Avião da Latam
Até 2030, cerca de 20 bilhões de litros de SAF serão necessários para cumprir mandatos de mistura da Europa e EUA no combustível de aviação

O Ministério de Minas e Energia (MME) lançou para consulta pública uma minuta de decreto que propõe a criação do Programa Nacional de Combustível Sustentável de Aviação (SAF), intitulado ProBioQAV.

A regulamentação estava prevista na Lei do Combustível do Futuro (14.993/2024), e foi anunciada nesta sexta-feira (14) pelo MME.

Em paralelo, Renato Cabral Dias Dutra, secretário nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, participou de um painel na programação da Conferência do Clima no pavilhão da CNI, na Blue Zone, para marcar o lançamento.

De acordo com Dutra, a escolha pelo dia de hoje se deve ao aniversário de 50 anos do Proálcool. Segundo ele, a ideia do ministério é promover uma nova mobilização à altura daquela que resultou na criação do Programa Nacional do Álcool, tido como uma das maiores realizações da agroindústria na história do País.

“O nosso desafio é casar a demanda que já existe com a oferta que está por vir. A política pública deve ser um instrumento indutor; as estabilidades regulatória e jurídica, aliadas a um fomento tributário, vão criar as condições para viabilizar esse mercado.”

Segundo ele, o governo tem convicção de que a escala vai reduzir o custo — hoje, o custo de produção do SAF é estimada entre duas e cinco vezes mais que o querosene (fóssil) de aviação.

Mas, para evitar “atropelos”, afirmou, o CNPE deve “tomar o cuidado” de determinar uma meta inicial de redução de emissões na aviação doméstica abaixo do patamar de 1% previsto na Lei do Combustível do Futuro — a fatia escolhida provavelmente será de 0,25%, afirmou.

Jerome Cadier, CEO da Latam; Renato Dutra (MME); Marcelo Bernardes (Anac); José Gordon (BNDES); e Rafael Dubeux (Fazenda) durante painel sobre Programa do SAF na COP30

“Dessa maneira, a gente fica mais confortável para ir ajustando e subindo conforme a oferta de insumos se estabeleça”, completou.

Dutra ressaltou ainda que a minuta do decreto foi elaborada “a muitas mãos”, com colaborações de diversos órgãos do governo, como a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), o Ministério da Fazenda e o BNDES, além de companhias aéreas e fabricantes de aeronaves.

E destacou que o incomum procedimento de o Executivo submeter uma minuta de decreto para consulta pública visa aproximar os diferentes players do mercado — mais uma tentativa, disse, de mimetizar o Proálcool.

O custo do SAF

Dutra comentou a novidade durante o painel “Construindo o Mercado Regional de SAF: Integração da América do Sul como Case Global”, realizado na Blue Zone, o palco principal da COP30.

No evento, Marcelo Bernardes, superintendente de Governança e Meio Ambiente da Anac, destacou que a agência acredita ser possível promover o desenvolvimento da cadeia de SAF sem incorrer em aumento de custos. A ideia, disse, é não conflitar com o pressuposto da agência de promover a inclusão da população na aviação comercial.

“É preocupação do governo e da agência qual preço que isso terá para o consumidor. Não dá para ser uma troca entre questão energética e a universalização do setor.”

Segundo ele, em um primeiro momento, até 2029, a produção de SAF deve ficar restrita à iniciativa da Petrobras.

A estatal recebeu em outubro a primeira certificação do País para uma biorefinaria de SAF, emitida pela ISCC CORSIA — estrutura de certificação para SAF reconhecida pela Organização da Aviação Civil Internacional (OACI) para verificar a conformidade com os requisitos de redução de emissões de carbono na aviação.

Segundo Bernardes, agência e governo trabalham com um cronograma que inclui a inauguração de duas biorefinarias privadas para SAF em três anos.

Uma delas, da Acelen, em São Francisco do Conde (BA), deve iniciar operações em 2028 e 80% do volume já vendido. E outra, da Refinaria Riograndense, em Rio Grande (RS), uma parceria entre Petrobras, Braskem e Ultra para converter uma refinaria de petróleo em biorrefinaria para SAF, que pode entrar em atividade em 2029.

José Luis Gordon, diretor de Desenvolvimento Produtivo, Inovação e Comércio Exterior do BNDES, salientou que o governo vê os biocombustíveis como prioridade estratégica. “Por isso que o BNDES já colocou mais de R$ 10 bilhões, apenas entre 2023 e outubro de 2025, no setor.”

Segundo ele, o Brasil deve investir em todas as rotas possíveis de produção de SAF — as mais famosas são a HEFA, a partir de óleos vegetais, como o de soja, e a ATJ, baseada no etanol, notoriamente mais cara do que a primeira.

Existe ainda uma terceira rota baseada em hidrogênio verde, a FT, que hoje é considerada inviável dado o alto custo de produção.

“Não podemos deixar de lado o papel estratégico do etanol e nossa vocação para ele. Hoje, o SAF a partir de etanol é custoso, mas foi assim também com o Proálcool; precisamos construir a primeira usina, depois a segunda, e, a partir daí, escalonar.”

Comentando a possibilidade de isenções tributárias para a produção de SAF, Rafael Ramalho Dubeux, secretário-executivo adjunto do Ministério da Fazenda, lembrou que a Constituição Federal tem um dispositivo (artigo 225) que determina a aplicação de um “diferencial de competitividade” para biocombustíveis versus equivalentes fósseis.

Segundo ele, a reforma tributária vai abrir espaço para isenções fiscais que tornem o SAF brasileiro competitivo, sem aumentar os preços das passagens.

A consulta pública sobre o decreto que institui o Programa Nacional de Combustível Sustentável de Aviação (ProBioQAV) ficará aberta por 45 dias. Interessados em fazer contribuições ao decreto do Programa do SAF devem acessar o portal de Consultas Públicas do MME ou o portal Participa + Brasil, procurando pela publicação sobre SAF em 14 de novembro de 2025.