
As terras no Brasil ainda estão baratas em comparação com outros grandes produtores agrícolas, mas essa diferença tem diminuído nos últimos anos — e deve continuar caindo. A avaliação é de Aurélio Pavinato, CEO da SLC Agrícola, a maior empresa agrícola do País.
O preço de um hectare para produção agrícola no Brasil varia entre US$ 10 mil e US$ 20 mil — bem acima da média há dez anos, entre US$ 5 mil e US$ 10 mil, segundo Pavinato. Na Argentina, está entre US$ 15 mil e US$ 20 mil e, nos Estados Unidos, entre US$ 20 mil e US$ 30 mil, aproximadamente. A diferença entre os preços no Brasil e nos seus principais rivais no mercado de commodities, portanto, vem diminuindo.
“Nos últimos 20 anos, a terra se valorizou muito. O ganho real, descontada a inflação, foi de 6%”, disse o CEO durante participação da conferência AGRO 360º, promovida pelo Brazil Journal em parceria com The AgriBiz na semana passada, em São Paulo.
Mas o executivo avisa: nos próximos 20 anos, os lucros com a valorização de terras devem diminuir o ritmo de alta. “Ainda tem um espaço importante para o ganho real no valor das terras no Brasil, mas provavelmente será menor”, disse o executivo, lembrando que a terra no Brasil é dolarizada por ser negociada em sacas de soja, uma commodity.
A expectativa de retornos mais baixos pode ser uma das explicações para a saída de investidores de sociedades firmadas com a gigante agrícola. Em março, a Mitsui vendeu duas fazendas para a SLC por R$ 913 milhões — as áreas já eram operadas pela SLC por meio de uma joint venture com a japonesa.
No mesmo mês, a empresa brasileira anunciou um acordo para assumir a operação de cinco fazendas da Sierentz Agro por US$ 135 milhões. Com a operação, que trouxe mais 100 mil hectares ao portfólio de terras da SLC, a empresa vai operar 833 mil hectares na safra 2025/26.
Segundo Pavinato, as transações recentes, que totalizaram aproximadamente R$ 1,7 bilhão, aconteceram “dentro de uma lógica de oportunidade de compra por um preço conveniente”. Mas também abrem espaço para uma eventual realização imobiliária no futuro.
Com a menor diferença entre os preços das terras no Brasil e em outros produtores agrícolas, diminui o espaço para grandes valorizações. Mas Pavinato ressalta que o preço das fazendas brasileiras continuará acompanhando a valorização das terras internacionais e a própria inflação americana, que acaba influenciando o preço das commodities.
Preço da ação x preço da terra
A SLC possui cerca de 360 mil hectares (incluindo áreas de reserva legal), que têm um valor líquido estimado em R$ 11,6 bilhões. Na Bolsa de Valores de São Paulo, a companhia está avaliada em R$ 8,3 bilhões, o que indica que os investidores não consideram o valor das terras ao precificar as ações da empresa.
“O mercado precificou adequadamente a nossa companhia quando abrimos o capital. Na época, o NAV (valor líquido dos ativos) era R$ 10 por ação e vendemos a R$ 14. De lá para cá, o NAV subiu todos os anos, e hoje seria equivalente a cerca de R$ 30 por ação. E nossas ações hoje estão entre R$ 18 e R$ 19”, disse o CEO.
A dificuldade em incoporar a valorização das terras no preço da ação ocorre porque a SLC tem dois negócios: o imobiliário e o de operação agrícola. “Esse é o dilema. Separar totalmente os dois negócios seria, talvez, o caminho mais fácil para destravar valor”, observou o Pavinato, executivo com mais de 30 anos de SLC.
No entanto, ele explicou que, no Brasil, é importante o operador ter pelo menos um percentual das terras próprias por questões ligadas à resiliência do sistema e até culturais. Além disso, os ativos imobiliários acabaram gerando valor para a empresa nos últimos anos.
“O nosso return on earnings ficou em torno de 22% a 23% nos últimos cinco anos. Metade veio do farming e metade veio do ganho imobiliário. Mas o ganho imobiliário não veio para o book”, afirmou.
Como a venda de terras e reciclagem de portfólio não estão no centro da estratégia da SLC, a venda de fazendas apenas visando lucro imobiliário é conflitante com a operação.
“Então o mercado acaba não precificando esses ativos externos. Na minha visão deveria precificar totalmente? Normalmente não, porque é um ativo que está gerando valor ao longo do tempo, mas esse valor não vem para o balanço da companhia enquanto não for realizada uma venda”, disse.
Atualmente, 62% das terras operadas pela SLC são arrendadas e 38% são próprias. A companhia tem comunicado ao mercado que pretende ficar com um terço de áreas próprias e dois terços de fazendas arrendadas. Mas, no longo prazo, com o objetivo de aumentar o retorno sobre os investimentos, pode mudar essa relação para um quarto de terras próprias e dois quartos de arrendamentos.
Desmatamento zero
Durante o evento, Pavinato reiterou que não é mais necessário desmatar para atender à crescente demanda mundial por alimentos. “Vamos conseguir atender à demanda mundial com as áreas já antropizadas. No caso do Brasil, nós temos o número oficial da Embrapa que é de 28 milhões de hectares”, disse o CEO em referência à área de pastagem degradada com alto potencial de conversão para a agricultura.
Além disso, a maior parte do aumento da produção virá dos ganhos de produtividade, e não do aumento na área plantada. Pavinato lembra que, nessa esfera, o Brasil é referência global: nos últimos 20 anos, a produtividade média na produção de grãos no Brasil aumentou 2,8% ao ano, ante 1,45% da média mundial. Considerando também a segunda safra, o ganho de produtividade no País é de 3,5% ao ano.
“Quando você pensa nos próximos 25 anos, a população mundial vai subir para 10 bilhões de pessoas, pressionando a demanda. Só que a taxa de crescimento da população vai reduzir e a produtividade agrícola vai continuar crescendo linearmente. Então a necessidade de expansão de área plantada nas próximas décadas será menor do que foi nas décadas recentes”, disse.
O desmatamento zero aliado às práticas regenerativas, será possível produzir mais e reduzir as emissões, defende o CEO. “Na minha cabeça, a receita está pronta para produzirmos de forma mais sustentável agronomicamente e ambientalmente.”
Não por acaso, a SLC tem chamado a atenção de investidores ligados às causas ambientais. No ano passado, o fundo ativista da Fama Re.Capital, comandada por Fabio Alperowitch, montou uma posição na SLC, depois de o empresário rural Guilherme Scheffer, um dos mais engajados do Brasil em agricultura sustentável, ter feito um investimento de R$ 450 milhões em ações da empresa.