Verborragia

Fala de Alexandre Bompard é inapropriada e desastrosa, diz ex-vice-presidente do Carrefour

“Concorrência é concorrência. A agricultura na França não é competitiva e recebe muito subsídio”, diz Stéphane Engelhard

Carrefour

“A declaração de Alexandre Bompard foi totalmente inapropriada. Inacreditável! Se realmente tiver um boicote ao Carrefour no Brasil, é um desastre”. Assim, sem rodeios, o executivo francês Stéphane Engelhard resume a celeuma criada após o CEO global da rede varejista anunciar que não vai mais comprar carne do Mercosul.

Engelhard fala com conhecimento de causa. Por oito anos, foi vice-presidente de relações institucionais do Carrefour Brasil, posto de onde acompanhou uma das maiores crises de reputação da varejista: o assassinato de um homem negro por seguranças do supermercado em Porto Alegre, em 2020.

Em entrevista ao The AgriBiz, Engelhard se mostrou perplexo com a falta de tato de Bompard, provocando um estremecimento desnecessário na relação da rede com o Brasil, um país crucial para o negócio da varejista. “A operação brasileira faz 40% do Ebitda global”, lembrou Engelhard.

Para ele, o CEO global do Carrefour comprou a narrativa protecionista dos agricultores franceses, se amparando em “mentiras” sobre a sustentabilidade dos frigoríficos brasileiros para afagar o presidente da França, Emmanuel Macron, um político fragilizado após perder a maioria na Assembleia Nacional.

A postura de Bompard também está amparada em uma demagogia barata, até porque o Brasil deve representar menos de 1% da carne que o Carrefour vende na França, estimou.

Engelhard vai além. A ira dos agricultores franceses, que protestam contra o acordo entre União Europeia e Mercosul, vai na contramão do liberalismo econômico. “Concorrência é concorrência. A agricultura na França não é competitiva e recebe muito subsídio”, disparou o ex-vice-presidente do Carrefour Brasil.

Na visão dele, um boicote às compras na varejista, medida defendida por vários líderes do agronegócio — incluindo o governador de Mato Grosso, Mauro Mendes —, é muito difícil de sustentar no longo prazo, mas poderia provocar algum dissabor por algumas semanas, constrangendo Bompard.

Engelhard  lembrou que, durante a crise que se seguiu ao assassinato de João Alberto Silveira Freitas, em Porto Alegre, as vendas do Carrefour sofreram por dois meses. Depois, no entanto, a receita voltou à dinâmica normal.

Também por isso, é virtualmente impossível que os frigoríficos brasileiros interrompam as vendas de carnes para Atacadão e Carrefour Brasil, como sugeriu ontem uma carta assinada por cinco entidades de classe: Abiec, ABPA, Abag, CNA, Sociedade Rural brasileira e Fiesp.

“A carta é só retórica de repúdio. O que queremos é que o CEO do Carrefour se retrate no mesmo local em que fez o ataque”, disse um dos signatários do documento, sob a condição de anonimato.

A palavra está com Bompard.