
O setor de café passou dois meses otimista com perspectivas de aumento da oferta, apontando para recomposição de estoques e queda nos preços e na volatilidade. No discurso de produtores e cooperativas, o tom positivo era pontuado por duas ressalvas: o horizonte muda se houver geada ou granizo, e é preciso desatar o nó da sobretaxa de 50% dos Estados Unidos sobre os produtos brasileiros.
O primeiro temor pareceu se concretizar na última sexta-feira no sul de Minas Gerais, a mais importante zona cafeeira do País, onde uma intensa chuva de granizo causou danos a lavouras. Vídeos em redes sociais mostram cafezais cobertos por uma camada espessa de gelo, com plantas destruídas e frutos espalhados pelo chão. Mas, para especialistas, os efeitos sobre a oferta total brasileira serão limitados.
A Emater-MG (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais), órgão de apoio a produtores rurais vinculado à secretaria estadual da agricultura, afirmou que está finalizando o levantamento dos danos nas regiões entre o Sul de Minas Gerais, Zona da Mata e Alto Paranaíba.
A Cooxupe, cooperativa que reúne mais de 18 mil cooperados no sul de Minas e Cerrado Mineiro, também disse que está em campo avaliando a dimensão dos estragos.
Mas produtores falam em perdas de até um quarto das plantas, com danos mais concentrados na próxima safra do que na atual, cuja colheita já está quase completa – segundo o balanço mais recente da Cooxupe, no último dia 22, o Sul de Minas tinha 63,3% da colheita finalizada.
“O evento de sexta-feira teve dimensão geográfica surpreendente. Não me recordo de uma área tão extensa atingida por granizo, que normalmente é um fenômeno mais localizado”, comentou Joseph Reiner, produtor de café e membro do conselho da Saudi Coffee Company.
“Neste momento, não dá para mensurar a área atingida. O que dá para saber é que com cerca de 75% da safra colhida, o vento derrubou café no chão dos 25% restantes, e o que estava no terreiro não teria como resistir à umidade e ao vento”, ele completou em seu comentário semanal sobre o mercado.
Somada à aproximação da data de início da vigência da sobretaxa de 50% criada pelo presidente dos EUA, Donald Trump, na sexta-feira (1º/8), sem sinal de diálogo entre os países, a intempérie gerou temores de que a cotação pudesse disparar.
Isso pareceu se concretizar nesta segunda-feira (28), quando a cotação do café em Nova York chegou a subir 2,64%, antes de recuar e fechar em alta de cerca de 1%.
Mas, segundo especialistas, os danos foram limitados, dada a proporção das áreas atingidas frente ao total da lavoura. Para eles, é mais provável que a cotação esteja refletindo a incerteza sobre a tarifa americana.
Impacto limitado
Fernando Maximiliano, Coffee Market Intelligence Manager da consultoria StoneX, fez as contas. Segundo ele, as áreas plantadas em todos os municípios que relataram ocorrência de granizo totalizam 86,77 mil hectares. Segundo um consultor que atua na região, menos de 15% dessas áreas foram atingidas.
Mesmo em uma estimativa catastrófica, que considera uma hipotética perda de 100% nesses cafezais, o total afetado representa pouco mais de 3% da lavoura de café no Brasil, estimada em 2,4 milhões de hectares.
“Para as regiões onde provocou estragos, o dano é severo. O impacto do gelo nas folhas das plantas é forte, derruba e machuca fisicamente o pé de café. Mas em uma escala nacional, não vemos um impacto tão grande em termos de oferta”, explica Maximiliano, da StoneX.
Na visão dele, o preço flutuou por fatores técnicos, “com realizações de lucros”, e sob influência da indefinição sobre a tarifa americana: “O mercado está sofrendo com a incerteza”.
Cesar de Castro Alves, gerente da consultoria Agro do Itaú BBA, também dá contornos mais limitados à influência do granizo. “Ainda não sabemos a extensão do impacto, mas o granizo, em geral, é um fenômeno localizado e que não costuma ter grande influência nos preços, ao contrário da geada.”
Segundo Maximiliano, da StoneX, o clima será um fator mais determinante em algumas semanas, entre o final de agosto e começo de setembro, quando é preciso ter chuvas em nível suficiente para garantir uma florada adequada. “Esse cenário vai ser bem mais crítico.”
Antes disso, nesta semana, ele diz, a região Centro-Sul vai enfrentar mais uma massa de ar polar, com previsão de forte queda nas temperaturas, o que pode ocasionar geadas. “Até aqui, não esperamos geada severa, mas é algo para olhar com atenção”, diz Maximiliano.