Por que o produtor aumentou a área de soja

Os produtores brasileiros mantiveram o ritmo de aumento na área da soja na safra 2025/26 apesar de enfrentarem uma crise de crédito e queda nas margens. Com o plantio caminhando para a reta final, a expectativa é que a área aumente entre 2% e 4% — o que alguns analistas consideram surpreendente em meio ao cenário adverso.

“Falar em 2% de crescimento de área é pouco para o que o Brasil está acostumado. Mas, pela situação em que estamos, crescer em 1 milhão de hectares é bastante significativo e, de certa forma, surpreendente”, afirmou André Pessoa, CEO da Agroconsult, em evento na semana passada. A projeção da consultoria é de que a área plantada chegue a 48,8 milhões de hectares nesta safra.

A expansão de área, que continua acontecendo principalmente nas novas fronteiras agrícolas, sobre áreas de pastagem degradada, deve resultar em uma safra recorde de soja no maior produtor e exportador da commodity. Por enquanto, as estimativas de analistas e da Conab apontam para uma produção em torno de 178 milhões de toneladas.

A analista Daniele Siqueira, da AgRural, também usou a palavra “surpreendente” ao se referir ao aumento de área. “Foi crescendo ao longo dos levantamentos nos últimos meses. Talvez seja a esperança do produtor de preços melhores mais adiante”, diz.

Para a AgRural, a área plantada com soja chegará a 49,1 milhão de hectares, número em linha ao da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento). Segundo a Conab, a expansão será de 1,8 milhão de hectares.

Extremos

Atualmente, um produtor típico do Cerrado brasileiro tem uma dívida que representa aproximadamente 2,5 vezes o Ebitda dentro do sistema financeiro, disse Pessôa citando dados de um estudo realizado pela Agroconsult.

“Não é um desastre, é uma média aceitável. Mas ela esconde uma disparidade muito grande de situações”, afirmou. Existem casos de produtores com alavancagem entre 7 e 8 vezes o Ebitda, disse Pessôa.

No Rio Grande do Sul, no sul do País, os produtores estão menos capitalizados e os bancos estão mais seletivos nos empréstimos após sucessivas perdas de produção por causa do clima adverso. Já no Mato Grosso, maior estado produtor, os agricultores estão em condições melhores após uma colheita recorde na safra passada.

A disparidade no nível de alavancagem entre os produtores pode explicar, em parte, porque a área de soja no Brasil continua aumentando mesmo em um ambiente desafiador.

“As notícias acabam colocando holofote na questão do crédito e ficamos com a impressão de que essa restrição é generalizada. Mas a nossa avaliação é de que tem uma parcela de produtores muito bem financeiramente — e são esses produtores que continuam crescendo”, disse Marcos Rubin, fundador da Veeries, ao The AgriBiz.

Esses foram os produtores que não cometeram excessos na época de colheitas fartas, preços altos e crédito abundante, enquanto outros agricultores, que fizeram investimentos pesados nos últimos anos, agora começam a ter problema para sanar as dívidas em um ambiente de taxas de juros muito elevadas.

“Você tem extremos no mercado. Você tem um grupo de produtores que, de fato, tem margens apertadas e problemas de crédito, principalmente porque investiram demais e eventualmente tiveram quebras de safra. E você tem uma outra parcela do mercado que cresceu pouco, investiu pouco, acumulou as receitas dos anos bons da soja e está financeiramente saudável e tranquilo. Esse cara continua crescendo”, afirma Rubin.

Margens em queda

Em meio a um aumento nos custos de produção e preços mais baixos no mercado interno, a margem do produtor com as vendas de soja deve cair em 2025/26 — o que, em tese, também deveria desestimular a expansão. Segundo a consultoria agro do ItaúBBA, a margem com a soja passará de 45%, na safra passada, para 33%.

Mas, apesar de estar longe das máximas de 2021 e 2022, os produtores continuam tendo margens positivas, observou Rubin. “As margens de soja e de milho são razoáveis e suficientes para bancar esses investimentos [em expansão de área]”, afirmou, numa referência aos produtores que estão numa situação financeira confortável. Nos cálculos da Veeries, a margem da soja ficará em torno de 35% em 2025/26.

André Pessôa aponta ainda um outro fator: os produtores capitalizados podem estar de olho no retorno com a valorização da terra, e não apenas na produção agrícola.

“Especialmente na fronteira, a decisão não é apenas olhando a operação farming, mas também de real estate. Ou seja, a expectativa de que um ativo, ao ser transformado, terá outro valor no futuro.”

Clima decisivo

Com o plantio de soja concluído em aproximadamente 90% da área, os próximos dois meses serão decisivos para a definição da safra. Até o momento, o padrão das chuvas continua muito irregular, com pontos de estiagem em Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Minas Gerais — o que começa a levantar preocupações.

“O máximo potencial produtivo talvez já não seja atingido em Goiás e em parte de Mato Grosso. Mas temos dados bastante sólidos que mostram uma correlação muito baixa entre volumes de chuva em outubro e novembro e produtividade final no Cerrado. Se o clima for favorável em dezembro, os dois estados ainda podem ter uma safra muito boa”, afirmou Daniele Siqueira.

No Sul do Brasil, a preocupação é com a La Niña, fenômeno climático que tende a diminuir as chuvas na região. Segundo o Inmet, as chuvas devem ficar abaixo da média histórica em toda a região Sul em dezembro. Já para o Centro-Oeste, o Inmet prevê precipitações acima da média neste mês, o que deve favorecer o desenvolvimento da safra.