OPINIÃO

O milagre dos preços de milho em Mato Grosso

A melhora da logística e do armazenamento e o crescimento das usinas de etanol resultaram em preços melhores para o produtor de milho

Colheita de milho

Até bem pouco tempo atrás, o produtor do Mato Grosso não esperava ganhar muito com a safrinha de milho. Às vezes, empatar já era bom o bastante: frequentemente era preciso recorrer aos programas de preços mínimos para pelo menos vender a produção a preço de custo.

O pior era o pico da colheita. O milho começava a chegar ao mercado e os preços derretiam com o aumento da oferta, a falta de infraestrutura de armazenagem e o encarecimento dos fretes devido à disputa por caminhões para escoar a produção.

Um número deixa bem claras as desvantagens que os produtores mato-grossenses tinham nessa época: de 2010 a 2018, os preços de uma saca de milho em Sorriso (MT) custaram em média o equivalente a 63% do valor pago aos produtores de Ponta Grossa, no Paraná, onde sempre houve uma logística de eficiência invejável, a menos de 200 quilômetros de distância do Porto de Paranaguá.

Nos últimos anos, a situação mudou bastante. Os preços do milho no Mato Grosso se valorizaram e, de 2018 a 2025, passaram a valer 78% do que o mercado paga em Ponta Grossa – já considerando que, agora em 2025, chegaram a 90% desse valor.

São três os fatores que ajudam a explicar essa valorização.

  • Pavimentação do sentido Norte da BR-163

O asfaltamento da BR-163 no trecho entre Sinop (MT) e o porto de Miritituba, no Pará, foi concluído na safra 2018/2019. Resultado: aumento da eficiência da logística para o escoamento do milho safrinha. Os custos dos fretes caíram de 20% a 30%, o que melhorou a precificação do milho no Mato Grosso.

  • Alta demanda da indústria de etanol de milho

Mais ou menos na mesma época que o asfaltamento até Miritituba foi concluído, as usinas de etanol de milho começaram a ganhar importância ao longo da BR-163 no Mato Grosso. Houve um salto de escala, especialmente após 2020. Em 2025, considerando apenas essas regiões, a demanda dessas usinas chega a 10 milhões de toneladas, dez vezes mais do que em 2018.

  • O salto na capacidade de armazenagem (e tem quem fale de déficit)

O ciclo de margens altamente positivas para os grãos de 2021 a 2023 gerou investimentos significativos em silos e armazéns. Boa parte dessa nova infraestrutura ainda não aparece nas estatísticas oficiais — mas garantiu maior autonomia ao produtor, que agora tem melhores condições para armazenar milho e escolher o melhor momento para a venda. Essa é uma das razões pelas quais, mesmo diante da colheita de uma safrinha recorde, os preços do milho no Mato Grosso não caíram tanto quanto seria de esperar. 

É uma evolução notável para um estado em que os produtores, há menos de 10 anos, várias vezes precisaram “queimar milho” diante de preços inviáveis — mas existem consequências.

Os efeitos colaterais

Dentre os estados brasileiros, o Mato Grosso possui o maior excedente de milho para exportação — mas está perdendo espaço no mercado externo em vários momentos, devido à nova dinâmica de preços.

Antes, a competitividade do Mato Grosso frente a outros exportadores era praticamente garantida nos períodos de colheita. Hoje é preciso refazer as contas — e muitas vezes o milho do estado acaba ficando fora das janelas mais atrativas de exportação.

O crescimento da infraestrutura logística, da armazenagem e da demanda para a produção de etanol de milhou resultaram numa inegável transformação do milho no Mato Grosso. No entanto, tudo isso também alterou a equação de preços.

O futuro do estado como exportador de milho depende de se encontrar um ponto de equilíbrio entre a demanda doméstica — que garante estabilidade — e a competitividade no mercado externo, que continua sendo essencial para dar vazão ao excedente e sustentar as margens e o crescimento.

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Marcos Rubin, colunista de The AgriBiz, é fundador da Veeries, empresa de inteligência do agronegócio especializada em gerar valor a partir de dados.