Crédito

“Inadimplência no agro ainda deve piorar, mas não nos preocupa”, diz VP da Caixa

Índice chegou a 7% no trimestre encerrado em junho, mas tamanho da carteira e estrutura de garantias trazem conforto para o banco estatal

A Caixa ainda vai manter uma visão cautelosa em relação ao agronegócio nos próximos meses. Depois de ver a inadimplência escalar rapidamente, com os atrasos superiores a 90 dias chegando perto de 7% em junho, o banco deve manter a carteira comportada, sem grandes expansões em relação ao que se viu no segundo trimestre.

“Enquanto a gente compreende o que está acontecendo no setor, queremos manter a carteira em torno de R$ 61 bilhões a R$ 63 bilhões. Depois de entender esse cenário, a gente expande”, afirmou Carlos Vieira, presidente do banco, em coletiva de imprensa.

Henriete Bernabé, vice-presidente de Riscos da Caixa, afirmou que, em curto prazo, ainda existe uma expectativa de piora na inadimplência do agronegócio.

“Temos feito um trabalho muito próximo às empresas e aos produtores rurais. Mas não nos preocupa tanto pelo tamanho da carteira e pelo tipo de crédito que a gente concedeu, mais ligado a investimentos e com garantias. Deve vir um crescimento [da inadimplência], mas está precificado”, afirmou.

Além do endividamento contraído pelos próprios agricultores, Vieira também ressaltou como um percalço do ciclo atual o que chamou de indústria de recuperações judiciais — lembrando que esse é o primeiro ciclo de baixa em que produtores rurais puderam recorrer a esse mecanismo. “Não podemos admitir isso do ponto de vista da nossa posição e somos contra isso porque não ajuda o mercado produtivo”, frisou.

O presidente da Caixa comparou a situação mais delicada do agronegócio ao desenvolvimento do crédito imobiliário no Brasil no mercado de capitais, há pouco mais de dez anos. Também se trata, aqui, de um período de ajuste do setor produtivo depois de um ciclo de expansão.

“Um dos fatores que explica o que estamos vivendo foi a expansão da capacidade econômica a partir da compra de bens e terras. Só que a compatibilidade entre adquirir terra, gerar bem produtivo e pagar endividamento precisa ter apoio financeiro”, ressaltou Vieira.

Garantias

Nesse espírito, a Caixa criou recentemente um grupo de trabalho para chamar devedores, no sentido de fornecer orientação financeira. O que não quer dizer, entretanto, que o banco tenha arrefecido: a Caixa, assim como o Banco do Brasil, também acompanha de perto a execução das garantias.

Na carteira do banco, a principal garantia nos créditos concedidos ao agronegócio é hipoteca, enquadrada de uma forma diferente, pelo Banco Central, do que as garantias do setor imobiliário — que compõe a maior parte da carteira da Caixa.

Nos financiamentos à habitação, o banco tem principalmente alienação fiduciária, considerada um perfil de garantia com risco menor do que a hipoteca (o que requer, portanto, uma provisão maior para os créditos no agronegócio).

Esse é um dos fatores que ajuda a explicar o ânimo do setor para discutir mudanças na resolução 4.966, implantada pelo CMN (Conselho Monetário Nacional) no início deste ano.

A regra estabelece um conjunto de parâmetros para identificar créditos inadimplentes em três estágios (1, 2 e 3), que exigem graus diferentes de provisão a cada transição. Os créditos nível 2 são aqueles atrasados há mais de 30 dias e, os de nível 3, há mais de 90 dias.

“No crédito imobiliário, conseguimos ajustar a transição de estágio 1 para o estágio 2 para 60 dias, em vez de 30. Existem conversas com o Banco Central para ter uma mudança semelhante no agronegócio”, explica Barnabé.

Crescer no microcrédito

Ao mesmo tempo em que o crescimento no agronegócio fora das linhas subsidiadas vem a passos de tartaruga, a Caixa ressaltou a ambição de aumentar a presença na agricultura familiar, via Pronaf.

No trimestre, foram R$ 130 milhões emprestados à agricultura familiar, num montante que deve chegar a R$ 1,5 bilhão até o final do ano. O dinheiro para os empréstimos vem de fundos constitucionais, o que permite ao banco fazer empréstimos de até R$ 35 mil, com taxas de 0,5% ao ano.

Hoje, o Brasil tem quatro milhões de propriedades rurais abaixo de 100 hectares, um segmento que, na visão do banco, não tem a devida assistência para crescer.

“Somos provocados pelo ministro Waldez [Góes, de desenvolvimento regional] para sermos um agente de transformação do crédito a essas famílias. Vamos ter um Brasil totalmente diferente do funding do crédito rural daqui a dois, três anos”, destacou Vieira.