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Em dez anos, Brasil precisa ampliar a produção de café em 35%. É possível?

Cadeia cafeeira prevê aumento da demanda mundial e da participação do País na produção global para 40%. Logística, clima e financiamento são desafios

Café

CAMPINAS (SP) – A cadeia do café no Brasil se prepara para tentar responder a um enorme desafio: com o aumento da demanda global, o País precisará ampliar seu volume por safra em 23 milhões de sacas até 2035.

Com desafios amplos em diversas frentes, como logística, clima e financiamento, é possível chegar lá? Em um evento promovido pela Cecafé (Conselho dos Exportadores de Café do Brasil) em Campinas (SP), na semana passada, o setor cafeeiro arriscou suas respostas.

Germán Bahamón, CEO da Federação Nacional de Cafeteiros da Colômbia, deu os primeiros números à conta de quanto café pode faltar no mundo. Segundo ele, o consumo global cresceu de 104 milhões de sacas em 2000 para 177 milhões de sacas em 2024 — uma alta de 70%, “sem paralelo em nenhuma outra cultura agrícola”.

Até 2030, a estimativa do colombiano é que o consumo chegue a 200 milhões de sacas, no embalo da entrada no mercado de 2,5 bilhões de novos consumidores — pessoas que ainda não bebem café, ou que estão no início da formação do hábito.

Essa onda já está em andamento, puxada por um crescimento do consumo na Ásia, com força na China. Para atendê-la, a Colômbia mira ampliar sua produção das atuais 12,5 milhões de sacas para 20 milhões de sacas.

“Os novos consumidores e as gerações mais novas estão dispostos a pagar mais, porque veem o café como um ritual saudável. Mas quem vai produzir o excedente?”, perguntou.

Para Charles Chiapolino, chefe de pesquisa sobre café da Louis Dreyfus Company, “claramente é o Brasil quem vai liderar essa corrida”.

Segundo ele, se o País atendia há dez anos 30% da demanda mundial e hoje atende 38%, até 2035 vai precisar dar conta de mais de 40%. E isso exige ampliar a produção em 23 milhões de sacas.

Isso significaria um aumento de 35% frente às 65,5 milhões de sacas esperadas na safra 2025/26, segundo a consultoria Safras & Mercado. Em comparação, na última década o Brasil aumentou em 9 milhões de sacas sua média por safra.

E o ramp up precisará acontecer em meio a uma mudança no perfil do consumo, diz Chiapolino. “Há 20 anos, Europa, EUA Japão e Brasil eram 75% dos consumidores; hoje, são 58%, e em dez anos serão 53%. Metade da demanda será de consumidores não tradicionais, e o Brasil precisará se adaptar às exigências desse novo público.”

Mais um ano de aperto

Segundo Oscar Schaps, presidente da divisão de América Latina da StoneX, os produtores brasileiros já estão a caminho desse objetivo, reagindo aos preços altos dos últimos dois anos com um movimento de expansão da lavoura.

De acordo com dados da consultoria, o café robusta registrou um saldo de mudas 6% maior neste ano, equivalente a um potencial adicional de 2 milhões de sacas de café.

“E o café arábica também está crescendo, com 1.000 viveiros no País em 2025. É o Brasil quem faz e fará preço para o mundo.”

Por outro lado, a safra 2025/26 sinaliza ser desafiadora, com um respiro chegando apenas em 2026/27. Produtividade, clima, financiamento e principalmente logística são desafios a serem endereçados.

No primeiro aspecto, vai se consolidando uma fotografia de uma safra ainda apertada, afirmou Luiz Fernando dos Reis, superintendente comercial da Cooxupé. “O rendimento do arábica na colheita não está sendo bom”, afirmou. Segundo a Cooxupe, até aqui já foi colhido 31,4% do café em São Paulo e Minas Gerais.

Ainda assim, Chiapolino, da Louis Dreyfus, listou razões pelas quais acredita que o Brasil será bem-sucedido em sua missão de ampliar a produção de café.

“Primeiro, capital humano; fazendeiros, traders e exportadores estão nesse negócio há séculos. Segundo, financiamento: tem bancos que conhecem o mercado, o governo dá suporte, e os fazendeiros ficaram capitalizados nos últimos anos. Além disso, é um dos poucos países onde ainda há terra disponível, e é líder em tecnologia rural.”

Segundo o executivo da Louis Dreyfus, a responsabilidade de manter o fornecimento sem sobressaltos vai aumentar. “A solução passa por irrigação e novas variedades que ampliam a produtividade, além de técnicas de manejo.”

Gargalo em Santos

Em outro painel, sobre os desafios logísticos no abastecimento, Claudio Oliveira, CEO da BTP (Brasil Terminal Portuário), detalhou o gargalo: segundo ele, o porto de Santos, principal saída da produção cafeeira do País, está próximo do colapso. “O porto tem operado frequentemente entre 90% e 100% de capacidade, o que significa um estouro.”

E a principal expansão programada — o Tecon Santos 10, projeto de R$ 5,6 bilhões para construir um megaterminal de contêineres que eleva a capacidade do porto em 50%, em fase de consulta pública e licitação — não dará conta do aumento da produção.

“Como não temos investimentos e a carga vai aumentar, com certeza a situação vai piorar. O Tecon 10 já vai nascer cheio”, afirmou Elber Justo, diretor-presidente da MSC (Mediterranean Shipping do Brasil).