Recuperação judicial

Serasa: “Não há crise generalizada no agro. O que existe são créditos malfeitos”

“Na maioria dos casos que viraram recuperação judicial, foram créditos malfeitos. Esses produtores já tinham problemas e estavam bastante alavancados no momento da concessão do crédito”, diz Marcelo Pimenta

Que os pedidos de recuperação judicial de produtores rurais escalaram nos últimos meses, não há dúvida. Mas a interpretação dos dados de inadimplência pode estar perdendo de vista a origem dos problemas: o erro dos financiadores na concessão do crédito.

A análise é de Marcelo Pimenta, head de agronegócios da Serasa Experian. Em um relatório que acaba de ser divulgado, o birô de crédito trouxe uma fotografia atualizada dos pedidos de RJs no campo.

No ano passado, o número de pedidos de recuperação de produtores aumentou em mais de seis vezes, atingindo 127 pedidos. No quarto trimestre de 2023, os pedidos chegaram a 47, um salto de 62% na comparação com terceiro trimestre, mostram os números recém-divulgados pela Serasa.

Em entrevista ao The AgriBiz, Pimenta faz um chamado à reflexão cuidadosa dos números, em mais um sinal de que a narrativa da crise generalizada cria mais problemas do que soluções.

“A interpretação do gráfico desmistifica o que está ocorrendo. Embora exista aquele sensacionalismo de que há uma indústria de RJs, que estão ocorrendo sem critério, olhando friamente é uma questão de créditos mal concedidos”, disse Pimenta.

O monitoramento da Serasa mostra que os produtores rurais que pediram recuperação judicial já estavam com problemas financeiros e com alto risco de inadimplência no momento da concessão do crédito, o que indica um problema na decisão do financiador.

“Na esmagadora maioria dos casos, esses produtores já tinham problemas. Estavam bastante alavancados há duas, três safras”. Na avaliação do head de agronegócios da Serasa, o financiador pode ter tomado uma decisão equivocada por duas razões. “Ou por falta de instrumentos para avaliar o risco no momento da concessão ou por bastante otimismo”.

Score de crédito da Serasa e comportamento dos pedidos de recuperação judicial de produtor rural

De fato, a exuberância da rentabilidade dos produtores de grãos no boom de commodities que se seguiu à pandemia pode ter criado uma sensação de que os preços nunca mais voltariam à normalidade, um sentimento que prejudicou tanto os agricultores que se alavancaram de forma excessiva quanto quem tentou surfar a onda do lado do crédito sem tomar cuidado com os riscos.

Como evitar as próxima RJs

Pimenta lembrou ainda que, quando considerado o universo total de produtores rurais (5 milhões), os 127 que pediram recuperação judicial são um contingente pequeno. Ainda assim, é preciso tomar cuidado e esclarecer o mercado, evitando que uma crise maior ocorra.

“Se o mercado tem a percepção de que é uma crise generalizada, é aquele movimento [de manada] que pode criar um problema sistêmico”, advertiu o executivo da Serasa. Na bolsa, por exemplo, a aversão ao risco afugentou investidores de varejo, derrubando as cotações dos Fiagros.

Por mais de uma vez, Pimenta reiterou que é preciso entender os números. “O que está acontecendo não é uma crise generalizada. Foram más decisões de crédito que estão se repetindo agora”, disse.

Diante dessa constatação, ele defendeu que os financiadores têm os instrumentos para evitar os casos futuros de default. “Quem consulta um produtor rural na Serasa tem visibilidade 18 meses à frente da probabilidade de inadimplência”.

Para clientes da Faria Lima, a área de agro da Serasa vem oferecendo uma análise do portfólio de crédito de produtores rurais, oferecendo um diagnóstico dos créditos que precisam ser acompanhados com lupa. “As recuperações judiciais de 2026 podem ser evitadas com as decisões tomadas hoje”, resume Pimenta.