
TRÊS LAGOAS (MS) — No embalo do crescimento do Vale da Celulose, a Eldorado vai dobrar a área plantada de florestas a partir do ano que vem, chegando a 50 mil hectares de eucalipto no Mato Grosso do Sul.
O objetivo é assegurar matéria-prima suficiente para dar conta do futuro da companhia, tendo em vista que o ciclo do eucalipto é longo — são sete anos do plantio à colheita.
“Uma ampliação da fábrica está em análise. Não temos nada cravado em relação a datas. Mas, a floresta leva sete anos para crescer, a fábrica se constrói em três”, afirmou Carlos Justo, gerente-geral florestal da Eldorado, ao The AgriBiz.
Inaugurada em 2012, a planta produz 1,8 milhão de toneladas de celulose por ano, o que já é 20% mais do que a fábrica foi projetada para entregar, há 13 anos. Esse aumento vem principalmente de eficiências capturadas no processo produtivo, além de melhorias e modernizações no manejo florestal.
Hoje, a Eldorado, uma empresa do grupo J&F, colhe 25 mil hectares por ano e, ao todo, administra um total de 300 mil hectares de florestas no Mato Grosso do Sul. As fazendas têm 670 hectares em média, um número que vem subindo ao longo dos últimos quatro anos.
Uma das maiores propriedades, que veio nesse momento mais agitado para o setor de celulose no Mato Grosso do Sul, é a fazenda Debrasa, com cerca de 3 mil hectares, localizada em Brasilândia (MS), a 65 quilômetros de Três Lagoas.
“Havia muita desconfiança se o eucalipto iria se consolidar da forma como aconteceu no Mato Grosso do Sul. Por isso, começamos com propriedades menores e só agora têm aparecido as maiores”, explicou Justo. “A celulose sempre pagou um pouco mais que a pecuária e, agora, essa diferença ficou ainda mais marcada.”
Mesmo com a valorização pela qual as terras para silvicultura passaram nos últimos anos, os retornos ainda são bastante atrativos para quem arrenda. Nas contas da Acres, consultoria voltada ao mercado de terras, o rendimento anual é de 6,8% — bastante superior aos padrões da agricultura e pecuária.
“Numa média bastante simplificada, a silvicultura paga R$ 1,5 mil por hectare e, a pecuária, R$ 1 mil”, afirmou Justo.
Mesmo com a vinda de diferentes empresas para o Mato Grosso do Sul, cada uma ainda consegue áreas para plantar sem tanta sobreposição, segundo o executivo, dada a baixa densidade populacional do estado e, principalmente, a quantidade de terras a serem convertidas da pecuária.
Num exemplo prático desse momento, a Eldorado já conseguiu arrendar 15 mil hectares (dos 25 mil adicionais que vai precisar para o plantio de eucalipto a ser realizado a partir do ano que vem).
Arrendar, ainda assim, é só primeiro passo (um passo em que, inclusive, a Eldorado foi pioneira no setor). A diferença para conseguir manejar as florestas de forma adequada depende cada vez mais de tecnologia, que vai da semente até a colheita.
A genética do eucalipto
Produzir árvores altas, resistentes à escassez hídrica e com o máximo de aproveitamento para a produção de celulose é uma equação complexa. E que depende de um esforço intenso de pesquisa para descobrir as melhores variedades de eucalipto — ainda levando em consideração a adaptação ao solo do Mato Grosso do Sul.
Nesse sentido, a Eldorado mantém um laboratório, o Eldtech, em que são conduzidos diferentes testes para descobrir as melhores variedades genéticas de eucalipto, os clones usados na plantação. É um processo longo. A média do setor para descobrir um novo clone é de 15 anos, prazo que a Eldorado já baixou para 12 anos.

O processo envolve, de forma resumida, três etapas. Primeiro, são selecionadas as árvores “matrizes” (que já tenham um bom desempenho em campo). Em seguida, são feitas polinizações em diferentes cruzamentos dessas árvores, que vão resultar em várias sementes.
As sementes viram mudas que, ao longo do tempo, são testadas tanto em um ambiente com vários clones juntos como em um ambiente somente formado por clones iguais. Além disso, no meio desse processo, amostras das árvores são levadas para as fábricas, a fim de avaliar o potencial de produção de celulose.
Diferentemente de outros segmentos, a Eldorado não faz trabalhos com transgênicos nem com edição gênica nos materiais.
“Nós fazemos parte de um selo, chamado FSC, que não permite o trabalho com transgênicos e que ainda está analisando o trabalho da edição gênica. Mas, dentro da área de biotecnologia, acompanhamos o tema de perto”, diz Brigidà Valente, gerente de Pesquisa e Tecnologia Florestal.
Depois que o material foi selecionado (passou em todos os testes, em outras palavras), ele vai para um viveiro, localizado em Andradina (SP) para ser produzido em escala. Hoje, a Eldorado tem 180 mil matrizes no viveiro. Cada matriz produz em média 12 cepas (brotos) por mês, segundo Valdemir Brunheroto, gerente de silvicultura da Eldorado.
Esses brotos, por sua vez, levam entre 90 e 120 dias para ficarem no tamanho ideal e, então, saem do viveiro para serem plantados nas fazendas e começarem o processo de sete anos até serem colhidos.

A maior parte do cuidado com as árvores acontece nos seis primeiros meses. Daí para frente, são acompanhadas principalmente para o combate de formigas — e para assegurar que outras pragas, como o percevejo bronzeado, seguem sob controle no manejo integrado de químicos e biológicos. Os defensivos biológicos também são desenvolvidos no Eldtech.
Ao final dos sete anos, vem o processo de colheita, realizado todos os dias dentro da Eldorado, exigindo também um esforço de gestão de times e de atenção à tecnologia. Por dia, a empresa transporta o equivalente a 60 hectares de árvores.
A colheita é totalmente mecanizada, com dois tipos de máquinas, as harvesters (que derrubam as árvores no campo e tiram a casca delas) e as forresters, que pegam esses troncos e transportam de um ponto a outro nas fazendas.
“Trabalhamos com 60 máquinas, aproximadamente, e 20% desse total é renovado a cada ano. Cada máquina dura 25 mil horas, ou cinco anos”, explica Anderson Bobko, gerente de colheita da Eldorado.
O processo industrial
Depois que as árvores são transportadas elas chegam, enfim, à fábrica. Por lá, são divididas entre as que são aptas para a produção de celulose e as que serão usadas apenas como biomassa — são árvores que, por algum motivo, perderam as características suficientes para produzirem celulose.
As que são selecionadas passam por um processo de serem transformadas em cavaco, em seguida a celulose é separada da lignina — a lignina é usada para produzir energia — e, então, a celulose passa por um processo de cozimento em pressão, depois por processos de branqueamento.
Em seguida, a celulose é seca e cortada em formatos padronizados, que são embalados em fardos de 250 quilos.
“Nós temos uma disponibilidade de 99% nessa fábrica. Ou seja, em 1% do tempo a gente teve problemas de produção no ano passado”, diz Marcelo Martins, gerente-geral Industrial.
A fábrica é autossuficiente na produção de energia, gerando ainda um excedente que é jogado na rede elétrica. A Eldorado ainda tem, anexa à fábrica, uma usina termelétrica também movida a biomassa. Aqui, são usadas principalmente raízes e tocos provenientes da produção.
Com uma capacidade de 50 MW/hora, a usina é acionada para atender às necessidades de consumo da rede elétrica, acionada pelo ONS (o Operador do Sistema Nacional, o órgão que coordena a geração e transmissão de energia no País). “Esse ano, estamos acionados desde abril, direto”, destaca Martins.