
O Brasil é o segundo maior produtor de carne bovina do planeta, com uma produção de 11,2 milhões de toneladas projetadas para 2025, e deverá exportar 35% de sua produção, um volume de 3,9 milhões de toneladas. Esse feito depende de um rebanho estimado de 196 milhões de cabeças. São números que impressionam, especialmente se criarmos uma análise comparativa entre economias. É o que faremos aqui para estimar se o preço da carne no Brasil é barato ou não.
Maiores produtores de carne do mundo em 2025, os Estados Unidos deverão produzir 12,1 milhões de toneladas e exportar 10% de sua produção, ou 1,2 milhão de toneladas de carne bovina. Isso tudo será possível com um rebanho de 87 milhões de animais, um desfrute impressionante de 36%. O desfrute brasileiro está na casa dos 22%, mas em 2012 girava em torno de 18%, o que significa que temos aumentado a produtividade de carne enquanto reduzimos a área de pasto.
Basta uma breve pesquisa para saber que a pecuária brasileira não é mais a mesma e, a isso, chamamos aumento de eficiência. Estamos no caminho certo.
Prova disso é que, de acordo com dados do LAPIG/UFG, adaptados pelo professor Moacyr Bernardino Dias-Filho, o Brasil reduziu a participação de áreas de pastagens degradadas de 21,3% em 2000 para 14,6% em 2022. Dada a crescente pressão econômica sobre a pecuária de corte, em que os custos sobem mais do que os preços, fica evidente que não há como manter áreas improdutivas sem que a empresa quebre ou ceda essas áreas para outras culturas (ou empresas) mais rentáveis.
Por esse motivo, a tendência já em curso é de aumento produtivo, que continuará sem que seja necessário derrubar uma árvore sequer para ampliar a produção brasileira, apenas utilizando tecnologia e ciência para aumentar a produtividade nas áreas já consolidadas como forma de combate à quebra das margens de lucro ao longo do tempo e cumprindo a agenda sustentável que tanto é cobrada dos pecuaristas brasileiros (e que eles já entregam mais do que qualquer outro agente no mundo).
Posto esse potencial monumental que tem ganhado cada vez mais importância no abastecimento global de carne, o Brasil ocupa a 4ª posição no consumo per capita de carne bovina, mesmo estando na 87ª posição no ranking global de PIB per capita. Isso é impressionante, dada a nossa condição de país em desenvolvimento.
Fontes: USDA/World Bank/Agrifatto
Veja que interessante: o salário mínimo norte-americano compra 3,4 cestas básicas, enquanto o brasileiro compra 2,01. Como é possível que o Brasil esteja apenas uma posição abaixo dos EUA no ranking de consumo de carne bovina quando eles detêm um PIB per capita oito vezes maior? E ainda por cima exportando uma participação de sua produção três vezes maior?
A resposta está no preço relativo da carne brasileira, que é possivelmente a mais barata do mundo, tanto nominalmente quanto relativamente à renda.
Comecemos pela comparação entre os preços da produção pecuária. Quando analisamos o preço do boi gordo em diferentes países, é possível observar que o Brasil possui o preço mais baixo do mundo.
Basta comparar o preço médio global ponderado pelos dez maiores exportadores (que compreendem 90% da exportação global) em relação ao preço médio brasileiro: somos 14% mais baratos, em média. Em 2025, ficamos 21% mais competitivos do que o restante do mundo.
Fontes: USDA, MLA, e Agrifatto
No atacado, a tendência se repete.
Calculei a média ponderada de uma carcaça de boi desossado e de seus produtos subjacentes e transformei em preço de arroba (15kg). O valor observado é de R$ 339,17/@ (considerando a carne desossada, couro, sebo, miúdos e subprodutos no atacado). Enquanto isso, o mesmo cálculo leva a uma carcaça desossada de R$ 2.237,69 nos Estados Unidos (cotações realizadas pela Agrifatto em 13/08/2025).
É prudente colocar em perspectiva não somente preços nominais, mas também o poder de compra do americano e do brasileiro de baixa renda. Vamos trazer tudo para o Real (R$) para agilizar a compreensão analítica: salários e preços.
O salário mínimo brasileiro está em R$ 1.518,00/mês, enquanto o norte-americano, considerando 8 horas diárias e 5 dias úteis por semana, fica em torno de R$ 5.420,00/mês. Adicionei a China à análise para visualizarmos o que acontece com o mais relevante importador brasileiro da atualidade, cujo salário médio, calculado utilizando a média ponderada entre as principais províncias cujos valores consegui apurar, é de R$ 1.557,50/mês.
Variável | Brasil | EUA | China |
Salário (R$) | 1.518,00 | 5.420,10 | 1.557,50 |
Cestas/salário | 2,0 | 3,4 | 1,9 |
Atacado | |||
Arrobas/salário | 4,48 | 2,42 | – |
Varejo | |||
Acém (R$/kg) | 38,99 | 102,88 | 66,67 |
É possível observar que o preço da carne bovina no Brasil é tão competitivo que permite ao brasileiro consumir 54% mais arrobas equivalentes no atacado do que os norte-americanos. Não temos os dados completos para a arroba na China, dada a complexidade de encontrar cotações de miúdos e, especialmente, subprodutos no atacado chinês.
Seja como for, a carne americana no atacado é 6,6 vezes mais cara do que no atacado brasileiro, enquanto o salário mínimo é 3,6 vezes mais alto nos EUA. Outra observação importante é que a comparação acertada entre rendas e preços derruba por terra a afirmação de que “vendemos carne barata para outros países enquanto o brasileiro paga caro”.
Considerando as exportações, o preço médio do dianteiro vendido para a China, por exemplo, orbita os US$ 5.700/tonelada. Isso significa que um quilo exportado de dianteiro custa aos chineses, na fonte e no câmbio de hoje, R$ 25,36. No atacado brasileiro, a média ponderada dos cortes de dianteiro no atacado custa R$ 17,27, considerando todos os cortes que compõem esse quarto do boi. O preço de venda para a China na origem (FOB), portanto, é mais alto do que o do atacado doméstico brasileiro.
No varejo
Agora observemos o que ocorre nos varejos dos respectivos países. Enquanto o acém é vendido no Brasil, em média, por R$ 38,99/kg, na China ele é comercializado por R$ 66,70/kg, considerando que os salários mínimos desses países são bastante similares. Nos EUA, o acém é comercializado por R$ 102,88, em média.
Isso significa que o brasileiro consegue comprar mais carne com um salário mínimo do que os norte-americanos e os chineses. Enquanto no Brasil um salário compra 19,26 quilos de acém, nos EUA compra-se 15,57 quilos e, na China, apenas 12,01 quilos.
Por que isso ocorre? Custos de produção locais, logísticos, tarifários, quebra computada no transporte, etc. Esse é um dos motivos pelos quais os brasileiros consomem quase tanta carne quanto um americano: nossa carne é muito barata e competitiva e, é claro, o brasileiro possui uma forte cultura de consumo do produto (ao contrário da China, onde consumir carne bovina é uma relativa novidade).
Imaginem agora se o brasileiro pudesse evoluir economicamente, o que aconteceria? Teríamos que apressar ainda mais a evolução tecnológica para atender à demanda interna e, com toda a certeza, isso poderia ser feito sem derrubar uma árvore sequer, apenas ampliando (como já está em curso) a recuperação de áreas de pasto degradadas e convertendo-as em áreas mais produtivas – e rentáveis.
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Para a elaboração desta análise, foi utilizada uma taxa de câmbio de R$ 4,45.