
RONDONÓPOLIS (MT) – A aposta da Rumo para aumentar os volumes transportados (e a rentabilidade) de sua operação em Mato Grosso está muito perto de se materializar.
A Ferrovia Estadual de Mato Grosso, um projeto de 700 quilômetros de extensão para ligar o terminal da Rumo em Rondonópolis, no sul do estado, a Lucas do Rio Verde, na metade norte, está com a primeira fase das obras 70% concluídas.
Da BR-163, rodovia que corta o principal cinturão de produção de grãos do País, é possível avistar pontes ferroviárias prontas, nas quais, em breve, vagões levarão a soja e o milho de Mato Grosso para o porto de Santos (SP).
Com a ferrovia, a empresa de logística do conglomerado de Rubens Ometto pretende ganhar competitividade no principal estado produtor, onde a colheita de grãos deve crescer em 40 milhões de toneladas (35%) nos próximos dez anos. Só a Rumo planeja aumentar o transporte no estado em 3 milhões de toneladas por ano.
O primeiro trecho — com 162 quilômetros ligando Rondonópolis a um novo terminal de grãos entre os municípios de Primavera do Leste, Campo Verde e Dom Aquino — deve começar a operar no segundo semestre de 2026.
Com essa extensão e o novo terminal, que terá capacidade para 10 milhões de toneladas (com possibilidade de expansão para 20 milhões), a Rumo pretende aumentar a sua participação na região central do Mato Grosso.
Segundo Altamir Perottoni Junior, vice-presidente comercial da Rumo, a ideia é que o terminal da BR070, como vem sendo chamado, receba grãos principalmente de uma região que compreende os municípios de Campo Verde, Primavera do Leste, Água Boa e até um pouco do Vale do Araguaia. Nesses pontos, a Rumo deve ganhar competitividade em relação a alternativas de transporte, como a saída pelo Arco Norte.
A importância de oferecer uma tarifa competitiva está cada vez mais evidente. Na divulgação de resultados do segundo trimestre, a Rumo frustrou as expectativas do mercado ao reportar uma tarifa abaixo do esperado e uma perda de market share no Mato Grosso.
O motivo foi a mudança no comportamento de vendas do agricultor. A companhia esperava uma pressão logística durante a colheita devido à safra recorde, o que não se confirmou devido ao ritmo lento das vendas dos produtores.
Assim, a demanda das tradings por contratos take or pay caiu, e a Rumo começou a temporada 2025 com 65% da capacidade vendida antecipadamente. Nos três anos anteriores, esse percentual foi de 100%, segundo Perottoni.
A nova dinâmica de mercado levou a Rumo a promover um reposicionamento das tarifas durante este ano com base no comportamento dos produtores, das tradings e da concorrência, o que tem resultado numa recuperação de market share. Em agosto, os volumes movimentados pela Rumo bateram recorde.
“Não estamos sozinhos nesse mercado. O negócio da ferrovia é ser competitivo”, resume Perottoni.
As obras da FMT
No início deste mês, a reportagem de The AgriBiz visitou as obras do primeiro trecho — e teve ideia da complexidade do maior projeto greenfield no setor em 40 anos.
Mais de 5 mil pessoas estão trabalhando nas obras, das quais 3 mil estão alojadas em canteiros próximos às cidades que permeiam os 162 quilômetros do trecho (cerca de 90% dos trabalhadores são de fora do Mato Grosso).
Para diminuir riscos de execução, as obras foram divididas em pacotes, com diferentes empreiteiras executando trechos diferentes.
Montanhas de brita para lastro ferroviário e de trilhos fazem parte da paisagem, além de uma indústria no meio do nada. Uma fábrica de dormentes (estruturas de concreto em que os trilhos são fixados) precisou ser construída pela própria Rumo, que esbarrou na dificuldade de ter poucos fornecedores durante as obras — no caso dos dormentes, só existe um fabricante no Brasil. Para toda a ferrovia, mais de 1,3 milhão de dormentes serão necessários.
Foram dificuldades desse tipo que levaram a Rumo a aumentar em 40% o investimento previsto para a primeira fase do projeto, hoje estimado em R$ 5 bilhões.
O ajuste, bastante relevante, acabou gerando uma insegurança entre os investidores em relação ao orçamento das próximas fases, que levar a ferrovia até Nova Mutum e Lucas do Rio Verde — o projeto também prevê a construção de um ramal para Cuiabá.
“A fase 1 nos dá uma segurança para a fase 2. Não que a gente não tenha errado na estimativa do capex da fase 1, mas ter feito a obra nos dá segurança de que, agora, sabemos fazer. Estamos mais seguros hoje para fazermos um novo trecho”, comentou Perottoni. “Como não tínhamos um projeto greenfield no Brasil há muitos anos, inclusive as empreiteiras tiveram dificuldade para precificar.”
O projeto está sendo construído em partes não só pela complexidade: o objetivo é que a receita gerada no primeiro trecho ajude a financiar o restante das obras, que ainda precisam ser aprovadas pelo conselho de administração.
A operação
A expectativa é que o terminal da BR070 ganhe tração rapidamente, já que boa parte da demanda existe, sendo hoje atendida pelo terminal de Rondonópolis, que deverá ficar menos pressionado. Hoje, o principal terminal da Rumo — o maior da América Latina — recebe mais de 1.600 caminhões por dia durante a safra, movimentando cerca de 22 milhões de toneladas por ano.
“Não teremos um ramp-up comercial para encher o volume do novo terminal, porque nós já temos esse volume”, disse o VP da Rumo. Com a operação do terminal da BR 070, a tendência é que haja uma reorganização do mapa das cargas recebidas pela Rumo.
Quanto ao timing das próximas fases da obra da ferrovia, o tom é de cautela. “Vamos tomar as melhores decisões para a companhia. Se a gente tiver uma perspectiva de redução da taxa de juros no ano que vem, por exemplo, ajuda. Mas vamos seguindo de acordo com a demanda”, finalizou Perottoni.
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Em meio às frustrações de analistas e de investidores com as tarifas praticadas neste ano, as ações da Rumo acumulam queda de 20% nos últimos 12 meses. Preocupações com a saúde financeira da Cosan, controladora da Rumo, também acabaram afetando o desempenho dos papéis. Após o anúncio da Cosan sobre a entrada de um sócio, operação que elimina cerca de 60% de sua dívida, as ações da Rumo começaram a apresentar uma recuperação. Nos últimos dois pregões, subiram 3,7%.
A jornalista viajou a convite da Rumo.