No aniversário dos três anos da lei que instituiu o Fiagro, a CVM publica a resolução unificando a regulação dos fundos de desenvolvimento do agronegócio, reafirmando assim o compromisso do presidente da CVM, João Pedro Nascimento, com este que é um dos setores mais dinâmicos de nossa economia.
Desde o lançamento do primeiro Fiagro, o GCRA11 — que levantou R$ 50 milhões em agosto de 2021 —, os números cresceram rapidamente, evidenciando o interesse do investidor pelo agro.
Em agosto deste ano, já tínhamos 548 mil investidores e quase R$ 12 bilhões em Fiagros listados, segundo dado da B3.
Os dados da Anbima indicam 114 Fiagros operacionais, com R$ 40 bilhões em patrimônio líquido, considerando os veículos listados e os não listados. Dos R$ 40 bilhões, a maior parte está financiando o empresário rural em CRAs e direitos creditórios.
O crédito rural 3.0
A criação do Fiagro, e agora sua regulamentação definitiva, marcam a evolução do financiamento da agricultura brasileira desde a década de 1960, quando o Brasil ainda estava longe de ser uma potência.
Originalmente, o crédito rural foi instituído pela lei 4.829/65. Conhecido como Plano Safra, ele tem origem exclusivamente nos recursos controlados e continua sendo o principal financiador do agro brasileiro.
Em junho, o estoque do crédito rural era de R$ 661 bilhões, sendo R$ 597 bilhões em empréstimos a pessoas físicas e R$ 64 bilhões a pessoas jurídicas, segundo dados do Banco Central.
Apesar do montante significativo, o crédito rural tradicional não dá conta do tamanho da agricultura, e menos ainda de seu potencial. Estima-se que a demanda de crédito na agricultura supere R$ 1,1 trilhão ao ano, o equivalente a 100% do valor bruto da produção agropecuária.
Isso significa que aproximadamente R$ 440 bilhões são financiados sem utilização do orçamento da União — ou seja, sem subsídios. Para suprir essa lacuna, os bancos e o mercado de capitais buscam recursos nos investidores brasileiros e direcionam ao agronegócio brasileiro.
As vantagens da nova regra
Com a nova regulamentação, a CVM simplifica o entendimento dos Fiagros aos investidores e flexibiliza a aplicação destes recursos pelos gestores. Já está até sendo chamado de Fiagro Multimercado. Com as devidas alterações nos regulamentos, um gestor poderá, por exemplo, investir numa CPR financeira, adquirir uma startup e/ou comprar uma fazenda.
Outra vantagem importante na nova regulamentação é a simplificação. Não será necessário explicar ao investidor as diferenças entre Fiagro FIDC, FII e FIP. A simplificação na comunicação é muito relevante no mercado de capitais. Precisamos atrair a atenção e facilitar a comunicação com os investidores.
Os Fiagros listados em bolsa, por exemplo, não têm risco de liquidez. Isso possibilitará, cada vez mais, na transformação dos Fiagros listados no grande financiador das operações de investimento do nosso agro.
Os próprios CRAs, aliás, tem aumentado o prazo médio de vencimento no decorrer dos anos. Como disse o ex-ministro Mailson da Nóbrega, o “mercado de capitais está se tornando o financiador de longo prazo das empresas brasileiras”.
Nos últimos anos três anos, o prazo médio dos CRAs tem sido de 7 anos. Esse é um prazo impensável no mercado bancário. Na carteira de crédito rural, na quase totalidade dos bancos, menos de 20% da carteira de crédito tem prazo superior a cinco anos, com exceção do Sicoob e Sicredi, que tem 27% e 23%, respectivamente. Alguns bancos privados, no crédito rural, tem menos de 2% da sua carteira com prazo superior a cinco anos.
O desenvolvimento do mercado de capitais no financiamento tem outra grande vantagem. Quanto mais o mercado de capitais se desenvolve, mais ele atrai médias e grandes empresas. E isso libera os balanços dos bancos para atuar junto aos pequenos e médios espalhados pelo país. Os bancos têm maior capilaridade do que o mercado de capitais para atuar com as PMEs.
Sem barter no longo prazo?
No Brasil, o barter ainda tem muita força. Mas só existe barter onde não há mercado de capitais desenvolvido, como Argentina e Ucrânia. Por mais importante que tenha sido em sua história, o barter não se sustentará no longo prazo. E esse espaço será ocupado pelo mercado de capitais, sobretudo com os Fiagros.
Não existe disputa entre mercado bancário, mercado de capitais e Plano Safra. O financiamento do agronegócio brasileiro, será, cada vez mais, sustentado neste tripé. As operações de barter perderão relevância no longo prazo.
Precisamos cada vez mais, com apoio da CVM, do Banco Central, do Congresso Nacional, especialmente da FPA e do governo federal, garantir segurança jurídica e isenção tributária para os instrumentos de financiamento privado (Fiagros, LCA , CRA, CDCA, CPR, etc). Com cada um no seu papel — bancos, mercado de capitais e Plano Safra — , seguiremos sustentando e fortalecendo o papel da agricultura brasileira como a mais competitiva do mundo.
Os desafios
Apesar do momento de comemoração, é verdade que ainda temos desafios. Muitos. Precisamos atrair, cada vez mais, os poupadores (investidores) para o agronegócio.
Atualmente, temos 2,5 milhões de brasileiros investindo no agronegócio, segundo a B3, através de LCA (1,46 milhão), CRA (275 mil), Fiagros (540 mil) e os demais em mais de um deles. Temos que comemorar. Em dezembro/2020, éramos apenas 500 mil, num crescimento de 400%.
Para atrair cada dia mais investidores, cabe aos gestores terem boa originação de ativos e manter a inadimplência em baixo patamar, equivalente aos bancos.
No Brasil, 25% do PIB é agronegócio. Não faz sentido temos menos de 5% do agro no mercado de capitais. Apresentar o agro ao investidor brasileiro é fundamental. Passar segurança é primordial.
A nova regulamentação dos Fiagros pela CVM vem no sentido de facilitar a comunicação, a transparência e aumentar a segurança do investidor brasileiro.
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Arnaldo Jardim é deputado federal, vice-presidente da FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária) e autor da lei que criou o Fiagro, em 2021.
Octaciano Neto foi secretário da Agricultura do Espírito Santo no governo Paulo Hartung e diretor de agronegócios da Suno.