Entrevista

Os planos da Milhão Ingredients depois do casamento com a Amaggi

Fundadores da companhia dizem ao The AgriBiz que vão dobrar a capacidade de produção e estudam expansão internacional

Fábrica da Milhão Ingredients

Quando os irmãos Luciano e Leandro Carneiro criaram a Milhão Ingredients, em 2002, tinham um objetivo singelo: vender flocos de milho para o Nordeste. Com uma capacidade de produzir 180 toneladas por mês, os sócios queriam seguir os passos do pai no agronegócio, mesmo tendo trabalhado em um setor totalmente diferente até então — o ramo de confecção. 

Vinte e dois anos depois, dizer que o negócio deu certo é um eufemismo. Em 2024, a Milhão se tornou a maior companhia de ingredientes secos (dry miling) do País e tem como sócia ninguém mais ninguém menos do que a Amaggi, um dos maiores grupos agrícolas do Brasil. O valor do faturamento é guardado a sete chaves pelos sócios, revelando apenas que a empresa mantém um crescimento de duplo dígito anual.

Em entrevista ao The AgriBiz, os irmãos, que seguem à frente da companhia, mostram fôlego de sobra para avançar. Na mira de gigantes do setor por apresentar margens mais altas do que as atividades de trading e processamento, o mercado de ingredientes deve se manter aquecido ao longo dos próximos anos, especialmente no mercado internacional.

“A Milhão não para. Buscamos alternativas para explorar o mundo, mas, se tiver a oportunidade de estabelecer uma planta em Marte, também estaremos por lá”, brinca Leandro Carneiro, sócio e diretor comercial da Milhão Ingredients.

Em planos mais imediatos, a Milhão vai mais do que dobrar a capacidade de produção de ingredientes nos próximos dois anos, passando de 24 mil toneladas por mês para 60 mil toneladas — crescimento acelerado pela compra de uma fábrica da LDC em Rio Verde

Ainda na área de alimentação, a Milhão viu ganhar espaço ao longo dos últimos dois anos o segmento de co packer, em que, como o próprio nome sugere, a companhia produz e já empacota produtos para os clientes, como a Polentina e a Milharina. “Criamos essa divisão há pouco tempo, mas é um mercado que vai muito bem”, diz Carneiro.

Em projetos de expansão e diversificação, a companhia inaugurou uma fábrica de óleo, a única na América Latina a produzir óleo de milho não transgênico. Resultado de um investimento de R$ 60 milhões, a planta tem uma capacidade de produção de 1,7 mil toneladas.

Além do alimento

Esse é só o começo. Com uma área de pesquisa e desenvolvimento criada ao longo dos últimos cinco anos, a Milhão mantém olhos atentos para explorar oportunidades além do nicho de alimentação, seu core business. Uma das avenidas analisadas — ainda de forma bastante embrionária — é um projeto de etanol a partir de um dos subprodutos do milho fabricados pela companhia.

E, como se não bastasse a expansão em terras brasileiras, a Milhão também estuda novas unidades fora do Brasil, em planos de médio prazo. Hoje, a empresa já exporta para mais de 67 países, que representam cerca de 15% do faturamento da companhia. Neste mês, a empresa visitou o continente asiático para “estudar mais o mercado”. 

O casamento com a Amaggi

Os planos futuros têm o DNA dos fundadores, mas ganharam um empurrão adicional com a chegada da Amaggi ao grupo de sócios. O namoro com a companhia de Blairo Maggi durou aproximadamente seis meses, um período em que a sinergia de cultura entre as “empresas de dono” foi um importante diferencial para a conversa avançar. 

“Quando a Amaggi apareceu, surgiram também outros grandes players multinacionais. Mas tínhamos a preocupação de burocratizar demais a companhia. Era algo que nos dava pânico”, diz Luciano Carneiro, sócio e CEO da Milhão. Igualmente grande, a Amaggi parecia mais dinâmica e mantinha o espírito (positivo) de empresa familiar. “Foram os únicos que nos disseram que só tinham interesse em comprar a empresa se não saíssemos dela”, acrescenta Carneiro.

Colheita de milho

Com a união de forças, a Milhão ganhou principalmente em governança e em controladoria, pontos que já começavam a fazer falta para uma empresa que cresce a duplo dígito anualmente. Os primeiros passos já haviam sido dados —  há cinco anos, a companhia é auditada pela KPMG, por exemplo — mas a sensação geral é a de que a Amaggi trouxe mais robustez ao caminho de governança que já vinha sendo trilhado. 

A Milhão também conseguiu fomentar uma parceria para exportação de milho a granel não transgênico originado no Mato Grosso, além de obter ganhos operacionais de compra de insumos após a união com a Amaggi. “Passamos a ser atendidos por key accounts de várias empresas que a Milhão não era atendida pelo volume que tinha”, explica o CEO.

A história da Milhão

 A construção da trajetória que culminou no sucesso atual começou para valer em 2005, ano em que a Milhão decidiu deixar de lado o fornecimento de flocos de milho ao Nordeste (pela autossuficiência crescente na região) para se voltar ao mercado B2B, vendendo ingredientes à base de milho para uma indústria de cereal matinal.

A tese ganhou um empurrão em 2007, quando o Brasil liberou a produção de milho transgênico. A empresa, que só fabricava milho não transgênico, insistiu na ideia. 

“As grandes companhias tinham pânico de colocar nos rótulos que trabalhavam com milho transgênico, elas não tinham ideia de como o consumidor iria se comportar. Por causa disso, começamos a atender médios e grandes clientes que estão conosco até hoje”, conta Leandro Carneiro, sócio da Milhão Ingredients.

Para garantir segurança no abastecimento, a empresa fez parcerias com produtores para incentivar o plantio de milho convencional. Na última safra, a Milhão teve 178 produtores parceiros, que plantam a semente selecionada a dedo pela companhia. 

Além disso, a Milhão financia o produtor na compra de fertilizantes, químicos e biológicos por meio de operações de barter. Ao final da safra, o agricultor vende o excedente de milho em reais para a companhia. 

Para a próxima safra, a Milhão tem um orçamento de 65 mil hectares de fomento, trabalhando com uma média de 90 a 100 sacas por hectare. Com isso, ainda não conseguirá ser autossuficiente de forma completa, mas mantém o objetivo no radar. Ainda assim, neste ano, em torno de 15% a 20% da demanda de milho deve ser comprada no mercado spot.

Na mesa

Hoje, a empresa fabrica 42 tipos de ingredientes produzidos a partir do milho, vendidos a indústrias alimentícias dos mais variados segmentos. Entre os principais produtos, estão a canjica (usada no cereal matinal) e o canjicão, usado para fazer pipoca doce, por exemplo.

Não é exagero dizer que a companhia está na mesa de quase todos os lares do Brasil. Quem consome cereal matinal, salgadinhos, cerveja ou até mesmo nuggets de fast food pode não saber, mas é um cliente indireto da Milhão. 

“Temos vários cases de sucesso de produtos nossos substituírem uma fécula de mandioca, uma fécula de batata. Hoje, a fécula de batata custa R$ 8 por quilo, e nosso produto custa R$ 3 por quilo, por exemplo. Onde a gente puder substituir alguns amidos e algumas féculas que têm valor mais alto, é economia veia para o nosso cliente”, diz o CEO.