
As previsões de que o tarifaço promovido pelos Estados Unidos cairia como uma bomba sobre o café do Brasil parecem ter começado a se confirmar em agosto.
As vendas da commodity caíram 17,5% em volume na comparação com o mesmo mês do ano passado, informou há pouco o Cecafé (Conselho dos Exportadores de Café do Brasil).
E, em uma transformação simbólica, a Alemanha tomou o lugar dos EUA como o principal destino dos cafés brasileiros no mês passado.
Foram 3,1 milhões de sacas vendidas em agosto, contra 3,8 milhões em agosto de 2024. A receita cambial, por outro lado, cresceu 12,7% no mês na mesma base de comparação, chegando a US$ 1,1 bilhão (R$ 5,9 bilhões), no embalo da alta dos preços internacionais.
Segundo Márcio Ferreira, presidente do Cecafé, os americanos compraram 301 mil sacas do Brasil em agosto, uma queda de 46% frente ao mesmo mês de 2024 e de 26% na comparação com o mês anterior. “Assim, ficaram atrás da Alemanha, que importou 414 mil sacas no mês passado”, comentou.
Ferreira comentou ainda que as compras dos EUA foram em negócios feitos antes da entrada em vigor do tarifaço, no dia 6 de agosto — o que sinaliza um cenário ainda mais preocupante para setembro em diante, já que o saldo de compras posteriores à taxa pode ser ainda menor.
De acordo com a Bloomberg, compradores de café brasileiro no país já sinalizavam em meados de agosto evitar novos contratos. E alguns tentavam estender prazos de entrega na esperança de que as tarifas sejam derrubadas, como a indústria local — representada pela NCA (National Coffee Association) — vem pedindo ao governo.
Queda de 20%
Ainda de acordo com o Cecafé, nos oito primeiros meses de 2025, o Brasil embarcou 25,323 milhões de sacas, queda de 20,9% frente ao mesmo período de 2024. Já a receita cambial foi recorde para o intervalo, em US$ 9,6 bilhões (R$ 52,1 bilhões).
No acumulado do ano, os EUA ainda aparecem como o principal importador do café brasileiro, com 4 milhões de sacas, o equivalente a 15,9% do total. Essa parcial é 20,8% menor do que nos oito primeiros meses de 2024.
Em 2024, os americanos compraram 8,1 milhões de sacas de café brasileiro, 16% do total de 50,5 milhões de sacas exportadas pelo Brasil.
Na sequência no recorte do acumulado de 2025 aparecem a Alemanha, com 3 milhões de sacas (queda de 32,9% em relação aos oito primeiros meses de 2024); a Itália, com 1,9 milhão de sacas (-23,6%); o Japão, com 1,6 milhão (+15,6%); e a Bélgica, com 1,5 milhão (-48,3%).
Segundo o Cecafé, o volume de cafés diferenciados do Brasil, que carregam certificados de práticas sustentáveis ou de qualidade superior, caiu 9,3% no acumulado de 2025.
Os EUA ainda aparecem como o principal comprador desses cafés, com 17,5% do total. Na sequência, aparecem a Alemanha, com 656.585 sacas (12,9%), a Bélgica, com 579.954 sacas (11,4%), a Holanda (Países Baixos), com 428.540 sacas (8,4%), e a Itália, com 332.700 sacas (6,5%).
Tarifaço e menor oferta
Para Ferreira, o resultado em agosto é fruto de uma combinação de fatores. O País vinha de um recorde de exportações em 2024, ele diz, e tinha menor disponibilidade de café em função de uma safra que ficou aquém do seu potencial máximo produtivo.
E, claro, houve a sobretaxa de 50% sobre os produtos brasileiros — o café não está na lista dos produtos isentos.
Segundo Ferreira, a guerra comercial ajuda a ampliar a volatilidade nos mercados internacionais, pressionando os preços para cima — entre a entrada em vigor da taxação e o fim de agosto, a cotação subiu 29,7% na Bolsa de Nova York, para US$ 3,8 mil (R$ 20,6 mil).
“Os fundamentos já são favoráveis para a alta há algumas safras, com oferta e demanda muito ajustadas ou déficit de oferta, devido a adversidades climáticas. Mas o tarifaço desordenou o mercado e deu abertura para movimentos especulativos”, afirmou o presidente do Cecafé.
Se o tarifaço persistir, ele diz, “Além de as vendas do Brasil para os EUA seguirem inviáveis, os americanos também enfrentarão preços onerosos para degustar sua bebida favorita, uma vez que não há oferta de outros países para suprir a ausência brasileira, criando-se um cenário inflacionário”.
Em dobradinha com a NCA, o Cecafé tem batido na tecla de que a taxação do café brasileiro pode gerar prejuízos à economia americana. Isso acontece porque a enorme maior parte das compras do país são de café verde, e todo o processamento — que agrega valor — é feito por empresas americanas.
Segundo um estudo da NCA, isso significa que cada US$ 1 que os EUA gastam importando café gera US$ 43 na economia americana. Ainda de acordo com os dados, o café representa 1,2% do PIB do país e gera 2,2 milhões de empregos.
Nos EUA, consumo de cafés especiais bate recorde
Em relatório semestral divulgado hoje sobre o desempenho do café na primavera e no verão americanos, a NCA destacou um aumento no consumo de cafés de alta qualidade, dos quais o Brasil é o principal fornecedor.
Segundo a entidade, a proporção de consumidores diários de cafés especiais chegou a 48%, contra 37% em 2021.
Considerando todos os tipos e níveis de qualidade, dois em cada três (66%) americanos dizem tomar café todos os dias — em média, são três xícaras por dia.
Ao encontro das maiores temperaturas, os cafés gelados e congelados responderam por 31% de todo o consumo em junho, contra 23% em janeiro, quando o país estava no inverno.
Segundo a NCA, o relatório antecede o Dia Nacional do Café nos EUA, no próximo 29 de setembro. Na ocasião, a entidade vai promover um evento em conjunto com a bancada bipartidária do café no Congresso do país.