
Dois anos depois da última grande oferta pública de Fiagro, o mercado se prepara para uma retomada. A euforia dos áureos tempos ainda está longe, mas o investidor parece menos arredio, o que abriu uma janela para a distribuição de novos fundos ao varejo.
Líder disparada no mercado de distribuição de fundos ligados ao agronegócio, a XP Investimentos já aprovou a oferta de duas gestoras, apurou The AgriBiz. Cada oferta deve levantar entre R$ 300 milhões e R$ 400 milhões, com a primeira prevista para setembro, disseram duas fontes.
A estrutura dessas ofertas visa a aumentar a proteção ao investidor. Pelas conversas em curso, os dois fundos irão a mercado com duas classes: sênior e subordinada, criando um seguro contra as primeiras perdas para o investidor de varejo.
Tipicamente, a cota subordinada será alocada pela própria gestora, o que a torna ainda “mais alinhada” com o sucesso dos investimentos, disse uma fonte. A tendência é que a subordinação represente entre 20% e 25% dos fundos que estão em estruturação.
“É o tipo de estrutura que agrada quem está mais avesso ao risco. Ninguém cobre a primeira perda no fundo listado”, comparou outra fonte.
Ao ganhar uma camada de proteção, os investidores terão de aceitar um trade-off, abrindo mão da liquidez diária. Os dois fundos em estruturação não serão listados em bolsa e devem ter um prazo de resgate do principal em cinco anos.
Se forem bem-sucedidas, as duas captações darão ainda mais fôlego para a retomada da indústria de Fiagro, que sofreu no ano passado com a aversão dos investidores aos casos de inadimplência e, principalmente, à recuperação judicial da Agrogalaxy — diversos fundos listados estavam expostos à rede de revendas.
A retomada dos Fiagros
De lá para cá, o mau-humor dos investidores vem arrefecendo. As cotas dos fundos listados reagiram, mas o grosso da indústria ainda negocia abaixo do valor patrimonial (ou seja, a recuperação ainda vai precisar de mais tempo para se consolidar).
Em um universo de 37 Fiagros listados, apenas três são negociados hoje acima da cota patrimonial: o SNFZ11 (fundo de terras da Suno), o NEXG11 e o LAFI11 (também de terras). São fundos pequenos, com patrimônio líquido de R$ 61 milhões a R$ 86 milhões. Entre os maiores fundos — com mais de R$ 100 milhões de PL — o menos descontado hoje é o RZEO11, da Riza, apenas 5% inferior à cota patrimonial.
Entre os gestores, a expectativa é que a melhora deve ocorrer gradualmente. “A gente está muito mais perto de ter um follow-on do que estava no começo do ano, mas ainda tem um ou dois passos até chegar lá. Mais do que bater a cota patrimonial, é ter esse período de prêmio, o que anima os coordenadores”, disse Maurício Seabra, sócio da FG/A.
A comunicação também fará diferença no processo. “Fazer esse mercado voltar significa jogar às claras. Explicar o que deu problema. Foi a safra? Foram as garantias? Erros de estruturação? É deixar claro o que a experiência mostrou que deu certo e errado e como isso será mitigado daqui para frente”, argumentou Paulo Fleury, gestor da EB Capital.
Os resultados de cada fundo são outro fator essencial para a retomada. “As gestoras de fundos listados precisam se provar mais uma vez diante dos investidores. Junto com isso, a inversão da curva de juros também vai trazer mais fôlego”, avaliou Carlos Fernandes, gestor de agro da Capitânia. O fundo listado da casa (CPTR11), por exemplo, ainda é negociado com um desconto de 25% sobre a cota patrimonial.
Enquanto os follow-ons ainda são inviáveis, gestores têm procurado recompor reservas — o BTAG11, do BTG Pactual, chegou a R$ 3,88 por cota, por exemplo — além de procurar reduzir o risco das carteiras dos fundos.
“Nós tínhamos uma carteira que vinha em CDI+4,3%, CDI+4,4% e hoje está em CDI+3,9% e estamos caminhando para a banda de baixo, perto do CDI+3,5%”, acrescentou Tadeu Barreto, gestor do portfólio agro da Itaú Asset.
É uma estratégia seguida também pela AZ Quest, que tem apostado em club deals para encontrar os melhores negócios dentro do novo patamar de risco almejado. “Nossa estratégia por enquanto é buscar uma carteira robusta de bons ativos antes de pensar em qualquer captação”, explica Maria Tereza Vendramini, responsável por originação e estruturação agro da gestora.
Alternativas
Nesse ambiente, os gestores precisam entender o papel que pretendem desempenhar na cadeia de financiamento agropecuário.
“O que está acontecendo é um rearranjo da cadeia de financiamento. Em determinado momento foram feitos CRAs corporativos e hoje a gente vê isso migrando cada vez mais para os FIDCs, com o risco saindo do balanço das empresas e passando para os fornecedores e investidores”, notou Felipe Greco, gestor de agro da Kinea.
Na visão da Kinea, a busca por produtos nichados e com uma boa relação de risco-retorno pode trazer fôlego para uma das teses queridinhas da casa, a de fundos em dólar.
No ano passado, em uma janela de captação difícil, o primeiro fundo desse tipo, o KDOL, saiu do papel captando R$ 70 milhões, com uma rentabilidade alvo de variação cambial acrescida de um retorno de 6%. A tese é uma das prioridades para a gestora em um cenário de retomada.
“A gente quer posicionar o KDOL como um produto de proteção patrimonial. Se o dólar for a R$ 8, o fundo ganha, se o dólar voltar para R$ 3, nós entendemos que isso será compensado por um ganho importante na parcela da carteira em reais”, ressalta Greco, frisando a proteção patrimonial.
“Não estamos olhando para esse produto como a fonte de toda a alocação da carteira, mas como uma oportunidade de proteger patrimônio de maneira isenta e simplificada”, completa. (Colaborou Luiz Henrique Mendes)