
A CNA (Confederação Nacional do Agronegócio) traçou um cenário de aperto para o setor em 2026 durante coletiva de imprensa nesta terça-feira.
Depois de um crescimento robusto de quase 10% esperado para 2025 — muito acima da expansão em torno de 2% estimada para o PIB nacional —, a agropecuária deve avançar apenas 1% no próximo ano, segundo Bruno Lucchi, diretor técnico da CNA.
Além da base de comparação elevada, a menor taxa de crescimento em 2026 é explicada pelo clima menos favorável e pelas dificuldades fiscais.
“Em 2026, a situação climática não vai ser tão boa, e o cenário internacional seguirá instável, desorganizando o comércio de insumos e as exportações. A dívida pública traz risco de onerar mais o setor privado. E, em ano eleitoral, as inseguranças jurídicas podem crescer, como invasões de propriedades e demarcações de terras indígenas”, disse Lucchi.
Outro fator que deve pesar nos resultados do produtor é o custo de produção, que deve ser “muito maior em função da alta nos insumos e do custo de financiamento”.
A situação poderá pesar mais em arrendamentos, em situações em que os contratos foram fechados em contexto de preços altos. “Muitos desses contratos estão sendo revistos, porque o produtor está sem capital para honrar os compromissos.”
Ajustes nas RJs
A CNA também apresentou dados sobre o endividamento dos produtores, que cresceu de 3,54% em outubro passado para 11,4% agora.
De acordo com o diretor da CNA, as razões para a explosão das dívidas foram problemas climáticos, quedas nos preços das commodities, aumento dos custos de produção, insuficiência de seguro rural e um comportamento mais restritivo dos bancos.
A explosão das recuperações judiciais torna o crédito mais escasso e amplia a exigência por garantias, sufocando ainda mais os produtores.
“A RJ é um instrumento recente para o agro. Até então, o produtor pessoa física não podia usar. E, como em toda ferramenta nova, o setor ainda está aprendendo.”
Segundo ele, o Judiciário precisa intervir para orientar uma melhor aplicação da lei.
“Estamos vendo uma prática não correta, uma indústria de recuperações judiciais fomentada por advogados que apresentam essa opção como uma solução benéfica para o produtor, e não é. Deveria ser o último recurso. A lei não é ruim, mas algumas instâncias não têm seguido o script à risca”, disse.
O diretor afirmou que o CNA vem dialogando com o Judiciário, especificamente com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para sugerir ajustes na lei ou na jurisprudência. Um exemplo é o prazo de conclusão das RJs, que hoje frequentemente passa de cinco anos, quando não deveria durar mais que dois, segundo ele.
“O administrador da RJ é outra questão, precisa ser escolhido por competência, não por indicação. E recebe 5% da dívida, o que é muito e tem gerado suspeitas de manipulação de assembleias de credores”, observou.
Seguro rural cobre só 5% da área
A CNA destacou que a cobertura com seguro rural caiu de 30% da área agrícola em 2024 para 5% em 2025. “Foi o pior ano em área segurada desde o início da série”, disse Lucchi.
Segundo o diretor, a demanda do setor é de R$ 4 bilhões por ano, mas em 2025 foi designado apenas R$ 1 bilhão — e metade desse valor acabou contingenciada, ou seja, não foi de fato liberada.
“A conta é simples: em vez de investir R$ 4 bilhões em seguro, o governo preferiu gastar R$ 12 bilhões na Medida Provisória nº 1.316/2025, que dá crédito extraordinário para produtores rurais e cooperativas impactados por perdas em eventos climáticos.”
Um avanço nesse tema, afirmou, foi a aprovação, pela CCJ do Senado, de um projeto de lei da senadora Tereza Cristina para modernizar o seguro rural. A principal novidade é a criação de um Fundo de Catástrofe — na aposta da CNA, isso pode melhorar as taxas e os prazos, além de gerar oferta para produtos e regiões hoje desamparados.
“O projeto cria um colchão de amortecimento para as seguradoras. Mas é essencial que o governo entenda que o seguro é uma política de Estado”, afirmou Lucchi.
O impacto do tarifaço
Caso as tarifas dos Estados Unidos sobre as exportações brasileiras se mantenham inalteradas, o impacto negativo do tarifaço deve ser de R$ 2,7 bilhões ao setor em 2025, segundo estimativa apresentada pela CNA.
Em comparação com as exportações aos EUA em 2024, a redução dos embarques deve ser de aproximadamente 4%, segundo Sueme Mori, diretora de Relações Internacionais da CNA.
“Observamos um comportamento diferente antes da tarifa adicional de 40% sobre o Brasil em comparação com depois. De janeiro a julho, as exportações agropecuárias aos EUA cresceram 20% em valor. E, de agosto a novembro, caíram 38%. Uma coisa compensou parcialmente a outra, gerando uma redução no ano de 4%.”
Hoje, 45% das exportações do Brasil aos EUA, em valores, ainda não estão isentas das tarifas.
Mori destacou ainda o risco que reside nos acordos comerciais que vêm sendo fechados entre os EUA e outros países, que, em alguns casos, podem resultar em prejuízos às exportações brasileiras.
Por exemplo, com o Japão, que se comprometeu a comprar US$ 8 bilhões por ano em produtos agropecuários dos americanos, o Reino Unido, que prometeu adquirir US$ 700 milhões em etanol dos EUA, e a China, que firmou uma compra de US$ 2,9 bilhões anuais em itens agrícolas.
“Como o Brasil exporta para esses países, sempre que eles fazem acordos com os EUA podem passar a deixar de comprar da gente. Por isso temos acompanhado de perto cada negociação dos americanos”, afirmou.