Milho

"A mãe de todas as safrinhas": Agroconsult prevê 123 milhões de toneladas de milho

O desafio, agora, será escoar e vender a produção recorde em um cenário de fluxos internacionais interrompidos e provável achatamento de preços, diz André Pessôa

Colheita de milho no Brasil. Agroconsult vê safrinha recorde

O Brasil se prepara para colher “a mãe de todas as safrinhas” de milho, com volume e produtividade recordes, ao encontro das boas condições climáticas e do bem-sucedido manejo de doenças e pragas agrícolas nos principais estados produtores.

A análise é da Agroconsult, que nesta terça-feira atualizou a sua estimativa para a safrinha de milho para 123,3 milhões de toneladas, um recorde no País. Caso se confirme, será um volume 19,5% maior que na safrinha do ano passado, e 10,5% a mais do que o recorde anterior de 111,5 milhões de toneladas em 2022/23.

Para André Pessôa, presidente da Agroconsult, o principal vetor foram as condições climáticas. “Estamos diante da mãe de todas as safrinhas. A gente nunca viu nada parecido. Os produtores fizeram a lição de casa, São Pedro ajudou, e vamos colher uma safra gigantesca, muito acima da expectativa de qualquer um de nós”, comentou.

Para se ter ideia, a nova projeção veio 23,5% acima da estimativa mais recente da Conab, que apontou 99,8 milhões de toneladas de milho safrinha. Já a consultoria Veeries falava, em maio, em 115,8 milhões de toneladas. A própria Agroconsult havia feito uma previsão muito menor há um mês, de 112,9 milhões de toneladas.

“A principal razão para o resultado espetacular é o clima. Em janeiro, existia apreensão porque o plantio de soja tinha atrasado, o que empurrou o plantio da safrinha. Precisava de chuva em abril, maio e junho, e ela veio”, detalhou André Debastiani, sócio-diretor da Agroconsult.

O principal vetor do volume de produção não foi a área plantada, que se manteve estável, mas um nível recorde de produtividade. A Agroconsult projeta a média nacional em 113,8 sacas por hectare, 13,1% a mais do que na safra passada, e acima do recorde anterior de 106 sacas por hectare na safra 2022/23.

Debastiani destacou que a alta produtividade se estendeu às lavouras de plantio tardio, contrariando o histórico. Se em outros anos a média nessas lavouras não passava de 100 sacas por hectare, neste ano ficou em 123 no Mato Grosso e em 112 em Goiás. “E, à medida em que demorou para colher, deu tempo de os armazéns escoarem a soja, abrindo espaço para o milho.”

A produção total de milho no País em 2024/25 deve somar 150,3 milhões de toneladas, segundo a Agroconsult (27 milhões na safra de verão e 123,3 milhões na de inverno), com 22,3 milhões de hectares de área plantada (4,3 milhões no verão e 18,1 milhões no inverno).

MT supera a Argentina

O recorde nacional se fragmenta em resultados excepcionais nos estados. A começar pelo Mato Grosso, principal produtor de milho segunda safra do Brasil, que registrou 131,9 sacas por hectare, colhendo 58 milhões de toneladas de milho. Sozinha, a safra mato-grossense supera a da Argentina, que deve colher 50 milhões de toneladas neste ano.

Em Goiás, a produtividade será de 126,1 sacos por hectare, alta de 5,6%. No Mato Grosso do Sul, 98,1 sacas por hectare, aumento de 35,1%. E, no Paraná, 106,5 sacas por hectare, alta de 16,5%.

Safra grande, desafios maiores

Segundo o presidente da consultoria, até aqui foi comercializado pouco mais de um terço da safrinha — faltam dois terços. O desafio, agora, será dar conta de escoar e vender toda essa produção em um cenário de fluxos internacionais interrompidos e provável achatamento de preços — em algumas praças em Mato Grosso, a saca do milho já é negociada abaixo de R$ 40.

“O produtor comemora o resultado, mas fica preocupado com o preço. Talvez o grande desafio seja o quanto vamos tirar do campo”, comentou Pessôa, da Agroconsult.

No mercado interno, a empresa vê um potencial de aumento de 10,4% na demanda, para 97 milhões de toneladas, puxado pelas cadeias de etanol e ração animal. Já as exportações devem crescer 19%, para 44,5 milhões de toneladas.

São estimativas otimistas e, mesmo que se confirmem, “sobram” 9 milhões de toneladas. “Os desafios estão na demanda. A China, que era grande compradora, está ausente há alguns meses. E na sequência vêm Irã e Egito, que não estão em boa condição. É possível fazer 55 milhões de toneladas exportadas, mas falta achar destinos e resolver a logística.”

Cautela no crédito

Para a próxima safra, a perspectiva é de um cenário de crédito restrito e cauteloso, disse Carlos Aguiar, diretor de agronegócio do banco Santander.

Segundo ele, a notícia positiva é que graças à safra 2024/25 muito boa, o setor está com fluxo de caixa. Já o vento contra é a taxa básica de juros em 15% ao menos até o primeiro trimestre de 2026, segundo as projeções mais recentes do banco.

“Aliado ao endividamento, com muitos produtores que se empolgaram com os juros a 2% e abriram área e trocaram maquinário, isso coloca o setor em uma ressaca brava.”

Segundo ele, o momento é de desalavancar, e isso não virá da safra exuberante, mas de uma reorganização de crédito. E, nesse cenário de crédito escasso, Aguiar identifica um retorno da atratividade do barter, a troca de produção agrícola futura por insumos, como fertilizantes e sementes, normalmente operada junto a revendas.

“De 2015 para cá, houve uma migração no crédito, com os produtores indo para os bancos, e, depois, o mercado de capitais. Agora, tem havido uma migração no sentido contrário: o que espero para a próxima safra é os bancos e o mercado esticando prazos, e o fluxo de caixa sendo feito via barter.”