
Uma mudança estrutural nos fornecedores de genética avícola deve começar a resultar em aumento na oferta de frango já no próximo ano. A análise, que diverge da leitura da maior exportadora de aves do Brasil, é do banco Santander.
Em um extenso relatório sobre o setor, os analistas Guilherme Palhares e Laura Hirata apontam sinais iniciais de um aumento no plantel — resultado de investimentos realizados pelas duas maiores empresas de genética avícola no País: a Cobb-Vantress, que é controlada pela Tyson Foods, e a Aviagen.
Para chegar a essa conclusão, os analistas monitoraram as GTAs, as guias de trânsito animal emitidas pelo Ministério da Agricultura a cada movimentação de aves vivas ao longo da cadeia — sejam reprodutores de linhagem pura, que estão no topo da cadeia, ovos férteis, pintinhos de um dia ou aves comerciais destinadas ao abate.
Segundo os analistas, esse monitoramento gera “dados granulares que permitem antecipar mudanças na oferta em diferentes níveis da pirâmide genética” por trás da produção de aves. No relatório divulgado ontem, o Santander estreou esse acompanhamento, que será contínuo.
“Vemos indicações iniciais de uma nova onda de oferta de frango chegando ao mercado brasileiro em 2026”, afirmam os analistas.
“Até aqui, o crescimento do plantel foi impulsionado principalmente pela redução das exportações de ovos férteis e pelo descarte limitado de matrizes. Neste relatório inaugural de monitoramento, no entanto, os dados sugerem que o plantel agora está prestes a se expandir por meio de um aumento mais estrutural da oferta, vindo dos fornecedores de genética”, acrescentam.
De onde vem a oferta?
Há um ano, a Cobb-Vantress anunciou no município de Prata, no Triângulo Mineiro, um investimento de R$ 60 mesilhões para aumentar a capacidade em 25%. Lá, a companhia possui três incubatórios, um de linhagens puras, um de bisavós e outro de avós. Pelo acompanhamento das GTAs, os analistas acreditam que a operação de Prata já esteja em produção.
“Nosso monitoramento proprietário indica elevado fluxo de saída de aves do município. Caso esses fluxos reflitam produção de matrizes, vemos potencial de maior oferta de frango chegando ao mercado no 1º trimestre de 2026”, dizem.
Ao mesmo tempo, um competidor importante, com crescente participação de mercado, também começa a colher os frutos de investimentos recentes. A Aviagen inaugurou uma nova granja de avós em Santo Antônio da Alegria (SP) em meados deste ano. Segundo o Santander, a unidade tem um potencial estimado de cerca de quatro milhões de matrizes por ano, o equivalente a 8% da oferta brasileira.
O monitoramento das GTAs feito pelo Santander indica que a nova granja tem recebido aves de Santa Cruz das Palmeiras, onde fica o polo genético da Aviagen em São Paulo.
“Com base nesses dados, esperamos que a unidade comece a produzir matrizes por volta de janeiro de 2026, com a produção de carne chegando ao mercado possivelmente a partir de julho”, afirmam os analistas, que fazem uma ressalva: a visibilidade sobre o ritmo dessa rampa ainda é limitada.
“As importações brasileiras de linhagens puras aumentaram fortemente em agosto, o que pode estar ligado a essa expansão de capacidade e, no curto prazo, limitar a operação plena da unidade em 2026”, acrescentam.
As incertezas continuam
Para o Santander, as duas novas unidades de avós adicionam incertezas em relação ao tamanho e ao destino dessa capacidade adicional. Elas podem ampliar a oferta doméstica ou servir como base para exportação de matrizes para países da América do Sul.
O aumento da capacidade na produção de avós também pode não resolver um problema-chave que os produtores de frango vêm enfrentando em todo o mundo: a baixa taxa de eclosão (quando os ovos não viram pintinhos) que marca as atuais linhagens de aves.
Na última divulgação de resultados trimestrais, em novembro, o CEO da MBRF, Miguel Gularte, traçou uma perspectiva de dois a três anos para que as casas genéticas consigam superar o atual gargalo. Segundo ele, a taxa de eclosão caiu cinco pontos percentuais neste ano.
“Ao mesmo tempo, o plantel de matrizes no País está envelhecendo e perdendo produtividade, o que pode limitar a produção de ovos férteis e elevar a mortalidade de pintinhos, compensando parcialmente o aumento de capacidade a montante”, pondera o Santander.
A demanda compensa
Se a oferta aumentar, a demanda deve compensar, segundo os analistas do banco espanhol. “Com expectativa de alta nos preços da carne bovina em 2026, acreditamos que a substituição em favor do frango pode se intensificar, sustentando MBRF e JBS.”
Eles estimam que uma variação de 0,1% na relação de preços entre boi e frango resulte em um aumento de 0,9 ponto percentual na participação do frango no mercado.
Dados do varejo indicam que, mesmo com o maior consumo per capita entre as carnes, há espaço para o frango crescer mais. Enquanto as famílias brasileiras gastam cerca de 1% de sua renda com frango, o dispêndio com a carne bovina representa 3%.
“Os preços da carne bovina seguem sendo o principal determinante para que o mercado permaneça equilibrado em 2026”, concluem.