
O produtor rural ganhou um aliado para enfrentar um de seus piores pesadelos: uma nova ferramenta que promete prever geadas com até dez dias de antecedência.
A novidade foi mencionada durante o 7° Fórum Café e Clima, promovido no mês passado pela Cooxupé (Cooperativa Regional de Cafeicultores em Guaxupé), a maior cooperativa de produtores de café do Brasil.
“A ferramenta consegue prever com até 10 dias de antecedência os riscos de geadas, a intensidade e onde exatamente poderá ocorrer”, explica Marco Antonio dos Santos, agrometeorologista da Rural Clima.
De acordo com Santos, o modelo foi testado nas geadas ocorridas nas três grandes ondas de frio da temporada outono-inverno deste ano, com 90% de assertividade.
A ferramenta está disponível para os clientes da consultoria em uma versão website e em um aplicativo para celular.
Entidades públicas em âmbito federal e estadual mantêm monitoramentos sobre o risco de geada nas regiões Sudeste e Sul do País.
Por exemplo, o INMET (Instituto Nacional de Meteorologia) e o INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), no âmbito federal, além de agências estaduais, como a catarinense Epagri/Ciram (Centro de Informações de Recursos Ambientais e de Hidrometeorologia).
Há também aplicativos de empresas privadas, como a Climatempo. Mas em ambos os casos o alerta costuma vir em um período de apenas 24h a 48h antes do fenômeno.
O segredo para a antecedência estendida da nova ferramenta, na comparação com esses métodos tradicionais, é o emprego de mais dados, diz Santos.
“Nossa previsão leva em consideração não só a massa de ar polar, que ocasiona a queda acentuada das temperaturas, mas também outros parâmetros meteorológicos, como o vento e a umidade relativa do ar e do solo”, afirma.
Às vésperas da primavera, as chances de geada são menores — elas costumam acontecer no pico do inverno, em paralelo com a estação seca.
Mas Santos não descarta a possibilidade de novas entradas de ar polar em setembro e outubro: “Os modelos não veem risco de geada agora, mas nada impede”.
Em caso de geada, o que fazer?
Na prática, de que adianta saber que haverá uma geada em até dez dias? Se chegar um alerta, o que o produtor pode fazer para proteger a lavoura?
Sistemas de irrigação e fumaça podem ser utilizados para atenuar perdas, explica André Dominghetti Ferreira, pesquisador da Embrapa Café.
“Nenhuma medida é 100% efetiva, mas algumas podem amenizar os danos. Em uma geada mais branda, ‘de capote’, como se diz, que queima somente as folhas do terço superior, é possível evitar de queimar. Em geadas mais fortes, é possível atenuar.”
Uma das alternativas é a fumaça produzida a partir da queima de uma mistura de pó de serragem de madeira, salitre, óleo e água. Uma vez acesa, a mistura gera uma fumaça densa que atua como um cobertor térmico, protegendo as plantações, sem prejuízo à fisiologia das plantas.
“Se tiver o alarme de geada, você põe fogo nessa serragem, e ela fica fumegando. Como o ar fica mais denso, essa fumaça se abriga na parte mais baixa dos vales e diminui a intensidade da geada sobre as plantas”, explica Ferreira.
Existem também empresas que alugam termonebulizadores que reproduzem o mesmo efeito.
Uma alternativa citada pelo pesquisador da Embrapa Café é usar a irrigação para evitar que o gelo se prenda à superfície das plantas. Essa opção está disponível para quem usa irrigação por aspersão, na qual aspersores instalados no solo projetam jatos de água que se fragmentam em gotículas sobre as plantas e o solo.
“O produtor pode ligar os aspersores na hora prevista — digamos, às 3h ou 4h da madrugada — e seguir até umas 7h ou 8h da manhã. A água, seja de reservatórios ou de lençol, é mais quente do que a da geada. Jogar sobre a planta evita que o gelo se prenda.”
A difícil tarefa de esperar
E uma vez ocorrido o fenômeno climático, tem algo que o produtor possa fazer para amenizar as perdas?
A resposta é positiva, diz Ferreira. Mas a primeira tarefa é a mais difícil: esperar. “Depois que ocorre a geada, a primeira coisa a fazer é esperar uns 20 a 30 dias, para a planta sinalizar o que deve ser feito.”
Essa é uma tarefa árdua para os produtores, e um desafio para os consultores, explica o especialista da Embrapa Café.
“O desgaste do produtor quando vem uma geada é intenso. Ele fica triste e desestabilizado, ansioso por tomar alguma atitude, porque é algo que mexe na fonte de renda, no recurso para pagar financiamentos e salários. É uma situação delicada.”
Quando a planta começa a emitir novos ramos e folhas, é a hora de decidir qual tipo de poda fazer para estimular o crescimento e atenuar danos, explica Ferreira.
No caso do café, pode ser a chamada recepa, mais drástica, que consiste em cortar o tronco a 30 cm ou 40 cm do solo. Outras opções são o esqueletamento, no qual são cortados ramos laterais, ou o decote, que consiste em um corte no topo — aplicável às “geadas de capote”, mais brandas, que queimam apenas o terço superior das plantas.
“É possível também que a conclusão seja não fazer nada, nos casos em que os efeitos da geada foram leves, e seguir com a programação normal”, ele completa.