
CUIABÁ – Eraí Maggi Scheffer é o dono da festa. À vontade, brinca com os convidados, cumprimenta as autoridades presentes e pede silêncio, inclusive para o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, que ainda papeava enquanto o timoneiro do Grupo Bom Futuro fazia o discurso na inauguração do maior terminal de aviação executiva do Centro-Oeste.
Diante de uma plateia de amigos e admiradores, não parece ter muito tempo para conversar com a imprensa, mas cede aos argumentos das colegas Vera Ondei, da Forbes, e Alessandra Mello, do Agfeed. Por um minuto, ele até poderia conversar. A entrevista durou mais. Bem-humorado, falou por 20 minutos. “Vocês me enrolaram, né? Disseram que era um minuto”, brincou.
Das alternativas para os produtores contornarem a disparada da Selic à estratégia de expansão de terras da Bom Futuro, Eraí falou de tudo um pouco. Com as operações basicamente concentradas em Mato Grosso, ele não pensa em expandir para outras regiões do País, na contramão do que grupos como a SLC, que apostaram no Matobipa, fizeram.
“Cada vez que eu vou num outro Estado, mais eu quero ficar no Mato Grosso. Aqui, o clima é muito firme e as terras, muito bacanas. Cabe as duas safras. É como se tivesse duas terras”, disse Eraí.
O empresário quer seguir expandindo a área agrícola no Estado que lhe deu as maiores oportunidades, fornecendo matéria-prima para quem quiser industrializar o Estado — dos bicombustíveis, como etanol de milho e biodiesel, à carne de frango. “Qual é a meta agora? O Mato Grosso vai precisar de industrialização”.
Nem mesmo as terras mais caras de Mato Grosso em comparação às fronteiras agrícolas mais recentes convencem o empresário a mudar os rumos. “Está ficando mais caro, mas ainda tem terras [para comprar]. Sempre tem, né?”, respondeu de bate pronto, quando perguntado sobre o tema por The AgriBiz.
Eraí apresenta os argumentos com lugar de fala. Recentemente, a Bom Futuro acertou a compra de duas fazendas mato-grossenses que pertenciam à Proterra — firma americana de private equity surgida da Cargill —, em uma transação avaliada em R$ 1,7 bilhão.
As oportunidades de aquisição de terras surgem em Mato Grosso porque nem todos operam com a mesma excelência e ousadia, argumentou.
“Há um terço que ganha muito dinheiro, e está com dinheiro sobrando. Outro terço está sempre com problema porque investiu errado, não cuidou direito, alargou as pernas demais. E o outro terço tem muito dinheiro, mas é muito conservador”, disse Eraí.
Os reis do algodão
Expandir as operações em Mato Grosso é uma forma de cultivar mais algodão, uma cultura altamente rentável que se tornou viável na região na década de 1990 com o lançamento da cultivar CNPA ITA 90, desenvolvida pela Embrapa a partir de sementes importadas por Olacyr de Moraes.
A Bom Futuro começou a cultivar algodão na safra 1994/95 em uma área de apenas 150 hectares, que foram colhidas com máquinas emprestadas de Olacyr, como conta o livro “O Céu é o Limite”, escrito pela jornalista Martha Baptista. Três décadas depois, o experimento se provou um colosso.
Atualmente, o grupo liderado por Eraí cultiva cerca de 650 mil hectares (incluindo safra e safrinha), sendo mais de 220 mil hectares de algodão, uma cultura que demanda cuidado absoluto com o solo e as pragas, mas que traz uma rentabilidade invejável para quem sabe tocá-la (o que a Bom Futuro faz como poucos).
No Brasil, ninguém cultiva mais algodão que a família Maggi Scheffer — além de Eraí, a Bom Futuro é formada por outros três acionistas: os irmãos Fernando e Elusmar, e o cunhado José Maria Bortoli, mais conhecido como Zeca.
A dolarização do passivo
Ao longo das décadas, o gigantismo deu à Bom Futuro acesso a ferramentas de gestão mais eficientes e baratas, como as linhas de crédito em dólar – em geral, mais competitivas que os empréstimos lastreados no CDI (especialmente em tempos de Selic galopante como o atual).
“Os produtores grandes tomam dívida em dólar há 20 anos, e deu muito certo para nós. A sua dívida não estoura”, disse Eraí, recomendando que o passivo em moeda estrangeira é melhor para um negócio que produz commodities dolarizadas como soja, algodão e milho.
Para ele, a boa notícia é que as linhas de crédito em dólar não estão mais restritas aos produtores de grande porte. “O governo trouxe um modelo muito bacana, via BNDES, dando oportunidade para financiar o produtor em dólar”, disse.
Na visão de Eraí, esse é o caminho para contornar a Selic a 15% ao ano, que tende a encarecer os recursos do próximo Plano Safra. Os agricultores médios precisam perder o “medo” de acessar uma dívida em dólar, defendeu.
*O jornalista viajou a convite do Grupo Bom Futuro