Algas são usadas como insumos na agropecuária | Crédito: Schutterstock

O uso de algas marinhas na agricultura e na pecuária encontra um de seus ecos mais fortes na sustentabilidade.

Todas as frentes de aplicação carregam relevantes benefícios ambientais. Nas lavouras, as algas ajudam a reduzir o uso de fertilizantes e defensivos químicos, cuja produção consome combustíveis fósseis e despende grandes quantidades de energia.

A flora marinha — como as algas são classificadas, embora não sejam plantas, mas organismos fotossintéticos que vivem na água — também ajuda a regenerar solos degradados, processo com alto potencial de sequestrar carbono da atmosfera.

Na pecuária, as algas podem ser usadas como nutrição, diminuindo a quantidade de ração, ou aplicadas para reduzir a emissão de metano em bovinos — um problema grave de dimensão global.

Para Adibe Luiz Abdalla, que coordena pesquisas com algas no Cena-USP (Centro de Energia Nuclear na Agricultura da Universidade de São Paulo), as algas têm um traço inigualável de sustentabilidade.

“São ingredientes naturais e renováveis, não competem por terra ou água, reduzem a pegada de carbono, aumentam a produtividade e respondem à demanda verde dos consumidores. O potencial é de revolucionar o sistema inteiro”, afirma.

Compromisso ambiental na coleta

A extração de macroalgas também está diretamente ligada ao E do ESG.

A PrimaSea, por exemplo, uma das empresas brasileiras que está criando produtos com a lithothamnium, buscou por 12 anos a licença para explorar uma área de 5 mil hectares na Bahia de Todos os Santos, em Salvador (BA) — esta alga é coletada depois de morta.

“A responsabilidade ambiental é imensa. Usamos uma embarcação que desce uma bomba ao fundo do mar, recolhe e sobe para peneirar. O material descartado é devolvido no oceano”, explica Lucas Avila, CEO da startup.

A empresa também precisou se comprometer com um programa vinculado ao Ibama que inclui ações sociais e um projeto de monitoramento de baleias.

“Nos países do Atlântico Norte, há regras rígidas para extração, processamento e transporte que garantem o manejo sustentável, sem comprometer os ecossistemas”, pontua Vinícius Marangoni, gerente técnico de portfólio de Nutrição da Nitro.

A questão da sustentabilidade na coleta não se aplica às microalgas, já que a maior parte delas pode ser produzida em laboratório, lembra Everton Campos, diretor de marketing da Krilltech, da Casa Bugre.

Menos uso de químicos

Um dos principais benefícios ambientais proporcionados pelas algas na agricultura é ampliar a produtividade em lavouras, permitindo produzir mais com menos insumos.

Essa redução faz ainda mais sentido quando se considera a fatia dos fertilizantes e defensivos que são derivados de petróleo, como os baseados em ureia, diz Marciel Stadnik, professor da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina).

Para ele, as algas podem ser aliadas na dura batalha para amenizar os efeitos das mudanças climáticas.

“Elas diminuem o uso de fertilizantes químicos, cuja produção demanda um enorme gasto energético de fontes não-renováveis e emite óxido nitroso, 265 vezes mais prejudicial que o CO2. E reduzem o uso de defensivos que contaminam solo e água.”

Mais sequestro de CO2

Outra aplicação das algas com benefícios ambientais é no sequestro de CO2 da atmosfera. Essa captura começa no próprio cultivo, explica Luiz, da Embrapa Pesca e Aquicultura, e se estende aos processos de regeneração de terras degradadas.

O empurrão da flora marinha vem a calhar dado o caráter hercúleo da tarefa: o saldo de pastagens degradadas no Brasil é estimado em 110 milhões de hectares, nas contas da consultoria Agroicone.

Isso é o equivalente a cerca de 3,5 vezes o tamanho da Alemanha — e outras fontes falam em até 170 milhões de hectares.

A kappaphycus alvarezii pode ser uma aliada, explica Luiz: “Estudos indicam que seu uso promove melhorias na qualidade do solo, aumento da matéria orgânica, maior atividade microbiana e redução da lixiviação de nutrientes”.

Essa alga cumpre um papel de filtro biológico, ela acrescenta, absorvendo nutrientes como fósforo e nitrogênio e melhorando a qualidade da água.

Menos metano na pecuária

Outra frente em que meio ambiente e algas se conectam é na redução da emissão de gás metano por ruminantes.

Esse é um problema de dimensão global. Cerca de 10% dos gases de efeito estufa são provenientes da fermentação entérica, o “arroto” do boi. No Brasil, o número chega a 17%.

A redução proporcionada pelas algas já passa de 30%. As mais usadas com essa finalidade são a lithothamnium e a asparagopsis taxiformis.

Esta aplicação vem atraindo investidores: o Breakthrough Energy Ventures, fundo de Bill Gates voltado a acelerar tecnologias que reduzem a poluição, aplicou US$ 12 milhões na australiana Rumin8, que extrai bromofórmio da asparagopsis para a ração de ruminantes.

COP 30 será vitrine

Para os especialistas, um uso mais disseminado das algas pode ser um vetor para qualificar e diferenciar a agricultura brasileira, credenciando a produção do País para mercados mais restritivos do ponto de vista ambiental, como União Europeia e Japão.

“Elas são um vetor estratégico da bioeconomia, em alinhamento com os princípios da FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura) para transição para sistemas alimentares resilientes”, diz Luiz, da Embrapa.

Para Wilson Nigri, CEO da Tecnotropic e fundador do fórum AgroSea, a COP 30 em Belém (PA), em novembro, será uma vitrine para expor alguns desses resultados.

“A revolução verde passa pelo mar azul. Os investidores vão se interessar se virem retorno sobre o capital investido — ainda que esse retorno seja um legado social.”