
BELÉM (PA) — O mapa do caminho para o fim dos combustíveis fósseis, que era defendido do Brasil, foi retirado do rascunho do documento final da COP30 nesta sexta-feira. Mas, em paralelo às negociações entre as partes, pelo menos 25 países se comprometeram a quadruplicar o uso de combustíveis renováveis em dez anos, abrindo uma grande oportunidade de mercado para o Brasil.
O Compromisso de Belém — que também está sendo chamado de Belém Pledge ou Belém 4x — foi assinado durante a COP. Ele teve como base o relatório da IEA (sigla em inglês para Agência Internacional de Energia) intitulado “Fornecendo Combustíveis Sustentáveis – Caminhos para 2035”, feito a pedido da presidência da COP.
Nos próximos cinco anos, o objetivo é duplicar o consumo mundial — a oferta de biocombustíveis líquidos já está bem encaminhada.
“Para 2030, o setor de etanol já teria capacidade de entregar o que a Agência Internacional de Energia projeta para a participação dos biocombustíveis líquidos na matriz”, disse Evandro Gussi, presidente da Unica, a associação que representa os produtores de etanol, ao The AgriBiz.
“Sem falar que o setor tem uma longa tradição de responder bem às demandas”, acrescentou Gussi durante sua participação na COP.
Segundo a IEA, a meta de quadruplicar o uso de biocombustíveis em uma década “é ambiciosa, mas alcançável”. A agência lembra que, entre 2010 e 2024, a demanda global por combustíveis líquidos e gasosos sustentáveis dobrou. A IEA pondera, no entanto, que as políticas são chave para um crescimento mais acelerado.
“A implementação completa das políticas e metas existentes e anunciadas, juntamente com a remoção das barreiras de mercado, poderia levar a um aumento de quase 100% no uso de combustíveis sustentáveis em apenas seis anos, atraindo investimentos em capacidade de produção adicional para atender à nova demanda”, diz o relatório.
É aí que entra a necessidade de os países endossarem o compromisso — e de recursos financeiros para cumpri-los. Uma demanda firme estimula o setor privado a investir mais para aumentar a capacidade de produção, o que, no longo prazo, pode reduzir os custos, em geral mais altos do que os combustíveis fósseis atualmente.
No Brasil, que deve responder por boa parte da oferta adicional de biocombustíveis líquidos nos próximos anos, a Lei Combustível do Futuro foi pensada para dar essa previsibilidade. E o financiamento com recursos públicos também tem contribuído para a expansão recente do setor. Entre 2023 e 2025, o montante do Fundo Clima e da Finep destinado a projetos de combustíveis renováveis chegou a R$ 11,7 bilhões.
“Políticas públicas robustas como o RenovaBio, Combustível do Futuro, e financiamentos de longo prazo como o Fundo Clima, do BNDES, têm sido fundamentais para suportar esse forte ciclo de investimentos no setor, gerando desenvolvimento econômico e social sem precedentes nas regiões onde ocorre a agroindustrialização”, afirmou Rafael Abud, CEO da FS, uma das maiores empresas de etanol de milho do País — combustível que terá um papel fundamental nesse aumento de oferta.
Os números
No caso dos biocombustíveis líquidos existentes, a IEA estima que a oferta precisará aumentar em aproximadamente 3 hexajoules de energia equivalente nos próximos cinco anos — o equivalente a aproximadamente 140 bilhões de litros de etanol. Entre 2030 e 2035, mais 2 hexajoules (96 bilhões) precisariam ser adicionados à oferta.
“São litros que o setor pode — não só o Brasil, mas o País tem uma participação importante — entregar desde que você tenha estabilidade e previsibilidade nesse processo”, disse Gussi.
“A oferta não nos preocupa. O que precisa ser colocado, e essa é a opinião da própria IEA, é o estabelecimento da demanda. Precisa de um roadmap bem estabelecido e a construção de demanda firme para que possa, inclusive, motivar os investimentos”, acrescentou o presidente da Unica.
Quem está dentro
Entre os países que ratificaram o compromisso de Belém estão Japão, Canadá, Holanda, Índia e Itália, entre outros. “A diversidade e a ampla distribuição geográfica dos países que já aderiram demonstram a importância dos combustíveis sustentáveis para a transição energética e para a luta global contra as mudanças climáticas”, afirmou o presidente da COP30, embaixador André Corrêa do Lago.
Para Gussi, mais países devem aderir ao Compromisso, mesmo após o final da COP de Belém. “O pledge continuará em vigência e aberto a novas adesões, porque, no fundo, da COP não termina. Ela continuará seu trabalho e o Brasil continuará na presidência até que o novo país venha substituir. Estamos bem confiantes de que isso vai acontecer, especialmente porque outras rotas, que dependem de altos investimentos em infraestrutura ou pesquisa e desenvolvimento, precisam de um tempo de maturidade maior”, disse.