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Por dentro da Tocaya de Juliana Ganan, uma referência em café

Juliana Ganan comemora sete anos da Tocaya, torrefação do sul de Minas dedicada aos cafés especiais adquiridos diretamente dos produtores

Uma proporção de água e outra de café, pronto, tem-se uma das bebidas mais famosas do mundo. Mas por trás dessa xícara, muitas transformações aconteceram com esse fruto, do cultivo ao beneficiamento, e que carrega as características da região onde foi produzido, como topografia, geologia, clima e microclima, cultura, história e tradição, ao que os franceses dão o nome de terroir.

Essa complexidade faz parte do universo de trabalho da empresária Juliana Ganan, que se dedica aos cafés especiais (grãos que atingem de 80 a 100 pontos conforme metodologia de avaliação sensorial da SCA- Specialty Coffee Association).

Há sete anos à frente da Tocaya Torradores de Café, em Itajubá, no sul de Minas Gerais, Juliana torra os grãos produzidos nas Serras da Mantiqueira e da Canastra (MG), Caparaó (MG e ES) e Serrana (ES).

“A Tocaya foi instalada em Itajubá por estar mais próxima dos produtores [a compra é direta do cafeicultor] e por uma razão de custos”, comenta. O Brasil tem 32 origens distintas produtoras de café e 135 variedades de café arábica, segundo o Registro de Cultivares do Ministério da Agricultura.

A última pesquisa da consultoria Euromonitor apontou que o mercado de cafés especiais movimenta R$ 1,7 bi por ano | Crédito Shutterstock

Mas foi também em Itajubá que Juliana nasceu, viu o pai Ibrahim Ganan trabalhar como produtor e comerciante de café verde e se dedicar à torra (na época só havia grãos commodities) alguns anos antes de falecer. Por uma dessas costuras do destino, a Tocaya ocupa a casa vizinha da antiga torrefação dele.

Não passava pela cabeça de Juliana fazer planos de sucessão nos negócios paterno. No caminho oposto, ela foi para bem longe deles. Se formou engenheira agrícola, fez pós em administração de empresas e mestrado em relações internacionais com foco em políticas públicas para pequenos e médios produtores, na New York University (EUA).

Foi nos arredores da universidade, em 2011, que passou a conhecer cafés bem tratados e rastreados, e servidos de forma impecável. E topou com a foto de um produtor de Carmo de Minas, conhecido do pai dela, na embalagem de um pacote. “A vida às vezes dá uns pulos e a gente corre para alcançar, e não cair”, comenta a empresária.

Nos Estados Unidos ela passou a estudar, ler e escrever sobre cafés especiais (ela é colaboradora da Sprudge, revista americana sobre o tema) enquanto trabalhava no Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), em Washington. “No paralelo, imaginava algum negócio no Brasil, tudo ainda muito novo na época”, diz.

Há alguns anos, esse mercado cresce em franca expansão tendo em vista o número de cafeterias e micro torrefadoras abertas, embora as pesquisas não acompanhem essa evolução. A última feita em 2016 pela consultoria Euromonitor International apontou que esse mercado movimentou R$ 1,7 bilhão, embora represente 2,8% em volume total de café comercializado no país.

Os planos e o sonho venceram a “segurança” da carreira internacional, para a preocupação da mãe e a surpresa do tio. “Uma menina tão culta e estudada vai cuidar de café?” – opinião mudada quando tomou um espresso extraído pela sobrinha. “O melhor da minha vida”, recorda Juliana sobre as palavras do tio.

No retorno a Itajubá, Juliana ainda trabalhou remotamente para o BID até instalar a Tocaya, pagar pelos equipamentos, enfrentar as burocracias gigantes para um pequeno negócio e ganhar espaço e reconhecimento pelos perfis do café que torra. “Limpos e elegantes, sem intervenções no processo”, é o que busco na minha assinatura. A média de produção é uma tonelada por mês e os cafés são distribuídos para cafeterias e restaurantes de São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná, especialmente, além das vendas pelo site para todo o Brasil.

Nesses sete anos, a Tocaya se tornou empresa B (certificada pelo Sistema B mundial ao reconhecer práticas ambientais e socioeconômicas sustentáveis), Juliana escreveu um livro (Por trás da sua xícara) e não duvida do caminho escolhido, mesmo quando perdia horas de sono e sacas de café em busca de uma bebida elegante.