
A BrasilAgro não encontrou nenhum match para vender fazendas no primeiro trimestre do exercício 2026, encerrado em setembro. Para piorar, a companhia viu o ano ficar no zero a zero no trade de produtos agrícolas e teve uma queda na produtividade da cana devido a problemas climáticos.
A soma desses fatores pesou no balanço, com uma queda de 33% na receita líquida na base anual, para R$ 302,9 milhões, que deu o tom das principais linhas na demonstração de resultados.
O Ebitda diminuiu expressivos 62% na comparação com o mesmo período do ano anterior, ficando em R$ 64,3 milhões. Com isso, o prejuízo se aprofundou — de R$ 10,4 milhões no primeiro trimestre do ano fiscal 2025 para R$ 64,2 milhões.
O resultado sucede um ano inteiro sem aquisições de novas propriedades, o que a companhia creditou à falta de preços e de taxas de retorno atrativos.
Com esse pano de fundo, os números da companhia, uma das líderes no País em comprar, desenvolver e vender propriedades rurais, reforçam a impressão de uma deterioração das condições na ponta produtiva, no embalo da escassez de crédito e das margens ainda mais apertadas que nos últimos anos.
“Carrego” da soja atenua prejuízo
Gustavo Lopez, diretor financeiro e de relações com investidores, apresentou alguns contrapontos ao resultado ruim. Segundo ele, desconsiderando as operações imobiliárias, o Ebitda do primeiro trimestre fica “no geral muito parecido com o do ano passado”.
Além disso, segundo Lopez e o CEO André Guillaumon, a empresa colheu os frutos de uma escolha feita no início do ano por “carregar” uma parte da soja para o segundo semestre.
A expectativa era de que houvesse avanço nas negociações comerciais entre Estados Unidos e China e entre os EUA e o Brasil com reflexo positivo nos preços — deu certo.
“Quando o ‘basis’ (diferença de preço entre o mercado local e o contrato futuro na bolsa) estava negativo, a gente decidiu carregar. À época, o avanço nas discussões parecia distante, então tomamos crédito para assegurar o fluxo de caixa em março e abril. A decisão se mostrou acertada”, disse o CEO.
Segundo ele, com o saldo do último trimestre, 56% da colheita foi vendida. E boa parte com “basis” entre R$ 50 e R$ 150 a saca. “Fizemos preço médio melhor”, completou.
Outro fator que atenuou o prejuízo foi uma economia de 8% no óleo diesel. “Orçamos em R$ 5,90 o litro, mas compramos entre R$ 5,40 e R$ 5,50. Não é de soltar foguete, mas resultou em uma redução de custo de frete em algumas praças”, explicou Lopez.
O clima azedou a cana
A companhia tem hoje um portfólio de fazendas que soma 252.796 hectares divididos em seis Estados, além de Paraguai e Bolívia, com 63% em áreas próprias e 37% em arrendamentos.
Seu faturamento é composto da receita de vendas de fazendas, que havia sido de R$ 129,3 milhões no primeiro trimestre de 2025 e, agora, veio zerada, e da receita com as atividades de trading.
Esta última costuma servir de “seguro” em momentos em que a receita operacional diminui. Mas, neste trimestre, não funcionou, com diminuição de 7% na base anual.
Todas as culturas ficaram “praticamente no zero a zero” na comparação com o mesmo período do ano fiscal 2025, segundo Lopez — a exceção foi a cana.
Tradicionalmente relevante nos primeiros trimestres da BrasilAgro, a fruta pesou neste ano, o que as lideranças atribuíram às queimadas de 2024 e à onda de geadas em julho na região de Brotas (SP).
Em ambos os casos, o resultado foram colheitas precoces, explicou Guillaumon.
Quando há geada, ele diz, não há problema se a cana estiver pronta para colher. “O problema é quando vem em talhões não prontos. Foi o caso: a colheita projetada para outubro precisou ser feita em julho, e tivemos um volume relevante colhido fora do estado ideal de maturação.”
