Agricultura Regenerativa

A rota da Nestlé rumo ao café regenerativo

Multinacional vai apoiar 3,8 mil produtores com consultoria para práticas de agricultura regenerativa, ampliando fornecimento de café mais sustentável

Fazenda de café Ponta da Serra em Capetinga (MG), parceira da Nestlé em agricultura regenerativa | Crédito: Karina Souza
Fazenda de café Ponta da Serra, em Capetinga (MG), parceira da Nestlé em projeto de agricultura regenerativa | Crédito: Karina Souza

CAPETINGA (MG) — Um engenheiro civil, uma arquiteta e uma médica se unem para… fazer café. Essa é a história dos irmãos Tulio, Natália e Carla Mambrini, que até tentaram seguir caminhos diferentes da cafeicultura, mas acabaram dando sequência ao trabalho realizado pela família há 45 anos.

“Meu pai adquiriu a primeira propriedade em sociedade com alguns tios nossos e com meu avô, mas, com o tempo, só ele ficou no negócio. Em 2005, nós passamos a administrar as fazendas, de olho em trazer para essa nova geração o conforto que nós tivemos”, explicou o produtor rural Túlio Mambrini, durante uma visita do The AgriBiz à Fazenda Ponta da Serra, uma das quatro propriedades da família.

No caminho para cumprir essa missão, o trio aumentou a área cultivada em 200 hectares desde 2018 — ao todo, são 330 hectares dedicados à produção do grão — além de investir na melhora do manejo e da qualidade da produção.

Nesse aspecto, a família passou a incluir recentemente práticas de agricultura regenerativa. “Em 2019, nós começamos a trabalhar com o plantio de mix de cobertura para erradicar o capim amargo. Temos também uma composteira que usa a casca do café combinada com esterco para diminuir o uso de fertilizante”, destacou Túlio.

A família, hoje, já colhe cerca de 30 sacas por hectare — acima da média nacional, destacam os produtores. Na fazenda Ponta da Serra, que tem pouco mais de 100 hectares, chegam a colher entre 45 e 50 sacas por hectare.

Para aumentar ainda mais a produtividade, apoiada em sustentabilidade, a família entrou em outubro do ano passado no Nescafé Plan, uma iniciativa da Nestlé voltada a fornecer consultoria para produtores adotarem práticas regenerativas. Hoje, todo o café comprado pela multinacional no Brasil vem somente de produtores credenciados no programa.

São ao todo 2,2 mil produtores cadastrados atualmente, e a meta é chegar a 3,8 mil produtores até o próximo ano. É a maior inclusão no intervalo de um ano desde que o Nescafé Plan surgiu, em 2011.

“A gente desenvolve a cadeia de produtores, mas também a das tradings, porque todos os stakeholders precisam seguir os nossos protocolos de responsable sourcing. É um grupo que conecta produtor, trading, agrônomos de campo e a nossa equipe de gestão”, destaca Rodolfo Clímaco, gerente de agricultura da Nestlé.

O programa ganhou mais impulso recentemente, apoiado nas metas de sustentabilidade da multinacional até 2030. Para incentivar produtores, além da consultoria no campo, a Nestlé paga um prêmio sobre o café comprado aos produtores, mas não divulga qual é o valor.

“A gente até superou algumas das metas para o Brasil, dado o tamanho do mercado. Por exemplo, alcançamos 41% de matéria-prima proveniente de agricultura regenerativa em 2025, quando a meta era 30%, já superada em 2024. Para café, puxamos isso cada vez mais, com todos os produtores tendo pelo menos uma prática”, explica Bárbara Velo, head de ESG da Nescafé.

Hoje, 76% dos produtores que fazem parte do Nescafé Plan são classificados como avançados em práticas de agricultura regenerativa. Isso não significa, contudo, que eles precisem estar em um estágio avançado — como o dos Mambrini — para fazer parte do plano, que está presente em 16 países.

Muda de Ingá plantada no cafezal da Fazenda Ponta da Serra para atrair inimigos naturais de pragas | Crédito: Divulgação

Para entrar no programa, os produtores têm de mostrar certificações de sustentabilidade, além de preocupações com o pilar social (instalando um canal de denúncias direto para a Nestlé, por exemplo) e com o ambiental, com planos de conservação da água, por exemplo.

“Hoje, 98% dos produtores mapeados por nós no Espírito Santo e Bahia usam irrigação, percentual que é de mais de 20% em Minas Gerais e São Paulo. Nós fizemos um projeto piloto de monitoramento do consumo de água com 20 produtores e conseguimos uma redução de 60% no gasto desse recurso natural. Agora, o foco é convencer os demais de que essa iniciativa é válida”, diz Clímaco.

Nos resultados já obtidos pelo programa até aqui, o executivo destaca que os produtores que fazem parte do Nescafé Plan conseguem, ao longo do tempo, uma redução de 15% no uso de fertilizantes químicos nas fazendas.

É o caso, por exemplo, da fazenda dos Mambrini. Além de usar a composteira — a partir de uma mistura feita com a casca do café —, os produtores também passaram a usar biológicos on-farm e, recentemente, plantaram Ingá no cafezal (a árvore atrai inimigos naturais da broca e do bicho-mineiro).

“Desde 2020, a gente vem observando muita quebra de safra na região. Como nós incorporamos muita área desde 2018, ainda não conseguimos medir o aumento de produtividade dessas práticas, mas percebemos que a lavoura vem se tornando mais resiliente”, diz Túlio Mambrini.

*A repórter viajou a convite da Nestlé.