
O aumento da inadimplência no agro, com alta massiva nos pedidos de recuperação judicial, finalmente cobrou seu preço no balanço do Banco do Brasil, o maior financiador agrícola do País.
O BB já vinha sofrendo há alguns trimestres com o aumento da inadimplência no setor, que tem um peso maior na sua carteira do que nas dos concorrentes. Mas, agora, a conta chegou.
Junto de uma nova regra sobre provisionamento de perdas, a inadimplência de produtores — concentrada em estados como Mato Grosso do Sul, Goiás e Mato Grosso, segundo o banco — afetou o lucro no primeiro trimestre.
O BB divulgou um lucro ajustado de R$ 7,4 bilhões, queda de 20% frente ao mesmo período de 2024, e de 23% na comparação com o trimestre anterior. O resultado veio bem abaixo das expectativas do mercado, que giravam em torno de R$ 9 bilhões.
O banco também suspendeu o guidance para 2025, que havia sido anunciado ao mercado há três meses com uma expectativa de lucro entre R$ 37 bilhões e R$ 41 bilhões. A promessa agora é anunciar uma nova estimativa “nos próximos meses”.
A resposta dos investidores foi imediata: as ações do Banco do Brasil (BBAS3) operam em desvalorização acentuada na Bolsa nesta sexta-feira, caindo mais de 12% por volta das 14h — a maior perda do Ibovespa no dia.
Com isso, o banco fica avaliado em R$ 147,8 bilhões. Em um único dia, a instituição perdeu R$ 17 bilhões em valor de mercado.
O impacto da nova regra do BC
O BB afirmou ter sofrido com a adoção da resolução 4.966/2021, do Conselho Monetário Nacional, que obriga as instituições financeiras a efetuar provisões no balanço por “perda esperada”.
Na prática, a regra impõe uma visão mais conservadora sobre a qualidade dos ativos, e limita o reconhecimento de receitas vinculadas a ativos sob pressão.
No balanço, a adoção impactou o lucro líquido em cerca de R$ 800 milhões — foram mais de R$ 5 bilhões em perdas provisionadas no segmento agro apenas nos primeiros três meses do ano.
Com os ajustes, a inadimplência da carteira de crédito do agronegócio subiu para 3% no período — um aumento de 2,5 vezes frente ao primeiro trimestre de 2024.
E a combinação dos dois fatores, inadimplência e ajuste contábil, desembocou no lucro abaixo do esperado.
“Nenhum dos eventos nos surpreendeu na direção, mas sim na magnitude de impacto quando combinados. Por isso, colocamos as duas linhas em revisão”, afirmou o CFO Marco Geovanne Tobias da Silva, referindo-se ao lucro líquido no período e ao guidance do ano.
Apesar do cenário positivo para a safra 2024/25, com expectativa de colheita recorde, “há um estoque de operações da safra 2023/2024, por conta das recuperações judiciais, que exigem maior provisionamento sob a nova regulação”, completou.
E o resultado teria sido ainda pior não fossem as renegociações de dívidas e um esforço para recuperar créditos, com aumento das cobranças na Justiça, explicou a CEO Tarciana Medeiros.
“Os esforços de sentar à mesa e negociar com os produtores têm surtido efeito, com redução do ritmo de entrada de novos pedidos de recuperação judicial. E, ao mesmo tempo que nunca deixamos de estar próximos dos clientes, ampliamos o uso de dados para a cobrança. Ganhamos eficiência nos processos, e hoje 65% da inadimplência já está ajuizada. Vamos fazer tudo o que é possível para recuperar nossos ativos.”
Segundo Tobias, as RJs se concentram entre produtores de soja nos estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás, e parte delas são “litigância predatória”.
“Muitos advogados vendem o céu para produtores inadimplentes, dizendo que a RJ vai ser a solução. Mas não é, na medida em que ficam esterilizados, sem acesso a crédito. É uma grande falácia que está impactando nossos resultados”, disse o CFO.
Inadimplência alta em abril
Segundo a liderança do Banco do Brasil, as projeções de remuneração aos acionistas se mantêm inalteradas por enquanto, mas será necessário observar a evolução da inadimplência no agro.
Os dados deste início de segundo trimestre não favorecem o otimismo, com “uma certa resiliência da inadimplência em abril, em vez de ceder”.
“A gente está mantendo o payout de 40%. Só estamos um pouco receosos porque os dados iniciais de abril ainda mostram dificuldades de parte dos clientes”, afirmou Tobias.
Segundo Evandro Medeiros, analista da Suno Research, “a inadimplência rural segue em alta e pressiona os resultados”. Mas ele faz uma ressalva: “Há anos o agro cresce acima da média nacional e, apesar do momento adverso, a forte presença do banco continua sendo um diferencial estratégico no longo prazo”.