Mato Grosso

As aventuras de um gestor de venture capital na BR-163

Por cinco dias, Flavio Zaclis e o time da Barn Invest desceram a BR-163, percorrendo cidades que nenhum deles tinham visitado antes. Eles compartilham a experiência com os leitores.

Aqui a região é bruta, repetem os produtores. Pudera! Pela escala das fazendas, não poderia ser diferente. É preciso muito maquinário, trabalho e rápida capacidade de reação para prosperar na agricultura da BR-163, um dos polos mais dinâmicos e impressionantes do agronegócio brasileiro.

Por cinco dias, eu e o time da Barn Investimentos descemos a rodovia BR-163, percorrendo cidades que nenhum de nós tínhamos visitado antes. Pousamos de madrugada em Sinop e, já no início da manhã, começamos a aventura rumo à Cuiabá.

Num dos pontos altos do roteiro, acompanhei a colheita de milho safrinha de dentro da colheitadeira. O operador Iago, um técnico dedicado que veio do Sul — falta muita mão-de-obra especializada por aqui! —, respondia a todas minhas as perguntas com entusiasmo. Ele se orgulhava do que estava fazendo. Dá gosto de ver.

Os dias foram intensos (ah, o calor também!) e pudemos visitar muita coisa, de produtores a empreendedores de Mato Grosso que crescerem fora do hype do venture capital.

Os negócios aqui são gigantes e pouco conhecidos no eixo Leblon-Faria Lima.  No etanol de milho, há empresas rentáveis que alcançaram cifras bilionárias de faturamento em poucos anos, um feito que players mais tradicionais levaram décadas para conseguir.

É curioso visitar cidades como Sorriso e Lucas do Rio Verde e pensar de modo retrospectivo no desenvolvimento regional. Várias das cidades que conhecemos e percorremos nesses cinco dias simplesmente não existiam antes da década de 1980. A maioria delas sequer tem 40 anos de existência!

Durante o dia, as cidades são bastante movimentadas, com trânsito constante de carros e caminhões que estão levando insumos e produtos do e para o agronegócio. Avenidas largas e organizadas dão o tom na área urbana dos municípios, mas não se enganem. Há um mundo de coisa para fazer — e muita ineficiência para resolver.

Ainda falta muita mão-de-obra qualidade nas cidades. Os serviços de hotelaria, restaurantes ainda são muito ineficientes, em grande parte pela falta de qualificação profissional, o que é ao mesmo tempo uma oportunidade para educação e um passivo grande a se resolver.

Na BR-163, a infraestrutura de logística e transporte ainda é precária. A BR-163 é uma estrada de uma mão só e sem acostamento em vários trechos. Nossa viagem aconteceu ainda no começo da colheita de milho, quando o volume de transporte ainda era pequeno. Mesmo assim, já foi caótica.

Em todos os trechos por que passamos na BR-163, ficamos totalmente parados pelo menos uma vez. Em alguns momentos, por quase uma hora. Basta um pequeno acidente e tudo para. Enquanto esperava a rodovia voltar a fluir, fiquei pensando em quantas toneladas de soja, milho e algodão passam por ali.

Ali, não há ferrovia nem alternativa. Quanto dinheiro e tempo se perde no processo logístico! Fiquei curioso para ver como fica a rodovia no meio da colheita de soja. Meus Deus! Deve ser o caos total.

Enquanto da porteira para dentro há máquinas de altíssima tecnologia — que chegam a custar R$ 3 milhões, R$ 4 milhões — operando, a conectividade na estrada é precária. Na maioria dos trechos, não há qualquer sinal. Nem de dados nem de voz! É incrível pensar que a rodovia escoe um volume tão estrondoso de produção sem comunicação no trajeto.

Gosto de pensar que os desafios representam um menu de oportunidades. Tenho apreço por quem está disposto a construir algo, tomando risco e iniciativa, mesmo sem a garantia de sucesso. Por isso me dedico há tantos anos aos investimentos em capital de risco. Empreender é para os corajosos e destemidos e isso é o que mais vimos pela BR-163. Ali, há um país sendo construído dentro de outro país.

A tese da Barn de investir no agro e em tecnologias verdes parece casar-se perfeitamente com o drive dessas cidades. Dá um orgulho danado de ver o espírito do empreendedor brasileiro que desbravou essa região.

Mas que ninguém se engane. Para levar tecnologia que faça sentido para o produtor daqui — não atender o agronegócio de Mato Grosso não é uma opção —, é preciso conhecer a fundo e conversar. Sem isso, o risco que muitas agtechs correm é oferecer produtos e serviços que jamais serão usados de forma recorrente por produtores, agroindústrias e revendas.

Nosso roteiro pela BR-163 trouxe muito aprendizado. Voltamos a São Paulo animados com tudo o que vimos e as oportunidades que existem para investir. Há muito a fazer.

*Flavio Zaclis é fundador da Barn Investimentos