
A relação entre o real e o dólar sempre foi protagonista nas discussões de mercado. Em 2025, com o cenário global incerto e todos os olhos e ouvidos voltados para os EUA, a volatilidade cambial voltou a ocupar manchetes e reuniões de diretoria.
O ano, até aqui, tem sido marcado por um movimento consistente de valorização do real — mas dentro desse movimento predominante, vimos idas e vindas de 20 ou 30 centavos em questão de dias.
Essa gangorra cria a sensação de instabilidade, mesmo quando o sentido principal tem sido de apreciação. Mas a pergunta continua: quanto uma empresa agroindustrial deve realmente se preocupar com a volatilidade de curto prazo?
- Visão Estratégica de Longo Prazo
Mais do que observar o valor diário do dólar, o papel de CEOs e CFOs é entender como o câmbio interage com outros mercados relevantes, como commodities, juros e energia, e o impacto dessa correlação nas margens. É essa leitura integrada que indica se a empresa está diante de uma mudança estrutural ou apenas de um ajuste passageiro, permitindo calibrar ações sem reagir ao ruído de curto prazo.
- Resultado de Variação Cambial no Balanço
Movimentos cambiais afetam simultaneamente ativos, passivos e fluxos operacionais. Um dólar mais baixo pode reduzir receitas de exportação, mas também aliviar dívidas em moeda estrangeira; um dólar mais alto pode ter o efeito inverso. Por isso, mais do que “proteger” cada linha individual, é preciso acompanhar o efeito líquido sobre o balanço e garantir que haja liquidez suficiente para atravessar períodos de estresse sem recorrer a decisões apressadas ou crédito caro.
- Decisão Baseada em Fundamentos
Gestão cambial não é aposta — é disciplina. Isso significa tomar decisões coerentes com a estratégia corporativa e com a política de gestão de riscos da empresa, evitando movimentos isolados que busquem capturar ganhos momentâneos, mas que possam comprometer o caixa ou a competitividade no médio prazo.
- Eficiência Operacional como Diferenciação de uma Empresa
Fatores macroeconômicos como câmbio e juros afetam todos. A vantagem competitiva está na capacidade de operar com eficiência superior, preservando margens mesmo quando o ambiente é desfavorável. Essa eficiência, combinada a decisões de risco bem calibradas, cria resiliência para enfrentar ciclos e explorar oportunidades quando surgem.
- Governança e Gestão de Riscos como Pilar de Resiliência
Mais do que ter uma política cambial “no papel”, o que conta é a integração dessa política ao dia a dia da gestão. Isso envolve clareza sobre objetivos, limites de exposição, critérios de hedge e processos de revisão. Quando bem estruturada e adaptada ao perfil da empresa, essa governança reduz custos, melhora previsibilidade e fortalece a credibilidade junto a clientes, parceiros e financiadores.
Direto da Mesa de Risco
Estamos com o dólar testando níveis de suporte importantes, ao mesmo tempo em que nos aproximamos dos movimentos sazonais de saída de dólares. O recorde observado no ano passado ainda está fresco na memória, lembrando que fluxos podem mudar de direção com força e velocidade. É verdade que movimentos tectônicos de geopolítica e economia global estão em curso, alterando o apetite ao risco e os preços de ativos. Porém, não podemos ignorar nossos desafios internos — em especial o quadro fiscal delicado e a aproximação do próximo ciclo eleitoral.
Os próximos meses prometem ser interessantes, e tudo indica que a volatilidade de curto prazo deve permanecer como parte do cenário, exigindo atenção, disciplina e coerência estratégica na gestão cambial.
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Rafael Harada, colunista de The AgriBiz, é sócio da Rural e cofundador da Virtus Advisors. Possui mais de 20 anos na gestão de riscos de commodities e câmbio na JBS, onde foi diretor global de gestão de riscos.