Opinião

O grande trade da terra — quem leva as pechinchas?

“Muita terra vai trocar de mãos, mas veremos que o mercado está aquecido e não teremos uma correção violenta dos preços”

Fazenda terras

Quando pensamos em análise fundamental de riscos de commodities, geralmente começamos pelas grandes tendências demográficas e macroeconômicas, que podem nos dar pistas sobre como governos e mercados endereçarão questões geopolíticas e de desequilíbrio entre oferta e demanda.

O Brasil já tem muito claro seu papel de protagonista nas missões de alimentar os 2 bilhões de habitantes que a ONU acredita que irão se somar à população atual durante os próximos 30 anos e de prover biocombustíveis para que esse crescimento seja ecologicamente sustentável. Muitos governos entrarão e sairão nesse meio tempo, mas o desafio permanecerá.

Dessa forma, não é surpresa a valorização das terras agricultáveis ocorrida por aqui nos últimos cinco anos depois de um período de estabilidade. Vale notar que um movimento semelhante de alta após estagnação ocorreu, em escala menor, nos Estados Unidos nessa mesma época.

A aceleração do valor da terra é catalisadora do ciclo virtuoso da produção, uma vez que o valor disponível para garantir financiamentos aumenta e permite que ocorram mais investimentos em produtividade, seja por abertura de áreas, melhor manejo do solo, aumento de área irrigada.

Essa grande tendência de valorização da terra dá até um conforto extra para quem fornece crédito, entende que o mercado das commodities é volátil e tem uma visão mais de longo prazo, uma vez que é muito provável que a garantia cresça de valor durante sua execução.

Os grandes vencedores neste ciclo estão sendo os produtores que tiveram visão, adquiriram terras com potencial e investiram em conversão e abertura de áreas, além de aplicarem muita tecnologia porteira para dentro.

Certamente, existem os casos de quem tentou dar passo maior que a perna e se apertou na volatilidade de curto prazo da oferta e demanda dos produtos, mas a grande tendência permanece. Por isso muita terra vai trocar de mãos, mas veremos que o mercado está aquecido e não teremos uma correção violenta dos preços.

Além das conhecidas empresas listadas, fundos de investimentos especializados em terras produtivas estão surgindo e estarão prontos para abocanhar as pechinchas (distressed assets no linguajar da Faria Lima), mas não haverá muitas.

***

Direto da mesa de risco

Guerras são aqueles fatores que sabemos como começam, mas nunca como terminam, vide o conflito entre dois grandes produtores agrícolas que já dura mais de dois anos e que hoje tem pouco espaço na mídia.

Mas eventos entre potências nucleares sempre serão uma luz piscante para os gestores de risco, especialmente em disputas históricas no Oriente Médio. Todos esperamos que os eventos que assistimos nos últimos dias tenham sido apenas uma comparação de forças e que não haja escalada na violência.

Para o mundo da soja, o grande destaque das últimas semanas foi o Real, que já vinha sofrendo com os dados de economia forte nos Estados Unidos e dúvidas sobre a nossa situação fiscal futura.

Interessante foi observar um aumento de comercialização da safra quando o dólar acelerou do 5,20. O produtor local ajudou a amortecer o impacto acima deste nível (e pressionou a cotação de Chicago).

***

Rafael Harada, colunista de The AgriBiz, é CEO e cofundador da Virtus Advisors, possui mais de 20 anos na gestão de riscos de commodities e câmbio na JBS, onde foi diretor global de gestão de riscos. É engenheiro com ampla experiencia em mercados de commodities agrícolas e finanças corporativas.