O resultado foi uma redução no ATR — indicador de produtividade que representa a quantidade de açúcar e coprodutos que podem ser recuperados no processamento.
A empresa mirava 139 milhões de toneladas, mas o indicador acabou em 134 milhões. E isso, segundo Lopez, reduziu o Ebitda entre R$ 20 e R$ 25 milhões.
Mercado de terras travado
Guillaumon creditou a ausência de vendas de propriedades ao momento difícil do setor, que afasta compradores. “Há anos, venho falando que somos mais vendedores do que compradores. A análise se mantém, mas falta acomodar o preço.”
Para o CEO, o retrato atual é ruim, e, dado o caráter cíclico do setor, é também injusto. “O agro não pode ser mostrado em uma fotografia. Se mostrar o filme, o saldo é muito positivo; o problema é a foto de agora.”
Seguindo esse raciocínio, Guillaumon diz que o número que importa é a média de vendas em cinco anos. “Nessa métrica, a gente tem R$ 369 milhões por ano. É de se esperar que neste ano alcancemos esse montante? Não, um pouco menos. Mas esperamos fazer negócios.”
O CEO da BrasilAgro afirmou ainda que a compra fica mais complicada em momentos de ressaca do que na bonança.
“Muitas vezes, o produtor está com problemas financeiros, e tem o convencimento familiar: um quer vender, o outro não quer. É um caminho mais moroso.”
Segundo ele, já começou a haver uma acomodação no mercado, e há ofertas sendo analisadas, tanto de compra quanto de venda: “Estamos bem pautados nisso”.
As margens apertadas também obscurecem o arrendamento, mas, nessa via, os sinais positivos estão se adiantando, diz Guillaumon. “A gente já vê uma redução de preços na casa de uma a duas sacas [por hectare]. Mas precisa acomodar mais.”
O problema das RJs
A mencionada falta de condições adequadas está conectada à recente disparada das recuperações judiciais no agro, diz Guillaumon. Segundo ele, nem todos os produtores que estão optando por essa via estão cientes do prejuízo que a escolha pode causar.
“Já há instituições financeiras sinalizando que o futuro vai ser duro”, afirmou. Sem menção direta, a fala se relaciona a uma recente ameaça de Felipe Prince, diretor de riscos do Banco do Brasil, em entrevista à Bloomberg, de banir crédito a produtores rurais que pedirem recuperação judicial.
“O cara que não vai entrar em RJ, preferindo o caminho de trazer ativos para buscar liquidez, é o potencial cliente vendedor para a BrasilAgro”, completou Guillaumon.
Nova safra
Guillaumon e Lopez mostraram otimismo com a nova safra. Nos insumos, a BrasilAgro se diz confortável, com boa parte dos insumos para a safra 2025/26 adquiridos — os níveis são altos no cloreto de potássio (81%), fosfatados (89%) e defensivos (75%). A exceção são os nitrogenados, com 19% do estimado.
“Nos últimos meses, não estava bom para comprar. Agora, estamos comprando a preço mais baixo. Nessa engenharia, buscamos margem”, disse Guillaumon.
Já com relação ao desenvolvimento das lavouras, o prognóstico é positivo, com cerca de 34% do plantio finalizado, apesar de a situação climática demandar adaptações.
“No Mato Grosso, a chuva estava irregular. Por isso, iniciamos em 22 de setembro, paramos e retomamos em 6 de outubro. Desde então, avançamos normalmente.”
O plantio também atrasou no Maranhão e na Bahia. “Historicamente, essas regiões arrancam em 25 de outubro, mas neste ano foi em 3 de novembro. Mas creio que não vai comprometer a safrinha.”
Segundo ele, o que foi plantado até aqui está se desenvolvendo bem, “trazendo a esperança de uma boa safra”. Inclusive para a cana, em cujas regiões de plantio a chuva veio antecipadamente, o que, segundo Guillaumon, significa “um golaço”.