia na B3, as ações da sementeira subiram mais de 85%, refletindo os bons resultados em um mercado que anseia cada vez mais por lucratividade. Da listagem para cá, o faturamento da companhia dobrou, atingindo R$ 2 bilhões em 2023.

O lucro aumentou ainda mais, chegando a um CAGR de 71% ao ano, considerando os dados desde 2019. Tudo isso praticamente sem se endividar — hoje, a Boa Safra tem caixa líquido.

É uma situação completamente diferente da crise que alguns players de insumos agrícolas enfrentam diante da queda do preço da soja. A Boa Safra vem passando praticamente ilesa à crise, demonstrando a resiliência dos preços das sementes e, mais do que isso, a diferença que a tecnologia embarcada nas sementes faz.

É um DNA que a empresa quer preservar para o ciclo de crescimento dos próximos três anos.

Novo ciclo

A sementeira soube aproveitar o entusiasmo da Faria Lima para abrir um novo ciclo de crescimento que, a julgar pelas palavras de Marino, será tão relevante quanto a trajetória construída da abertura de capital até aqui.

Na quinta-feira passada, a companhia voltou ao mercado de capitais, desafiando o mau-humor dos investidores ao emplacar um follow-on de R$ 300 milhões — que teve a maior parte dos recursos vindo de investidores de fora do bloco de controle. A família Colpo colocou R$ 90 milhões desse total e a gestora HIX, outros R$ 30 milhões.

“Não tenho guidance para te dar, mas a nossa ambição é repetir o feito. Há uma oportunidade enorme no agro”, disse o empresário em entrevista concedida ao The AgriBiz na tarde desta quinta-feira.

Em um mercado conhecido pela pulverização, Boa Safra é maior candidata a consolidá-lo. Atualmente, a companhia é a líder entre as sementeiras, com um market share de 8,5% (eram 7,4% em 2022). A ambição é chegar a 15% até 2027, como o próprio CEO já havia sinalizado em conversas anteriores.

Os investimentos da Boa Safra

Com o caixa recheado após o follow-on, a Boa Safra não abre mão do foco na qualidade das sementes e no relacionamento com as revendas de todo o Brasil. Hoje, as sementes da Boa Safra estão em 1 a cada 8 hectares plantados no Mato Grosso.

A companhia vai manter o trabalho feito nessa frente ao longo do próximo ciclo, mas mira agora, também, a oportunidade de desenvolver novas alternativas de crescimento, que vinham avançando de forma tímida dentro da companhia.

No ano passado, a Boa Safra investiu ao todo R$ 219 milhões. Agora, com os R$ 300 milhões captados no IPO, pelo menos duas avenidas de crescimento serão reforçadas pela empresa: a expansão de centros de distribuição e a agenda de M&As para avançar em outras sementes além da soja.

Nos últimos três anos, a Boa Safra inaugurou um CD por ano, mas, neste ano, dois já foram inaugurados — e, ao que tudo indica, há espaço para mais. 

O racional de investir nessa linha de negócio é simples de entender. Os CDs aproximam a semente do produtor, reduzindo as distâncias para a fazenda. Num país do tamanho do Brasil, estar próximo faz toda diferença.

Atualmente, ainda há produtores que estão de 300 quilômetros a 500 quilômetros de distância de uma semente de boa qualidade, contou Colpo. “Hoje, existe uma grande demanda por tecnologia, por tratamentos com químicos e biológicos, que são feitos no CD”, diz Colpo.

Com essa expansão, a Boa Safra também pode melhorar a gestão logística com as revendas parceiras, conseguindo entregar produtos diretamente para elas na ponta. 

M&As

A estrutura de capital saudável também abre espaço para a Boa Safra ir além do ‘feijão com arroz’ (com o perdão do trocadilho). Segundo Marino, a diversificação de culturas é uma oportunidade e aquisições podem fazer sentido.

Fazer M&A não chega a ser uma novidade para a Boa Safra, mas a companhia adota uma postura diferente dos habituais consolidadores do agro. Ao longo de sua história, o crescimento orgânico sempre foi o principal vetor. As aquisições só acontecem em circunstâncias especiais.

Em 2021, a Boa Safra comprou a DaSoja, de olho em melhorar a capacidade de sua atividade principal, de sementes de soja. Em 2022, adquiriu Bestway, o que marcou a entrada em sementes de milho — atualmente, a Boa Safra possui 66% do negócio.

A companhia segue de olho na semente de milho e em outras culturas, como forrageiras, feijão, sorgo e trigo. “A gente já tem todas essas culturas dentro de casa, já tem equipe e time. O que fizemos foi captar dinheiro para de fato conseguir investir nessas outras culturas e ampliá-las”, diz Colpo.

Nesse caminho, a estratégia primária de crescimento é orgânica, mas, reafirmou o CEO, há espaço para movimentos inorgânicos. No momento, a companhia está avaliando diferentes oportunidades na área de sementes, de olho em ativos de sementes propriamente ditos ou de tratamentos que são aplicados nas sementes. Não há outros ativos fora desse escopo sob análise hoje. 

No roadshow que fez aos investidores durante o follow-on, a Boa Safra detalhou os critérios analisados em um M&A: sinergias operacionais, canais de vendas e crescimento, integração de produtores e diversificação.

Nesses critérios, é inevitável não lembrar do negócio de sementes da Agrogalaxy, que vem buscando um sócio operador. O ativo seria capaz de trazer uma capacidade nova de escoamento dos produtos no varejo para a Boa Safra. Questionado a respeito, Colpo disse apenas que “não comenta ativos específicos”. 

Nos dois M&As realizados até aqui, os sócios originais continuaram com uma parcela do negócio, apesar de a Boa Safra ser majoritária. Um modelo que agrada Colpo. Curiosamente, esse também é o desejo da Agrogalaxy (manter um participação no negócio de sementes).

“Até gosto mais quanto tem sócio que fica no negócio. Numa aquisição, quando sai todo mundo, fica muito mais fácil de perder pessoas e relações comerciais. Já vi muita transação no setor em que negócios foram esvaziados e o resultado não ficou muito bom”, contou Marino, despistando sobre qualquer relação com a Agrogalaxy.