
O governo brasileiro já admite fazer concessões aos exportadores de etanol dos Estados Unidos nas negociações sobre o tarifaço. Mas, pelo menos por enquanto, não se trata de redução de tarifa ou cotas de importação — e sim do RenovaBio, a política nacional de estímulo aos biocombustíveis.
O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio (MDIC), Geraldo Alckmin, disse nesta terça-feira que já está na mesa de negociações uma proposta envolvendo a retomada das importações de etanol dos EUA que inclui a abertura do RenovaBio aos exportadores americanos.
“Olhando para frente, temos diálogos em questões tarifárias e não-tarifárias. Nestas, um exemplo é o CBio para importação de biocombustíveis, que está praticamente resolvido”, afirmou o vice-presidente, referindo-se aos créditos de descarbonização gerados na produção sustentável de biocombustíveis, como o etanol, o biodiesel e o biometano.
O presidente em exercício, que participou de evento realizado na Amcham Brasil (Câmara Americana de Comércio para o Brasil) por vídeo, não citou a possibilidade de redução na tarifa de 18% vigente sobre o etanol americano ou criação de cotas para importação.
Outros assuntos “não tarifários” na pauta incluem, segundo ele, as terras raras e a participação de empresas americanas no incentivo para construção de datacenters no País previsto no programa Redata, apresentado pelo governo em setembro e hoje aguardando votação no Congresso.
Tatiana Prazeres, secretária de Comércio Exterior do MDIC, estava presente no evento e detalhou a fala de Alckmin. Segundo ela, o Brasil deve abrir a possibilidade de os exportadores de etanol americanos usufruírem dos créditos gerados pelo RenovaBio.
“Era um pleito antigo dos EUA que as empresas americanas pudessem se beneficiar do RenovaBio. Estamos propondo ajustes nas regras do programa de maneira a facilitar que empresas americanas tenham acesso”, afirmou.
Segundo ela, a medida é estratégica e se insere nos esforços que resultaram na isenção para 238 produtos anunciada pelo governo americano na semana passada.
“Ainda há espaço para tirar outros produtos de alto valor agregado sobre os quais ainda incidem tarifas que, na nossa visão, não se justificam”, complementou Prazeres.
Um passo para trás, dois à frente
De acordo com Alckmin, as concessões se justificam. Do total das vendas brasileiras aos EUA, 36% estavam sujeitas à tarifa de 50% (fruto da soma dos 10% aplicados a todo o mundo em abril, mais os 40% impostos sobre o Brasil em agosto). Essa fatia caiu para 22% após a decisão mais recente de Trump.
“O próximo passo é excluirmos mais produtos e reduzirmos mais a alíquota geral. Temos alguns desafios grandes, como máquinas, motores e produtos industrializados em geral, além de madeira, alimentos e mel. O trabalho prossegue”, afirmou.
Alckmin reforçou que, na visão do governo brasileiro, não há justificativa para a taxação das exportações do País. O Brasil é um dos três países do G20, ao lado de Reino Unido e Austrália, que têm superávits com os EUA.
“Dos dez produtos que os EUA mais vendem para nós, em oito deles a tarifa é zero. E, nos outros, a tarifa média é baixíssima, de 2,7%. Além disso, neste ano, enquanto a nossa exportação para eles caiu, a venda deles para nós cresceu mais de 11%. Por isso, nosso trabalho será redobrado para isentar mais produtos e reduzir as alíquotas.”
“Ganha-ganha”
Anfitrião do evento, Abrão Neto, presidente da Amcham Brasil, afirmou que os biocombustíveis são um entre muitos assuntos nos quais há um interesse mútuo de Brasil e Estados Unidos. Por isso, essas negociações não deveriam ser encaradas como uma situação de ofensiva ou defensiva de um dos lados.
“Existe a possibilidade de se encontrar um compromisso que beneficie os dois países. A agenda bilateral é muito rica, e, na nossa avaliação, o importante é achar esses espaços de cooperação e usá-los a favor da nossa economia”, afirmou.
Na visão dele, uma união “equilibrada” entre as agroindústrias de etanol no Brasil e nos EUA poderia fomentar um desenvolvimento de mercados em todo o mundo para o etanol enquanto combustível veicular.
“Os dois são os maiores produtores de biocombustíveis do mundo. Há interesse convergente de ambos de desenvolver esse mercado no mundo. Vejo espaço para Brasil e EUA cooperarem para terem uma relação de ganho mútuo”, disse.