
A decisão da Boa Safra de dar um freio de arrumação, enxugando custos para tentar recompor as margens num momento adverso para as sementeiras brasileiras, tem implicações relevantes para a tese dos investidores que apostavam nas ações (SOJA3) da companhia dos irmãos Colpo na B3.
Em um relatório assinado pelos analistas Thiago Duarte e Guilherme Guttilla, o BTG Pactual classificou a decisão da Boa Safra de buscar a rentabilidade em detrimento do crescimento como um “movimento racional”, considerando que um aumento de capacidade de beneficiamento de sementes traria retornos pouco atrativos neste momento.
Ainda assim, a abordagem da Boa Safra para lidar com a crise é menos usual para um líder de mercado, observaram os analistas do BTG.
Geralmente, as companhias que lideram seus mercados — caso da Boa Safra, que detém um market share estimado em 10% nas sementes de soja — costumam aproveitar as crises para crescer, em uma estratégia “anticíclica” que aproveita o balanço mais forte.
Desde o IPO, em 2021, a capacidade de beneficiamento de soja da Boa Safra aumentou 85%, com as vendas crescendo a uma média anual de 33% e o Ebitda, em 34%.
O consenso de mercado apostava que a companhia continuaria crescendo, ampliando a capacidade em mais de 50% nos próximos anos, alcançando 360 mil big bags. Com o freio de arrumação, isso deixou o horizonte.
Em entrevista ao The AgriBiz, o CEO da Boa Safra, Marino Colpo, admitiu na última quarta-feira que o ritmo de crescimento será diferente. “Mas vamos continuar crescendo”, ponderou.
O fundador da Boa Safra também aproveitou a entrevista para fazer um “mea culpa”, reconhecendo que o rápido crescimento dos últimos anos veio com ineficiência e um nível de despesas mais alto do ideal.
Para corrigir isso e retomar a eficiência de outrora, a sementeira está revendo todo o SG&A (despesas gerais e administrativas) e já anunciou um corte de 5% dos número de funcionários.
Na leitura do BTG, a perda de eficiência é comum em negócios que crescem muito rápido. “A Boa Safra não está imune a isso”, escreveram os analistas. No relatório, eles destrincharam as perdas de eficiência no beneficiamentos de sementes, com insights retirados de uma conversa com os principais executivos da Boa Safra.
Com o crescimento dos últimos anos, as perdas de sementes por qualidade insuficiente (o que obriga a companhia a vender o produto como grão) passaram de 10% para cerca de 15%, ao passo que as perdas por erros na seleção do portfólio de variedades de sementes saltaram de 5% para 7%.
Nesse ambiente, é bem possível que os investidores revejam a forma como encaravam o investimento na Boa Safra. “Acreditamos que a companhia não vai mais ser percebida como um negócio de alto crescimento como foi por muitos anos até agora”, escreveram Duarte e Guttilla.
Diante disso, o banco rebaixou a recomendação para as ações da empresa, de compra para neutra. Com isso, o preço-alvo também foi cortado em mais de 40%, de R$ 21 para R$ 12. Atualmente, o papel está em R$ 8,92.
Ao deixar de ser um negócio de alto crescimento, as ações da Boa Safra já parecem bem precificadas, negociando a 11 vezes o lucro projetado para o ano que vem — o que já embute um crescimento de 55% do lucro por ação, nas contas do BTG Pactual.
****
Listada na B3, a Boa Safra está avaliada em R$ 1,2 bilhão. No acumulado do ano, o papel cai 11,7%.