Comércio Exterior

Por que o agro pode se beneficiar do fortalecimento do BRICS

Em meio à escalada tarifária dos EUA, uma cooperação mais profunda entre os membros do BRICS torna-se um imperativo geoeconômico, diz estudo do Insper

BRICS

Em tempos de guerra tarifária e crescente instabilidade geopolítica, alianças são fundamentais. Nos próximos dias, os países do BRICS terão a oportunidade de intensificá-las na cúpula que será sediada no Rio de Janeiro. Para os especialistas do Insper Global Agro, o setor agro-alimentar deve estar no centro dos trabalhos.

Em primeiro lugar, pela importância da região na agricultura e sua posição estratégica para a segurança alimentar. O BRICS+, grupo que compreende alguns parceiros além dos países-membro, representa cerca de 42% das terras agricultáveis e produz aproximadamente metade dos grãos mais consumidos no mundo.

No ano passado, respondeu por 19,5% do comércio global de commodities agrícolas, com uma participação relevante nas vendas globais de soja (63%), milho (20%) e de trigo (23%).

Entre os membros, há uma interessante complementariedade comercial. Enquanto o Brasil, a Índia e a Rússia são exportadores líquidos, a China e países do norte da África e do Oriente Médio são importadores — sem falar no comércio de insumos agrícolas, como fertilizantes.

Os BRICS também formam um grande centro de consumo. A população dos membros e parceiros responde por mais da metade da população mundial (55%). Além do crescimento demográfico, muitas nações do BRICS estão passando por ciclos de expansão econômica e aumento na renda, elevando a demanda por alguns tipos de alimentos, como proteínas.

Essas características, diz o Insper, colocam o grupo numa posição indispensável para garantir a segurança alimentar tanto para as regiões mais vulneráveis no sul global como para a população mundial, que deve chegar a 10 bilhões de pessoas em 2050.

Imperativo econômico

Outro grande motivador para reforçar as alianças entre os países do sul global é a escalada das tarifas, como as impostas pelo presidente dos EUA, Donald Trump, e sanções econômicas.

“Esses eventos recentes expuseram a fragilidade das cadeias globais de suprimentos, especialmente nos sistemas agroalimentares. Nesse contexto, uma cooperação mais profunda entre os membros do BRICS+ não é apenas uma necessidade geopolítica, mas também um imperativo geoeconômico”, afirmam os economistas do Insper.

Para os estudiosos, reforçar o comércio entre os países do BRICS na agricultura e defender um sistema multilateral de comércio mais inclusivo, baseado em regras claras, pode ajudar a proteger os interesses comuns do grupo.

Não por acaso, uma das prioridades do grupo de trabalho dos BRICS voltado à agricultura deve ser a harmonização de certificados no comércio de commodities, como os fitossanitários, aponta o Insper.

“Todo país tem o seu modelo de certificação, e isso acaba impactando a velocidade do comércio internacional”, disse Hugo Jacques Kennedy, um dos autores do estudo, ao The AgriBiz.

O Insper propõe a criação de um roteiro para a adoção de uma certificação digital, com o objetivo de agilizar os processos comerciais e eliminar eficiências nas exportações — além de evitar que importadores usem problemas nos certificados como instrumento de barganha na relação comercial.

As recomendações dos especialistas para os trabalhos na Cúpula dos BRICS, que ocorre entre domingo (6) e segunda-feira (7), incluem discussões para a criação de mais suporte financeiro, investimentos em infraestrutura e a criação de uma bolsa de mercadorias.

Mas a grande oportunidade está na restauração de áreas degradadas visando a segurança alimentar, resiliência climática e aumento da produção de alimentos.

“É um movimento para melhorar o uso da terra que incorpora populações, tem a ver com sustentabilidade e justiça social”, destaca Alberto Pfeifer, também autor do estudo que apresentará o trabalho nesta quinta-feira, durante evento do CEBRI (Centro Brasileiro de Relações Internacionais).

“Só no Brasil, há 40 milhões de hectares de pastagens degradadas. Nos outros países também deve haver muita terra para ser recuperada”, afirma.

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Formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, o BRICS foi ampliado em 2024 para incluir Egito, Etiópia, Irã, Arábia Saudita (convidada, mas ainda não confirmada), Emirados Árabes Unidos e Indonésia no grupo BRICS+.

Bielorrússia, Bolívia, Cazaquistão, Cuba, Malásia, Tailândia, Uganda, Uzbequistão, Nigéria e Vietnã são “países parceiros” do grupo, criado há 15 anos.