
CAMPINAS E PAULÍNIA (SP) — “A história da soja nunca mais será a mesma”. A frase em tom panfletário poderia soar arrogante a um desavisado, mas o autor guarda a credibilidade de quem já revolucionou a produtividade agrícola brasileira mais de uma vez.
Em uma agenda frenética desde segunda-feira, a Bayer recebeu mais de 600 convidados no Royal Palm Plaza, um refinado hotel de Campinas feito para atender grandes convenções.
De donos de sementeiras a obtentores de germoplasma, os visitantes foram apresentados à Intacta 5+, a quarta geração de biotecnologia de soja desenvolvida pela companhia.
A tecnologia já conta com a aprovação da CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança), órgão brasileiro responsável pela avaliação de transgênicos, mas ainda vai passar por testes massivos no campo enquanto busca a aprovação dos principais importadores — a China, claro, é o principal.
Se tudo correr como o esperado, a Bayer fará o lançamento comercial da Intacta 5+ com os primeiros clientes brasileiros na safra 2027/28, acelerando a adoção da nova tecnologia a partir da safra seguinte.
Os principais executivos da Bayer evitam detalhar as projeções produtividade média da Intacta 5+ enquanto os testes massivos ainda não foram feitos (o que está previsto para a safra 2026/27).
Mas, a julgar pelo entusiasmo dos envolvidos, não será surpresa se a biotecnologia render mais de 100 sacas por hectare de forma recorrente — especialmente quando combinada às melhores genéticas.
Os diferenciais da Intacta 5+
“A Intacta 5+ vai crescer aceleradamente a partir de 2028”, disse Márcio Santos, CEO da Bayer no Brasil e presidente a divisão agrícola da companhia, a uma plateia que acabara de conhecer os diferenciais da biotecnologia.
As novidades começam pelo desenvolvimento mais tropicalizado. Pela primeira vez, a inserção dos genes de interesse foi feita com uma cultivar de soja já no Brasil. Isso só foi possível graças ao centro de P&D da Bayer em Petrolina (PE), uma área que conta com um time de 300 pessoas.
Nas gerações anteriores, esse processo ocorria em Porto Rico, o que tomava mais tempo até que a tecnologia ficasse apta a chegar às cultivares preparadas para os diferentes climas no Brasil.
Além do ineditismo de pesquisa em solo brasileiro, a Intacta 5+ inova ao ampliar a resistência às lagartas.
A quarta geração da biotecnologia da Bayer protege a soja contra nove espécies de lagartas, o que foi possível graças à inserção de dois novos genes aos três que já existiam na terceira geração, a Intacta2 Xtend.
A nova biotecnologia é também a primeira a incluir a tolerância a cinco herbicidas diferentes, o que vai facilitar o combate a ervas daninhas que estão ficando cada vez mais resistentes a defensivos mais populares como o glifosato e glufosinato.
Com a Intacta 5+, a Bayer combinou a tolerância a glifosato e dicamba, que já faziam parte da Intacta2 Xtend, a outros três herbicidas: 2,4-D, glufosinato de amônio e mesotriona.
Nesse movimento, a multinacional alemã se fortalece na disputa com a rival Corteva, cuja biotecnologia de soja (Conkest Enlist) é tolerante a três herbicidas: 2,4-D, glifosato e glufosinato de amônio.
De todas as mudanças na tolerância a herbicidas desenvolvidas pela Bayer, a maior novidade é a inclusão da mesotriona. A Intacta 5+ vai permitir o uso desse defensivo, que antes só era possível em culturas como milho e cana — a soja não resistia a ele.
Segundo Fábio Passos, diretor comercial de soja da Bayer, a inclusão da mesotriona tem potencial para revolucionar o combate a ervas daninhas como o caruru, que vem se alastrando rapidamente pelo Brasil.
Estima-se que o caruru já tenha infestado mais de 20 milhões de hectares no País, com prejuízos relevantes às lavouras. A cada três plantas de caruru por metro quadrado, perde-se 14,6 sacas de soja por hectare, o equivalente a R$ 1,9 mil. Em mil hectares, a perda potencial é de quase R$ 2 milhões.
Nos testes feitos pela Bayer com a Intacta 5+, a aplicação de mesotriona em combinação com um ou mais defensivos (dicamba, glufosinato) apresentou alta eficácia no combate ao caruru. Ervas daninhas como o capim-amargoso também foram combatidas com bons resultados.
Os impactos no mercado
No mercado, a avaliação é que a Intacta 5+ terá mais sucesso que a Intacta2 Xtend.
“Diferente da terceira geração, que teve impacto limitado no Brasil, é esperado que a quarta apresente um avanço mais robusto”, disse Eric Emiliano, sócio da consultoria LEK, em um relatório sore as biotecnologias de sementes.
Para confirmar esse diagnóstico, ainda teremos de passar por mais duas ou três safras. Até lá, a Bayer manterá o foco na expansão da Intacta2 Xtend.
Durante o lançamento, Márcio Santos, CEO da Bayer, disse que a Intacta2 Xtend detém de 35% a 40% do mercado na atual safra de soja. A expectativa dele é que essa participação cresça para 55% e 60% na temporada 2026/27. “Teremos 75% do mercado quando lançarmos a Intacta 5+”, previu.
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Nos Estados Unidos, a quarta geração de biotecnologia de soja da Bayer será lançada em 2027 com o nome Vyconic. Por lá, a tecnologia inclui apenas as cinco genes que proporcionam tolerância aos herbicidas.
Como as lagartas são um problema da agricultura tropical, as tecnologias que conferem resistência a elas não são um diferencial no mercado americano e, portanto, ficam de fora da biotecnologia.
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A expertise da Bayer em biotecnologia de soja é um legado da Monsanto, adquirida em 2018. A companhia americana revolucionou o mercado de soja com o lançamento da Roundup Ready (RR), a primeira soja transgênica.
Lançada na década de 1990 nos Estados Unidos, a soja tolerante ao herbicida glifosato chegou oficialmente ao mercado brasileiro em 2005. Depois disso, vieram as gerações que agregavam resistência a lagartas: Intacta e Intacta2 Xtend.
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Usualmente, os investimentos no desenvolvimento de uma nova geração de transgênico passam de US$ 200 milhões. A Bayer não detalhou os investimentos feitos na Intacta 5+, dizendo que investiu “centenas de milhões de euros”.
O jornalista viajou a convite da Bayer.