COP30

BELÉM (PA) — “Saímos da várzea e passamos a jogar na Champions League.”

A frase, dita por um produtor durante um dos muitos eventos laterais da COP30, foi repetida por algumas das principais lideranças do agro nos dias finais da conferência do clima. Ela ilustra a principal conquista do setor na COP: a agricultura foi inserida no debate climático. E um chamado: há muito trabalho a ser feito para atrair investidores.

“O cara que joga na Champions League é cobrado, e vamos ter que nos acostumar com isso. Vamos ter que mudar a mentalidade”, afirmou Márcio Santos, CEO da Bayer no Brasil. “Isso significa que não podemos baixar a guarda. Temos que nos sofisticar no nosso posicionamento”, disse Guilherme Bastos, coordenador do centro de estudos do agronegócio da Fundação Getúlio Vargas (FGVAgro).

Com a presença na COP, que chegou a ser questionada por parte do setor, e principalmente por meio da Agrizone, o País pôde mostrar a tecnologia e o diferencial da agricultura brasileira. O desafio, agora, é manter a agricultura tropical na pauta como solução para os problemas climáticos.

“Temos que mostrar com dados, com ciência, execução, implementação de ações. Essa é a briga correta que temos de comprar. Vamos mostrar que sim, reconhecemos os problemas que temos, mas também como estamos superando esses desafios”, disse Marcelo Morandi, assessor de Relações Internacionais da Embrapa.

 “Antes de qualquer coisa, a primeira bandeira que temos de levantar é a do diálogo, de conseguir estar nas mesas desconfortáveis como foram colocadas”, diz a produtora Ana Carolina Zimmermann, que esteve na COP30. “Se a gente não está à mesa, está no menu sempre escolhido. Então que a gente esteja sentado às mesas certas para escolher as decisões que queremos”, disse a produtora da JLS Agro, de Goiás.

E o documento final da COP30? Algo ali impacta a agricultura? A resposta simples é não. As COPs têm uma agenda pré-definida, e a de Belém não tinha a agricultura na agenda oficial, segundo Rodrigo Lima, socio-diretor da Agroicone. O grupo Sharm el-Sheikh, que trata de agricultura e segurança alimentar no âmbito das COPs, deve ter reuniões importantes no próximo ano, inclusive para definição da extensão do programa, que foi criado na COP27.

“A discussão sobre agricultura era procedimental, um processo que vai gerar uma decisão no ano que vem. E acho que a gente conseguiu mostrar para o mundo que tem que olhar as diferentes agriculturas e enxergar soluções que vão gerar negócios e vão ganhar dinheiro”, disse Lima, que complementa: “Porque agenda de financiamento não é doação. A COP tem que ter a regra de doação, mas isso não é o core. O core da agenda é business, é negócio.”

Financiamentos

Em busca dessa agenda de negócios, a veterana TRC, uma das maiores produtoras mundiais de Teca, foi à COP30 apresentar aos gringos o projeto de integração entre pecuária e a floresta — uma combinação que agora também conta com o apoio da Embrapa.

“Nós queremos implantar dois mil hectares por ano a partir do ano que vem. O ponto é que isso exige um desembolso de R$ 20 mil a R$ 25 mil por hectare por 20 anos, com 60% desse valor sendo desembolsado nos três primeiros anos. Buscamos muito essa aproximação com fundos e bancos”, explica Fausto Takizawa, diretor de Relações Institucionais da TRC.

Eduardo Bastos, outro veterano em COPs que hoje atua como CEO do Instituto Equilíbrio e chairman do CCarbon, também comemorou a vitrine que a agricultura brasileira teve durante a COP e destacou os próximos desafios.

“Essa não era uma COP de agricultura. Era uma COP de ação e financiamento. E o desafio é esse, financiamento do que? O setor de proteção de florestas, restauro se organizou melhor, contou uma história melhor em espaços mais importantes e conseguiu levantar o TFFF (fundo internacional para conservação de florestas tropicais), o que é super legal, é muito importante também. Criamos algo semelhante que foi o RAIZ, conseguimos lançar e isso foi um golaço. Mas a repercussão financeira não foi igual”, disse.

“Isso significa que a agricultura é mais ou menos importante? Não. Significa que não fomos capazes de contar uma narrativa semelhante. Olha que oportunidade teremos para a próxima COP, para montar essa narrativa e levantar os mesmos bilhões no ano que vem na Turquia”, complementou Eduardo Bastos referindo-se à sede da COP31. “É um puxão de orelha, mas ao mesmo tempo uma oportunidade incrível que nós temos”.

Para atrair investidores, que na área de sustentabilidade assinam cheques superiores a US$ 500 milhões, o setor precisará se organizar para elaborar projetos ambiciosos — além de (ainda) resolver questões básicas. Avançar nas questões fundiárias, como a implementação do CAR (Cadastro Ambiental Rural) é uma delas, lembra Guilherme Bastos, da FGV. Ele também destacou a necessidade de ter dados oficiais sobre as práticas sustentáveis para oferecer mais segurança aos investidores.

“É aí que entre essa questão da sofisticação. O Brasil não é um país de grandes estatísticas. Temos muito dados, mas falta uma higienização desses dados. Esse é outro ponto também que a gente precisar ver, porque os investidores não estão doando dinheiro. Precisamos mostrar, temos que quantificar isso. Não tem um registro do Estado brasileiro sobre as práticas de sustentabilidade que o setor está usando. Porque o recurso que entra precisa, inclusive, ter certeza daquilo que ele foi indicado para investir”, disse o coordenador do FGV Agro.

O sucesso da COP31 depende de ações que começam na segunda-feira pós-COP30. “Temos que usar todo esse holofote — e a presença do Brasil na presidência da COP por mais um ano — para conseguir destravar, pelo menos trazer parte desse dinheiro para as soluções da agricultura para o clima”, resumiu Morandi, da Embrapa.