Ecos da guerra

O acordo China-EUA vai castigar a soja brasileira? A SLC discorda

"É difícil acreditar que se viabilizará um acordo muito prejudicial ao brasileiro como exportador de soja ou de milho", disse Aurélio Pavinato

Soja

“Em relação ao Trump ou a trade war, eu tenho certeza de uma coisa: que não tenho certeza”. A brincadeira veio de Aurélio Pavinato, CEO da SLC Agrícola, em conversa com jornalistas nesta noite. Feito o aviso, o executivo arriscou alguns palpites sobre as repercussões para a soja brasileira a partir das conversas entre Estados Unidos e China.

Hoje, os prêmios da commodity estão em níveis comparáveis aos do primeiro mandato de Donald Trump, cerca de US$ 2 por bushel. Para Pavinato, não há motivos para acreditar — pelo menos por enquanto — em uma reversão desse cenário no curto prazo, mesmo com todo o bafafá do acordo comercial entre Estados Unidos e China.

Num exercício recente, o consultor Carlos Cogo apontou que, caso confirmado, um acordo entre ambos os países poderia derrubar os prêmios da soja, levando as margens dos produtores para o terreno negativo.

Pavinato tem uma visão diferente. “É muito difícil imaginar que a China e os Estados Unidos vão voltar as tarifas para os padrões originais. Se isso se confirmar, que motivação a China tem para importar soja dos Estados Unidos, pagando imposto, versus importar do Brasil e da Argentina sem pagar?”, questionou.

O argumento é reforçado pelo tamanho que os Estados Unidos ocupam na importação de soja chinesa. Hoje, o país norte-americano responde por 20% das importações, ante mais de 40% há cinco anos.

“A dependência está muito menor. Então, realmente é difícil acreditar que se viabilizará um acordo muito prejudicial ao brasileiro como exportador de soja ou de milho. Eu ainda acredito que vai caminhar para nós termos um mercado favorável, pelo fato de a nossa exportação não ter taxação para os clientes finais”, frisou o CEO.

A demanda chinesa segue em alta. No milho, apesar de o país asiático ter feito uma safra recorde, o aumento do consumo interno leva a crer em um aumento da demanda brasileira — ao menos por enquanto. No ano, a SLC fez uma safra recorde de milho, chegando a 8,2 mil quilos por hectare (o recorde anterior havia sido de 7,5 mil).

Na soja, Pavinato vê um cenário similar, de demanda firme, demonstrando que os clientes continuam vindo buscar soja brasileira.

“A liquidez da soja brasileira está muito consistente. E quando penso em safra nova, também, o mercado está num prêmio adequado, em 50 centavos, 60 centavos por bushel. É um prêmio que motiva o produtor a vender”, detalhou Pavinato.

Para a próxima safra (2025/26), a SLC já fixou 41% da soja a ser produzida a um valor de US$ 11 por bushel (ante US$ 11,46 nesta safra). O câmbio pode ajudar a companhia a compensar os preços menos atrativos: quase um quarto da soja está fixada a R$ 6,08 (ante R$ 5,63 neste ano).

Nesse jogo entre fixação de preços de commodity e de câmbio, o grande destaque para a próxima safra é o algodão. Cerca de 16% da produção para a próxima safra foi fixada a um câmbio de R$ 6,71 (ante R$ 6,09 nesta safra), compondo um preço médio maior em meio à queda dos preços dos contratos da pluma.

Fertilizantes

Também de olho na próxima safra, a SLC escapou da alta dos preços de fertilizantes, em média 20% a 30% maiores do que a média dos últimos dez anos — refletindo uma série de fatos na geopolítica global, como os conflitos no Irã e a potencial retaliação tributária da Rússia por parte dos Estados Unidos.

“Acertamos na mosca os vales de preços”, afirmou Pavinato. A SLC já garantiu, para a safra 2025/26, 100% do potássio necessário e um percentual semelhante do fósforo, sendo acompanhado também pelo Super Simples.

“O que falta comprar, que estamos aguardando o melhor momento, é um produto que vai ser usado só no ano que vem, só na segunda safra, a ureia”, explicou Pavinato. Em relação aos defensivos, a companhia já garantiu 91% do pacote para o próximo ano.

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Olhando para as demonstrações de resultados, a SLC Agrícola entregou um segundo trimestre em linhas com as expectativas dos analistas. O aumento de produtividade de soja e milho (neste último caso, recorde) impulsou praticamente todas as linhas do balanço da companhia.

No segundo trimestre, a SLC entregou uma receita de R$ 1,8 bilhão, 38% acima do mesmo período do ano anterior, além de um Ebitda que mais que dobrou, para R$ 556 milhões. No lucro líquido, no entanto, houve uma variação negativa de mais de 56%, explicada pelo ajuste do ativo biológico.

“No segundo trimestre do ano passado, a gente marcou praticamente 100% do ativo biológico do algodão, e neste ano marcamos apenas 76% com margens menores, por conta da redução de produtividade. O que falta marcar é o algodão segunda safra, com margens bem superiores em função do aumento de produtividade”, explicou Pavinato.

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Na B3, a SLC está avaliada em R$ 7,5 bilhões. No ano, os papéis caem 2,3%.