
Depois de três anos privilegiando um mix mais açucareiro, as usinas sucroalcooleiras sinalizam uma virada a chave em direção ao etanol. Com a queda nos preços do adoçante — e a alta do biocombustível, impulsionada por fatores como o E30 —, as maiores empresas do setor já começam a se mexer.
A São Martinho, por exemplo, ainda não tem hedge de preços de açúcar para a safra 2026/27, o que dá flexibilidade para ampliar a fatia da cana destinada à produção de etanol, notou o BTG Pactual, em um relatório divulgado nesta quarta-feira.
Na Raízen, maior indústria sucroalcooleria do País, o etanol também tem espaço para crescer. Atualmente, pouco mais de um terço da produção esperada para a safra 2026/27 teve os preços travados no mercado futuro.
Em uma teleconferência com investidores realizada na terça-feira, a Adecoagro reforçou o movimento. A companhia argentina está aumentando a produção de etanol no Mato Grosso do Sul, num movimento que leva em consideração também os incentivos com impostos na região e a apreciação do real.
“Acreditamos que podemos fechar o ano com um máximo de mix de 60% de produção de etanol”, adiantou Renato Pereira, VP de Açúcar, Etanol e Energia da Adecoagro, numa tentativa de trazer big numbers a respeito da produção do biocombustível. No ano passado, a Adecoagro teve um mix de 45% de etanol.
Nas contas dos analistas Thiago Duarte e Guilherme Guttilla, as cotações do açúcar na bolsa de Nova York (entre 16 a 17 centavos de libra-peso) já estão próximas à paridade do etanol em algumas regiões, o que explica a estratégia adotada pela Adecoagro.
Segundo eles, a paridade para o etanol de São Paulo é de R$ 3,10 por litro e de R$ 2,80 por litro mais ao norte do País, como em Goiás (por causa do custo logístico e de benefícios tributários). Como o preço spot do etanol está muito próximo da paridade com o açúcar no Centro-Oeste, as usinas estão estimuladas a mudar o mix.
Pelos cálculos do BTG, pelo menos 3,5 milhões de toneladas de açúcar poderiam ser retiradas do mercado com esse movimento em direção ao etanol. Se isso ocorrer, a dinâmica internacional dos preços do adoçante pode se alterar, deflagrando uma recuperação das cotações (que acumulam queda de 15% neste ano).
“As dinâmicas globais de oferta e demanda mostram um excedente ainda muito apertado na próxima safra, de 1 milhão a 4 milhões de toneladas, com o Brasil tendo um ponto chave nisso. A redução da produção pode fornecer um suporte para os preços do açúcar”, destacam os analistas.
A visão de uma recuperação dos preços do adoçante a partir da safra brasileira é compartilhada pelas usinas. No call com investidores, Pereira, da Adecoagro, foi por um caminho similar.
“Nós acreditamos que o açúcar está pressionado por causa da posição vendida dos fundos e por causa do mix mais açucareiro do Brasil. Mas o ATR desta safra está menor do que o esperado”, destacou Pereira, afirmando que a redução no indicador é de 15% por hectare em relação ao ano passado.
Levando em consideração essa redução no rendimento da safra, os analistas do BTG apontam que o Brasil deve produzir de 40 milhões a 40,5 milhões de toneladas do adoçante no centro-sul. Na safra anterior, esse número foi de 43 milhões de toneladas.