
A crise financeira da Raízen abriu uma janela para as concorrentes no entorno de Sertãozinho, aliviando a disputa em uma das regiões mais difíceis para comprar cana-de-açúcar.
Em uma transação anunciada nesta terça-feira, a Raízen decidiu fechar a usina Santa Elisa, uma das mais tradicionais do interior paulista.
Inaugurada pelas famílias Marchesi e Biagi na década de 1930, a planta integrava o parque industrial da sociedade entre Cosan e Shell desde 2022, quando a Raízen comprou a Biosev.
Ao desativar a usina, a Raízen para de perder dinheiro em uma operação menos eficiente e, ao mesmo tempo, melhora a estrutura de capital com a venda da cana que abastecia a Santa Elisa.
Pelos termos do acordo, a Raízen vai receber cerca de R$ 1 bilhão pela venda de 3,6 milhões de toneladas de matéria-prima, incluindo cana própria e cessão de contratos com fornecedores.
A beleza do acordo pode ser medida pelo número de compradores. Ao todo, seis grupos sucroalcooleiros estão comprando a cana da Raízen: Alta Mogiana, Bazan, Batatais, São Martinho, Pitangueiras e Viralcool.
“É positivo para todo mundo”, avaliou Wilian Hernandes, sócio da consultoria FG/A, lembrando que o lado comprador terá uma competição menos voraz pela cana na região de Sertãozinho.
No raio de 65 quilômetros que circunda a Santa Elisa, há 15 usinas sucroalcooleiras, distribuídas entre 12 companhias, incluindo a própria Raízen. Dessas, seis participaram da transação. Ficaram de fora cinco companhias: Balbo, Tereos, Santa Adélia, Pedra e Carolo, segundo levantamento da FG/A.
Venda é bem-recebida pelo mercado
Entre os analistas que cobrem as ações da Raízen, a venda do canavial que abastecia a Santa Elisa foi bem recebida, sinalizando a continuidade da ampla reestruturação iniciada há sete meses com a chegado de Nelson Gomes como CEO.
Em maio, a Raízen fez um até então inédito desinvestimento com a venda de uma usina em Leme (SP) por R$ 425 milhões — foi a primeira venda de um complexo sucroalcooleiro na história do grupo.
Com as medidas, a companhia quer reduzir o endividamento, que totalizava R$ 34,2 bilhões ao final da safra 2024/25 — o montante disparou quase 80% em um ano, elevando a relação entre dívida líquida e Ebitda de 1,3 vez para 3,2 vezes no período.
Em um relatório divulgado após a transação da Santa Elisa, os analistas Leonardo Alencar, Pedro Fonseca e Samuel Isaak, da XP Investimentos, elogiaram a reciclagem de ativos, mas ressalvaram que os desinvestimentos até aqui ficaram restritos ao segmento de açúcar e etanol.
Segundo a XP, o mercado ainda espera que o processo continue e que inclua a venda da operação de refino que a companhia possui na Argentina. A casa recomenda a compra das ações da Raízen (RAIZ4), com preço-alvo de R$ 4,40 — contra uma cotação atual de R$ 1,53.
Na avaliação dos analistas da XP, o preço foi positivo. “O múltiplo de US$ 53 por tonelada é ligeiramente melhor que o esperado, já que vemos a referência de mercado entre US$ 40 e US$ 50. Contudo, devido à localização privilegiada da Santa Elisa, acreditamos que futuros negócios ocorrerão a múltiplos menores”, comentou a XP.
Certamente, o número de compradores potenciais da cana da Santa Elisa ajudou a esticar os preços, o que não deve se repetir caso a Raízen faça operações semelhantes em usinas onde há menor concorrência por cana.
O Itaú BBA também classificou o negócio como positivo. “A transação está em linha com a estratégia de reciclagem do portfólio de ativos, redução de endividamento e melhoria da eficiência agroindustrial”, afirmaram os analistas Monique Martins Greco Natal e Eric de Mello. O banco estima um preço-alvo de R$ 4,50 para a ação.
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Na bolsa, a Raízen está avaliada em R$ 15,7 bilhões, acumulando uma desvalorização desde o início do ano. Os papéis operam de lado nesta terça-feira.