
CRISTALINA (GO) — Chegar à Fazenda Pamplona num dia ensolarado de colheita de algodão é um privilégio para os olhos. Quase oito mil hectares da propriedade, que pertence à SLC e possui ao todo 27 mil hectares, são destinados à produção da pluma, tornando a fazenda a segunda maior produtora da commodity de Goiás.
A produção de algodão em estado da arte é um belo cartão de visitas para os goianos, um símbolo do protagonismo que o Estado quer atingir. Por enquanto, Goiás ainda tem uma produção tímida no cenário nacional, com apenas 1,5% da área plantada. No Brasil, dois Estados concentram a produção de algodão: Mato Grosso (70%) e Bahia (20%).
A oportunidade de crescimento, no entanto, é grande, especialmente no que diz respeito à safrinha. Hoje, apenas um quarto da produção de algodão em Goiás vem de segunda safra, ressalta Raul Maciel, diretor executivo da Agopa (Associação Goiana dos Produtores de Algodão), ao The AgriBiz.
“Na região de Jataí, por exemplo, nós temos 277 mil hectares plantados de milho, segundo o IBGE. Se o algodão pudesse entrar ali em metade dessa produção, já seriam mais de 120 mil hectares de crescimento, isso sem falar na região norte do estado”, afirma Maciel. Extrapolando o raciocínio para o Estado inteiro, o Goiás planta 1,6 milhão de hectares de milho safrinha, segundo a Conab.
Como parte do esforço para tornar esse plano uma realidade, o Estado conta desde 2017 com o IGA (Instituto Goiano de Agricultura), um instituto de pesquisa responsável por fazer estudos — entre outros tópicos — do cultivo do algodão no norte do estado, justamente de olho no crescimento da produção.
Do lado da demanda, Maciel lembra que Goiás é um grande consumidor de caroço de algodão. Nas contas da associação, o norte do estado consome o equivalente a 65 mil hectares para consumo animal, mais do que o dobro da produção do Estado.
Mas a maior parte dos ganhos vem mesmo da pluma, destinada à exportação. “Uma lavoura boa em Goiás busca produzir em torno de 300 a 330 arrobas de algodão em caroço. Dessa produção, na média, 41% é pluma e 51% é caroço”, afirmou Maciel.
Na Fazenda Pamplona, a produção chega a 43% de fibra, segundo Renan Luiz Rolim, gerente da propriedade rural. “Na última safra, tivemos um veranico de 45 dias de sol que prejudicou um pouco a produtividade, mas não arrebenta a cultura. Aqui tem altitude diferente de outras regiões, o que é ótimo, sem falar dos nossos investimentos em pesquisa e na aplicação localizada de defensivos”, ressaltou.
Um algodão contra o bicudo
Atualmente, a margem do produtor goiano está em cerca de R$ 3 mil por hectare na produção de algodão. O algodão, conhecido por ser uma cultura cara, tem um custo que gira em torno de R$ 14 mil reais por hectare — para referência, o cultivo de soja está em cerca de 6 mil reais por hectare. O ciclo do algodão safra, não custa lembrar, é de 190 dias.
“No algodão, você investe mais, com um retorno equivalente ao da soja, porém, há uma vantagem de melhorar o solo por usar mais adubo, então, é uma cultura que traz ganhos para a próxima a ser implantada ali”, frisa Maciel. Na fazenda da SLC, por exemplo, a rotação de culturas segue uma lógica de plantio de algodão, seguido por soja e depois por plantas de cobertura.
No esforço para melhorar a margem do produtor, a pesquisa segue sendo um atributo fundamental. Um dos projetos, tocado pela Abrapa (Associação Brasileira dos Produtores de Algodão), está relacionado à pesquisa com RNA interferente para um algodão resistente ao bicudo, uma das principais pragas da cultura.
O projeto é realizado em parceria com a Embrapa, além de universidades de Israel e do Texas, há oito anos, tendo como foco retirar uma proteína responsável por atrair o bicho para a planta.
A demora está relacionada à complexidade de produção das plantas geneticamente modificadas. “De cada 100 milhões de plantas, você consegue duas, três, e é necessário continuar plantando para ver se essa geração é resistente. Depois disso ainda vem uma fase de melhorar a planta, introduzindo características positivas”, afirma Márcio Portocarrero, diretor executivo da Abrapa.
A expectativa da associação é levar ainda mais oito anos para chegar numa planta comercial, além de mais um tempo — curto, frisou o diretor executivo, de menos de dois anos — para registrar a variedade na CTNBio e poder exportar essa produção.
“Qualquer variedade nova, para chegar ao campo, mesmo as transgênicas, leva no mínimo 15 anos para chegar nesse ponto, além de muito investimento. Nesse projeto com a Embrapa, a ideia é cobrar royalties de cerca de 300 reais por hectare, que poderemos devolver ou continuar investindo em pesquisa”, ressaltou Portocarrero.
Nacionalmente, a área plantada com algodão foi de 2 milhões de hectares na safra 2024/25, um aumento de 7,20% em relação à safra anterior. A produtividade teve uma queda sutil (de 0,7%, para 1,8 tonelada por hectare), mas, mesmo assim, a produção de pluma aumentou 6,4%, para 3,9 toneladas.
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A repórter viajou a convite da Abrapa